¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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segunda-feira, julho 10, 2006
 
BENTO, FRANCO E VICENTE



Você já imaginou a Espanha sem Francisco Franco? Com a Espanha dominada pela União Soviética, Stalin controlaria dois mares, o do Norte e o Mediterrâneo. Para derrubar Portugal bastaria um piparote e a resistência francesa seria estrangulada pelo domínio dos mares. Na esteira desta invasão, provavelmente cairia também a Inglaterra. Daí à conquista de toda a Europa Ocidental, seria questão de um ameno turismo blindado.Com Moscou imperando do estreito de Gibraltar ao de Bering, a tirania comunista teria vida bem mais longa. Europa e Ásia afundariam juntas na miséria inerente aos regimes socialistas e a praga se propagaria - como aliás se propagou, mesmo sem a vitória de Stalin - além do Atlântico. O Muro não teria caído em 89 e até hoje a Europa seria algo tão triste e pobre como foram - e ainda são - os países da Ex-União Soviética.

Pelo que lemos nos jornais, os europeus ainda não perceberam o óbvio. Em Estrasburgo, um eurodeputado polonês, Maciej Marian Giertych, elogiou em uma sessão do Parlamento Europeu, na terça-feira passada, os regimes liderados por Francisco Franco, na Espanha, e Antonio Salazar, em Portugal, por terem impedido a disseminação do que ele qualificou como a praga do comunismo. Giertych é pai do vice-primeiro-ministro da Polônia, Roman Giertych e, por sua idade, sabe do que está falando. As declarações de Giertych foram imediatamente rebatidas por Martin Schulz, líder da bancada socialista no Parlamento Europeu. Segundo Schulz, as declarações eram uma encarnação do espírito do general Franco. "O que acabamos de ouvir - disse o socialista - foi um discurso fascista para o qual não existe lugar no Parlamento Europeu". O que Schulz não disse é que, sem Franco, a Europa não seria o que é hoje, um continente rico, livre e democrático.

Ao chegar em Valência, sábado último, o papa Bento XVI lembrou a tragédia que matou 42 pessoas na segunda-feira em um acidente de metrô na cidade. Os valencianos comovidos agradecem. Destacou também o caráter insubstituível que a família fundada no casamento tem para a Igreja. E neste destaque vai um recado à Espanha, que há um ano já permite o casamento de homossexuais, em virtude de lei sancionada pelo atual governo socialista. Sem falar que a idade de consenso sexual, desde há muito, é de doze anos. (Coincidentemente, mais ou menos a mesma idade em que Maria concebeu Cristo). Mas a Espanha de Zapatero está pouco preocupada com questões de família. A Asociación por la Recuperación de la Memória Histórica (ARMH) enviou uma carta a todos os bispos recomendando-os a aproveitar a visita de Ratzinger para tirar todas as placas falangistas de "caídos por Diós e por España" que ainda resistem em centenas de igrejas e pedir perdão por seu papel na guerra.

Os espanhóis estão querendo trocar a sotaina papal por uma saia justa. Verdade que Franco executou quatorze sacerdotes vascos. Acontece que o clero vasco se alinhava com as milícias republicanas que mataram cerca de sete mil religiosos católicos, entre membros do clero secular, sacerdotes, freiras e até treze bispos. Muitas freiras tiveram seus tímpanos estourados pela introdução de rosários e crucifixos. Bem ou mal, Franco tomou o partido da Igreja romana. Após ter reprovado as execuções de sacerdotes nas Provincias Vascongadas, Pio XI declarava, na encíclica Divini Redemptoris, datada de 19 de março de 1937:

"Também ali, como em nossa queridíssima Espanha, o açoite comunista (...) não se contentou com derrubar uma ou outra igreja, um ou outro convento, senão que, quando lhe foi possível, destruiu todas as igrejas, todos os conventos e até mesmo todo rastro de religião cristã, por mais ligado que estivesse aos mais insignes monumentos da arte e da ciência. O furor comunista não se limitou a matar bispos e milhares de sacerdotes, de religiosos e religiosas, buscando de modo especial aqueles e aquelas que precisamente trabalhavam com maior zelo com pobres e operários, mas também fez um número maior de vítimas entre os seculares de toda classe e condição, que diariamente, pode-se dizer, são assassinados em massa pelo mero fato de ser bons cristãos ou apenas contrários ao ateísmo comunista. E uma destruição tão espantosa é levada a cabo com um ódio, uma barbárie e uma ferocidade que não se acreditaria ser possível em nosso século. Nenhum particular que tenha bom juízo, nenhum homem de Estado consciente de sua responsabilidade, pode menos que tremer de horror ao pensar que o que acontece hoje na Espanha talvez possa repetir-se em outras nações civilizadas".

Quando se fala em Guerra Civil espanhola, ninguém mais lembra que os grandes assassinos de religiosos foram os comunistas. Na saída do metrô, o papa depositou uma coroa de flores brancas e, ajoelhado, pediu o descanso eterno e em paz das vítimas do acidente. Sobre a retirada das placas falangistas, Bento não disse água. Nem poderia. Estaria desautorizando seu antecessor. Em nossos dias, o Vaticano se contenta com vagos apelos pela paz, sem nominar vítima nem carrasco. É mais prudente.

Valência é a terra de San Vicente Ferrer (1350-1419), santo espanhol canonizado por Calixto III em 1455, que goza da fama de grande milagreiro. Segundo reza a tradição local, certa vez um bispo deveria visitar uma família de camponeses. A mulher, desejosa de agradar, perguntou ao santo que poderia oferecer ao prelado. "Ofereçam o que de melhor vocês têm" - respondeu o Vicente. Os camponeses prepararam então uma paella. Antes da chegada do bispo, o santo provou um pedacinho da paella, gostou e quis saber do que era feita. "É nosso filho - respondeu a mulher - é o melhor que nós temos". Apavorado, Vicente desfez a paella e refez o filho. Menos o dedo mindinho. Era o pedacinho que havia degustado.

Tantos milagres fazia o santo, que um dia o alcaide o proibiu de fazê-los. Passava um dia Vicente por um prédio em construção, quando um operário caiu de um andaime. Proibido de operar milagres, o santo o deixou suspenso no ar, foi até a prefeitura e pediu que fosse revogada a proibição. Uma vez esta revogada, voltou ao prédio e fez descer suavemente o operário ao chão.

São Vicente tinha créditos junto ao todo-poderoso. O mesmo não parece ser o caso dos pastores da Igreja Universal. Em São Paulo, um fiel, encarregado de consertar o telhado de um templo, teve a garantia de um pastor evangélico de que, se tivesse fé, não cairia do telhado. Caiu e sofreu politraumatismo. Está requerendo na Justiça R$ 356.200 de indenização. O pedido foi julgado procedente. O pastor defende-se. Diz que o homem não tinha fé suficiente. Outros fiéis estão processando a mesma igreja, tanto por terem alienado bens tendo em vista uma prosperidade que não lhes foi concedida, como por terem quebrado a cabeça em sessões de "descarrego", essa prática catártica da Universal. Católicos e astrólogos já estão pondo as barbas de molho, afinal o consumidor brasileiro está cada vez mais ciente de seus direitos e a moda pode pegar. Fé está virando questão de Procon. E é bom que assim seja. Charlatanismo é crime.

Essas promessas de vida eterna, por exemplo. Quem pode provar que nossos entes queridos têm nos céus a prometida eternidade? Ou esses horóscopos maravilhosos, que nos prometem manhãs que cantam, dias radiosos e amor a mancheias. Está na hora de, em falta de entrega da mercadoria, entrar com ação indenizatória. Queremos a competência do santo homem de Valência... ou o dinheiro de volta. Mas isto já é outro assunto.