¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, outubro 31, 2006
 
MEDO DOMINA IMPRENSA NA FRANÇA


Leio um despacho da EFE:



Adolescentes são detidos por incêndio de ônibus em Marselha


Jovem de origem senegalesa ferida continua em estado crítico
EFE

PARIS - Cinco adolescentes foram detidos nesta terça-feira em Marselha numa operação policial para buscar os responsáveis pelo incêndio de um ônibus, no sábado, causando graves queimaduras a uma jovem que se encontra em estado crítico.

De acordo com a emissora de rádio "France Info", agentes à paisana entraram de madrugada em vários edifícios dos bairros de Lilas e Oliviers, ao norte de Marselha, em busca dos menores suspeitos de incendiar o ônibus. Os investigadores tinham várias pistas sobre os autores do crime, declarações de testemunhas e gravações de vídeo.

O ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, se comprometeu nesta segunda-feira, 30, publicamente a encontrar os responsáveis pelo ato que deixou Mama Galledou, uma estudante de origem senegalesa, de 26 anos, entre a vida e a morte.

Os médicos que atendem a estudante no hospital de La Conception ainda temem que ela não resista às queimaduras, que afetaram mais de 60% de seu corpo.


Temos notícia da origem da vítima. Nada sobre a origem dos agressores. O politicamente correto está tomando conta inclusive das agências internacionais de notícias. Os investigadores têm pistas sobre os autores do crime, declarações de testemunhas e gravações de vídeo. Mas os leitores ficam sem saber do que se trata. É óbvio que são de origem árabe ou africana. Mas os jornais europeus, de modo geral, já não ousam noticiar que um criminoso é de origem árabe ou africana.

A imprensa se acovarda. Se você ainda não conhece a Europa, vá logo. Antes que seja tarde. Se é que já não é.

segunda-feira, outubro 30, 2006
 
TRISTE PAÍS ESTE MEU



Sempre vivi em conflito com o Brasil. Em verdade, sou mais platino que brasileiro. Nasci na pampa, a mais ou menos um quilômetro da Linha Divisória entre Brasil e Uruguai. Com meus pais, falava português. Com minha ama, doña Catulina, falava espanhol. Na estrada, em frente a nosso rancho havia um desses marcos divisores de fronteira, em concreto. Meu pai costumava colocar-me nos ombros para que eu subisse até o topo do marco. Mandava que eu me virasse para o nascente e dizia: "fala para os homens do Uruguai, meu filho". Depois fazia virar-me para o poente: "Fala agora para os homens do Brasil". Nasci entre duas culturas e o primeiro grande poema de minha infância foi o Martín Fierro. Meu pai era camponês sem maiores luzes, mas conhecia de cor dezenas de sextilhas de Hernández. Pergunte hoje a um professor universitário quem foi José Hernández. Poucos saberão responder.

Entender o mundo foi algo que sempre me fascinou. O aprendizado da leitura me absorveu a tal ponto que eu entrava noite adentro lendo à luz das brasas do fogão. As seleções do Reader's Digest, não sei como, chegavam até aqueles rincões. Não sei se algum leitor ainda lembra delas. Tinham o formato de um pequeno livro e o texto era disposto em seis colunas. Em minha sofreguidão, eu lia as linhas na horizontal, pulando de uma coluna para outra. Não era tarefa fácil, após a leitura, ordenar o texto todo. Fiz o primário em escola rural. Minha alegria de fim de ano era saber que no ano seguinte eu receberia novos livros.

Desde pequeno, tive a intuição de que um homem vale pelo que conhece. No ginásio, me fascinou o estudo de inglês, francês e latim. Sentia-me como que travestido falando uma língua estrangeira. Não o espanhol, é claro, que nunca foi estrangeira para mim. Enquanto meus colegas e parentes se dedicavam a projetos mais práticos, como o de ganhar dinheiro e comprar coisas, eu me preocupava em ler mais para entender melhor o universo que me cercava. Um dos apelidos que me pespegaram em meus dias de Porto Alegre foi "Pra-que-dinheiro?". Eu não entendia muito bem para quê.

Os livros foram minhas armas para enfrentar o mundo. Com eles enfrentei a arrogância dos padres, dos marxistas, dos acadêmicos. Nos dias em que estava abandonando a fé cristã, que me fora enfiada a machado na cabeça, um padre foi enviado à minha cidadezinha para reconduzir ao rebanho a ovelha prestes a perder-se. Conversamos um dia inteiro, esvaziando várias jarras de água. "Com que autoridade - me perguntava o padre Firmino - ousas contestar o que homens ilustres afirmaram?" Contesto, padre, com a autoridade da razão, da lógica e de minhas leituras. Eu teria 17 anos. Graças a meus livros, enfrentava com serenidade aquele Torquemada cinqüentão. A leitura me havia salvo do obscurantismo.

O valor que mais cultivo é o conhecimento. Certa vez, em uma audiência judicial, um juiz me defendeu como me defenderia minha mãe. "Este homem nunca teve tempo de ganhar dinheiro, passou sua vida estudando". Estudando, continuo até hoje. Não tenho maior apreço por quem ostenta fortuna ou poder. Vivemos dias em que sucesso é um valor. Conheço pessoas de bom nível cultural que invejam o Supremo Apedeuta: "Ele teve sucesso". Tenha o sucesso que tiver, pessoa inculta para mim não vale um vintém. Respeito o analfabeto que não teve condições de alfabetizar-se. Não tenho respeito algum por quem, tendo a chance de educar-se, não se educou. Tenho mais respeito por minha faxineira, que surpreendi outro dia lendo Machado de Assis. Quem me acompanha sabe que abomino aquele carioquinha. Mas melhor ler Machado que não ler nada. Urge acabar com esse mito de que alguém vale alguma coisa só porque é presidente da República, bispo de Roma ou sabe chutar uma bola.

Falava de meu conflito com o Brasil. Quando fugi para a Suécia, fugia de duas coisas: carnaval e futebol. Mas por mais que um homem fuja, sempre carrega nas costas seu passado. Os suecos me interrogavam sempre sobre ... carnaval e futebol. Em todas minhas viagens, a peste Brasil sempre viajou grudada à minha pele. Seja nas fronteiras políticas do mundo socialista, seja nas fronteiras hipotéticas do Saara, ao mostrar o passaporte verde nunca faltou um policial analfabeto que me dissesse: "Brassil? Pelê, cafê, sambá".

Nunca tive razões para orgulhar-me de meu país. Tampouco encontro homens em sua história a quem possa conferir a comenda de herói. Tivemos alguns homens de visão, é verdade, Hipólito da Costa (que nasceu na Colônia do Sacramento, atual Uruguai), José Bonifácio, Silva Paranhos. É muito pouco para país tão grande. Santos Dumont? De acordo. Mas Dumont é fruto da cultura francesa, não da nossa. Meus heróis estão em outras culturas. Alexandre, Sócrates, Cervantes, Schliemann, Fernão de Magalhães, Nietzsche, Mozart, Pessoa, Hernández. Entre meus numes tutelares não há nenhum brasileiro.

Viajando, aprendi a gostar deste país. Gosto de repetir uma frase de Chesterton: "não se conhece uma catedral permanecendo dentro dela". Precisei sair para entender melhor a terra em que nasci. Se aqui existem mares de burrice, há também ilhas de inteligência. Se há miséria, há também riqueza. Se há feiúra, há também beleza. Todo país é lindo quando nele existe uma mulher a quem amamos. Essa mulher eu a tive e era daqui. Tivesse eu nascido no Congo ou em Ruanda, teria fortes razões para partir e não mais voltar. Mas ao Brasil dá pra voltar. Que o digam os exilados de 64, que nos cafés de Paris ou Berlim juravam só voltar de metralhadora em punho. Mal Figueiredo decretou a anistia, voltaram chorando a cântaros. Quando passamos muito tempo longe do Brasil, sempre dá um nó na garganta ao voltar. Se choramos ao voltar, é porque o país é viável.

Sempre nos doem na alma as mazelas do país do qual gostamos. Gostar do Brasil é viver de alma machucada. Temos tudo para ser ricos e - ilhas à parte - vivemos atolados na miséria. Eleições são momentos em que brota, no peito de quem gosta de sua pátria, um raminho de esperança: quem sabe, desta vez saímos do barro. Esse raminho, em meu peito há muito murchou. Faz hoje dezesseis anos que não voto, por não conseguir vislumbrar candidato em quem confiar meu voto. Se por um lado não voto, por outro sempre espero apreensivo o resultado das urnas.

Há quatro anos, foi eleito presidente da República um homem que se gaba de sua incultura. Parafraseando Lula: nunca houve na história deste país tamanho acinte à inteligência. Sua eleição gerou um clima funesto no país. Para "ter sucesso" não era mais necessário ter cultura. Analfabeto mesmo serve, desde que minta à vontade, conforme o gosto das gentes. Não bastassem suas demonstrações quase que diárias de analfabetismo, não bastasse a roubalheira institucionalizada de seu governo, não bastassem suas mentiras deslavadas e continuadas, candidatou-se novamente à Presidência da República.

Nos tempos d'antanho, para justificar suas vontades, os poderosos costumavam dizer: Deus quer, Deus quis, em nome de Deus. O tal de Deus parece andar um tanto fora de moda. Hoje, os poderosos ou candidatos ao poder dizem: em nome do povo, o povo quer, o povo diz. Soaria um tanto obsoleto, tanto para Lula quanto para Alckmin, dizer: eu sou o candidato de Deus. Mas não têm maiores pudores em afirmar que são o candidato do povo. As duas palavrinhas - Deus e povo - continuam sendo de difícil definição e têm tantas acepções quanto as bocas dos que as pronunciam. Jamais vi ou li uma definição de povo que satisfizesse a todas as mentes. Mas uma coisa é certa. Passe numa segunda-feira de manhã em um parque público ou em uma praia. Você pode não saber o que é povo. Mas é óbvio que o povo passou por ali. Nesta segunda-feira, Lula acordou reeleito presidente da República. Ontem, o povo passou pelas urnas.

Ainda na semana passada, o candidato derrotado dizia que o PT "está fazendo apologia da mentira. Os petistas podem mentir. Não, o brasileiro não gosta de mentiroso. Nada se sustenta em cima da mentira. Mentira é desvio". Santa ingenuidade tucana. Esta coisa informe que se chama povo parece ter-se indignado com as palavras de Alckmin. E correu às urnas para desmenti-lo: "somos brasileiros e gostamos de mentirosos, sim senhor. Quem disse que nada se sustenta em cima da mentira? Mentira não é desvio. Mentira é direito sagrado de todo cidadão".

Em um sistema democrático, bem ou mal o presidente representa as aspirações da nação toda. Triste país este meu, que elege e reelege um bronco sindicalista. Disse certa vez um político inglês que a Inglaterra era bem sucedida porque seus cidadãos honestos tinham a mesma audácia que os canalhas. Claro que no Brasil existirão não poucos homens honestos. O problema é que carecem de audácia, virtude que nunca faltou aos canalhas.

sábado, outubro 28, 2006
 
PROBLEMAS DE TRADUÇÃO



Tradutor, já traduzi de quatro línguas. Tradução tem suas limitações. Segundo alguns, traduções são impossíveis, mas necessárias. Segundo outros, traduções são como as mulheres: quanto mais belas, mais infiéis. Seja como for, nunca tive maiores problemas em traduzir, seja do sueco, inglês, francês ou espanhol.

O problema é traduzir do português ao português, quando quem fala é um velho comunista. Diz Marco Aurélio Garcia, presidente nacional do PT e coordenador da campanha à reeleição de Luiz Inácio Lula da Silva: "o presidente não pode assumir posição no que se refere a procedimentos que devem presidir a implementação de transformações institucionais que venham a ser acordadas por um setor majoritário e expressivo da sociedade".

Tentando traduzir: nosso perfeito idiota latino-americano, se não tiver maioria no Congresso, vai tentar impor sua vontade totalitária através de uma Constituinte.

 
BURKA E CHADOR



Lá por 2002, Marilene Felinto, uma esquerdista maluca que assinava crônica na Folha de São Paulo, andou escrevendo sobre os quilos de dinamite que as palestinas carregam por baixo das sete saias do xador (sic!) Fanatismo e ignorância sempre andam de mãos dadas. Palestinas nunca usaram chador. O chador é usado pelas iranianas. Consiste em uma capa que esconde todo o corpo e deixa o rosto descoberto. Foi proibido temporariamente pelo xá Reza Palhevi e nada tem a ver com palestinas.

Acabo de ver um documentário sobre o Afeganistão no National Geographic Channel. Mostra mulheres de burka - véu que mais parece uma gaiola, com uma espécie de grade cobrindo o rosto - e a todo momento a locução fala em chador. A televisão é poderosa. Quem não sabe o que é burka, acaba achando que as afegãs usam chador. Que uma pessoa sem maiores luzes confunda burka com chador, entende-se. Que um canal de televisão difunda este erro é mais grave. Todo analfabeto passa a afirmar, de boca cheia, que as afegãs usam chador. Televisão é cultura.

sexta-feira, outubro 27, 2006
 
AVISO AOS NAVEGANTES


De um amigo velejador, recebo a triste notícia de que já nem os mares são viáveis.


Janer,

Me lembrei que além dos abalroamentos é preciso contar ainda com os ataques de piratas, particularmente virulentos no mar Vermelho e na costa norte atlântica da América do Sul (Guianas, Venezuela ....), paragens temidas e evitadas pelos velejadores. Talvez não tenham a ousadía de abordar um navio de 40.000 passageiros onde podem se deparar com alguma velhinha judoca carioca (já que a arma não passaría no controle de raios X do embarque), mas o butim sendo proporcionalmente maior...até quem sabe?

O melhor mesmo ainda parece ser sitiarmo-nos voluntáriamente no nobre Higienópolis. Enquanto os alienígenas não o contaminam. Não sei. Mas estou, aqui na Consolação, sentindo a voz um pouco rouca.

Abraços,

Miguel

 
PARA ONDE?


Uma obscura aposentada do Rio de Janeiro, Maria Dora dos Santos Arbex, de 67 anos, tomou as manchetes dos jornais nas últimas semanas. Ela baleou com uma arma sem registro um mendigo que tentou assaltá-la. A história se repete. Nos anos 80, uma velhinha teve sua casa invadida por um assaltante, em alguma cidade do oeste paulista. Tinha um revólver e defendeu-se. Já não lembro se matou ou apenas feriu o bandido. Na época, portar arma era crime apenas contravenção penal. Mesmo assim, aguerridos militantes dos tais de Direitos Humanos protestaram contra a senhora e conseguiram desarmá-la.

Já não lembro o que foi feito da vovó paulista. Tenho acompanhado a saga da vovó carioca, que agora arrisca a ir para a cadeia, pelo crime inominável de ter-se defendido. Ou seja, nos dias que correm, aquela bela doutrina da legítima defesa passa a ser letra morta. O bandido sempre andará armado, isto faz parte de seu ofício. Quanto à vítima, se estiver armada, incorre em pena de um a três anos de prisão, mais multa.

Talvez a vovó hedionda só esteja em liberdade em virtude do absurdo flagrante que constituiria sua prisão. Para homenageá-la, a Câmara Municipal carioca concedeu-lhe a medalha Pedro Ernesto, a mais alta condecoração do Rio. Na ocasião, a senhora Arbex pediu leis que proíbam moradores de rua de terem filhos e até que fossem jogados em alto-mar. Conclamou ainda as mulheres cariocas a um mutirão para tirar mendigos das ruas. "Não quer ficar em albergue, fica no meio do mar. Bota num navio e descarrega longe".

A senhora Arbex é uma pessoa rara em nossos dias. Não tem papas na língua e ainda não se deixou contaminar por esse pensamento muito católico que concede a mendigos o direito de morar nas ruas. Só não estou de acordo com sua proposta de jogá-los no mar. Me parece ser mais factível nos jogarmos no mar e deixar os mendigos em terra. Pegar um transatlântico e fugir deste insensato mundo, onde uma pessoa arrisca ir para a cadeia por ter exercido o direito de legítima defesa.

Há um projeto japonês de uma ilha flutuante, com capacidade para 40 mil habitantes. É o número de cidadãos que Platão considerava ideal para sua República. Por enquanto é sonho, ma chi lo sa? Não sei se terei a aventura de nela habitar, mas bem que me agradaria ficar navegando por mares desconhecidos o resto de meus dias. Uma vez por mês, teríamos reunião de condomínio e decidiríamos, em assembléia, para que nortes rumar. A idéia da vovó revelou falta de visão.

Se bem que em nossos dias até os mares estão poluídos por mendigos. No Mediterrâneo, por exemplo, minha nau e refúgio arriscaria abalroar uma precária patera abarrotada de famintos africanos. No Adriático, poderia ter de resgatar famintos romenos ou albaneses. Isto me lembra um antigo filme, cujo título já não recordo. Alienígenas invadem a terra e começam a tomar o corpo dos terráqueos. O herói se insurge contra a invasão mas não consegue contê-la. Quando o planeta está totalmente dominado, ele diz à sua companheira: "Vamos fugir para algum lugar onde eles não tenham chegado".

Ela, já com a voz rouca dos contaminados, pergunta: "Para onde?"

quinta-feira, outubro 26, 2006
 
MONEGALHA DISCORDA


Janer,

venho me solidarizar com você. Apóio seus pontos de vista e não me agradam nem um pouco essas carolas que querem te tirar do Mídia sem Máscara. Continue como você sempre esteve: sólido como uma rocha em seus pontos de vista e na sua argumentação.

Mas... tenho de discordar em um ponto de vc: se alguém quer uniformidade de pensamento, não precisa mais recorrer à mídia internacional. Afinal, um Gramma parece um exemplo de discussão democrática perto do que se observa num IG (veja o blog Conversa A(F)fiada) ou numa Carta Capital. Esse pessoal despirocou de vez. Perdeu a vergonha. E a situação tende a piorar muito num segundo mandato Lula.

Grato pela lucidez de seus artigos,

Fernando Monegalha
São Paulo - SP

quarta-feira, outubro 25, 2006
 
O DIREITO DE MENTIR - UM DESABAFO



Caro Janer,

Nada tenho a retocar na sua argumentação quanto à diferença entre o direito de não se auto-incriminar e o dito "direito de mentir". Porém, gostaria de fazer um
alerta: pelo andar da carruagem, não duvide se este último vier a ser reconhecido e regulamentado pelos tribuNais. Apenas mais um caso da chamada criação jurisprudencial. Tenha-se em vista o seguinte julgado:

HABEAS. CORPUS. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. ATRIBUIÇÃO DESSE CRIME A PESSOA QUE JÁ FIGURA COMO RÉU NOUTRO PROCESSO, ONDE AO SER INTERROGADO BUSCOU LIVRAR-SE DA ACUSAÇÃO DE SONEGAÇÃO FISCAL ATRIBUINDO A ORIGEM DO FATO A "RETALIAÇÃO" DO DELEGADO DA RECEITA FEDERAL. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO, A MANDO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, PARA INVESTIGAR EVENTUAL PREVARICAÇÃO DAQUELA AUTORIDADE FAZENDÁRIA, COM BASE EM TEOR DE INTERROGATÓRIO JUDICIAL. NATUREZA JURÍDICA DO INTERROGATÓRIO. POSSIBILIDADE DE O INTERROGANDO MENTIR SEM SANÇÕES. AUSÊNCIA DE DOLO DIRETO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL DETERMINADO. I - Depois que a Constituição Federal reconheceu ao acusado o pleno direito ao silêncio - sem qualquer conseqüência em seu desfavor, derrogando o art. 186 do CPP - no inc. LXIII, art. 5º, o interrogatório assumiu eminente feição de meio de defesa, pois o réu poderá calar-se, ou resolvendo falar, não se sujeita a qualquer compromisso de dizer a verdade pois no âmbito criminal ninguém pode ser compelido a fornecer provas contra si mesmo, de sorte que o réu, se quiser ser interrogado, poderá até mentir à vontade. Bem por isso, é incompatível com o dolo direto consistente na intenção de provocar instauração de inquérito policial ou processo judicial contra alguém, atribuindo-lhe falsamente um crime (exigido no tipo do art. 339) a mera intenção de se defender de uma imputação (animus deffendendi), que se enxerga em declarações de réu em interrogatório. II - Instauração de inquérito para investigar conduta funcional de agente fazendário que se atribui muito mais a açodamento do Ministério Público Federal diante de teor de interrogatório de réu, do que a conduta do paciente. III - Habeas Corpus concedido para trancar ação penal. (TRF3ª R. - HC 2000.03.00.026479-7 - SP - 5ª T. - Rel. Des. Fed. Johonsom di Salvo - DJU 05.06.2001) [destaques em negrito meus]

Este "poderá mentir à vontade" não está aí à toa. Muitos advogados entendem ser um direito do réu, defendem a tese em juízo e, pasme, até encontram julgadores que simpatizam com ela. Como contrapartida a este estado de coisas, há quem defenda a criação pelo legislador do crime de perjúrio. Caso venha a surgir este novo tipo legal, o réu ou fica calado ou diz a verdade, pois, se mentir, correrá o risco de responder por mais um crime.

Observe ainda a seguinte decisão:

APELAÇÃO. LATROCÍNIO E ROUBO QUALIFICADO. CONCURSO MATERIAL. 1º) INTERROGATÓRIO EM JUÍZO. NOMEAÇÃO DE CURADOR A ACUSADO MENOR E ADVERTÊNCIA DO ARTIGO 186 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL 2º) FIXAÇÃO DA PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. APLICAÇÃO DE ATENUANTE. INCOMPORTABILIDADE. A nomeação de curador para acusado menor não deve recair, necessariamente, em advogado, sendo possível a escolha de qualquer pessoa idônea para suprir, com sua maior experiência de vida, a presumível imaturidade do interrogado. Sendo o interrogatório um meio de defesa, o acusado pode mentir e negar a verdade. Não há um verdadeiro direito de mentir, tanto que as eventuais contradições em seu depoimento podem ser apontadas para retirar qualquer credibilidade das suas respostas. Não há que se falar em aplicação da atenuante quando, para um dos crimes, a pena-base foi fixada no mínimo legal. Recurso conhecido e improvido. (TJGO - ACrim 20877-5/213 - 1ª C.Crim. - Rel. Des. Elcy Santos de Melo - DJGO 20.04.2001)

De fato, não há (ainda) "um verdadeiro direito de mentir", mas, acredite, a discussão já está posta.

Se quiser ter uma idéia de como vem evoluindo (ou regredindo!) o Direito Penal e o Direito Processsual Penal neste nosso Brasil, sobretudo por obra e graça de advogados criminalistas ditos progressitas e modernos, sugiro o livro Crime e Castigo: Reflexões Politicamente Incorretas. Nele, há decisões judiciais que vão da comédia à tragédia. "Ad cautelam" - para usar o típico latim jurídico - eis que se trata de uma mera recomendação, não propaganda. OK?

Mas para saber que algo não vai bem com nosso Ordenamento Jurídico, ou, pelo menos, com certas interpretações da lei, nem precisa trocar suas costumeiras leituras por um livro desta natureza. Basta lembrar algumas decisões do próprio Supremo Tribunal Federal.

A primeira delas que saliento diz respeito à proibição do depoimento do caseiro Francenildo, sob o argumento de que este não possuía "condições culturais" para tanto. Ora, via de regra, não se proíbe uma testemunha de falar. Na verdade, nunca vi. Se esta mente, responde por um crime (falso testemunho). Diferente do réu, portanto, confere? Se aquela não conhece os fatos, diz que não sabe e pronto. Além disso, independente das "condições culturais" da testemunha, esta poderia responder a indagações de possível interesse para esclarecimento dos fatos, como se viu ou não bicheiros no local ou, mais simples ainda, se ouviu alguém falar sobre jogo do bicho, quem, etc.

Outra decisão que recordo aqui foi a votação por 6 X 5 que praticamente derrubou a chamada lei dos crimes hediondos. Por apenas um voto, uma lei que vinha sendo aplicada, ainda que com controvérsias, há quase vinte anos, foi posta na lona. Não bastasse, logo apareceram advogados sugerindo responsabilizar o Estado para pedir indenizações para seus clientes (de traficantes a estupradores) que ficaram mais tempo cumprindo pena em regime fechado do que seria "o correto". Confesso, porém, que desconheço se algum julgador abraçou esta tese de indenizar os pobres réus que cometeram crimes hediondos. Ah, antes que eu esqueça: uma das controvérsias na aplicação da dita lei se refere ao fato de que esta expressamente fala em cumprimento da pena em regime integralmente fechado, mas alguns juízes escreviam inicialmente e, mesmo sem maiores justificativas, por esta mera troca de palavras, o réu ganhava a progressão de regime. Quando falo em troca de palavras não é exagero. Imagine-se que o douto magistrado já tinha um modelo de sentença para crimes menores e resolveu aproveitá-lo no caso de um crime hediondo. Se no colar/copiar esqueceu de trocar o inicialmente pelo integralmente, já era!

Desculpe se fui prolixo ou cansativo, mas é também um desabafo! Por fim, se quer um último exemplo, ainda que fora da área criminal, recorde seu texto "Não sei se você notou..." em http://www.midiasemmascara.org/artigo.php?sid=2495

Que Deus (mesmo você não acreditando) nos proteja!

Um abraço,
Cledson

terça-feira, outubro 24, 2006
 
SÚBITO JURISCONSULTO DEFENDE
O SAGRADO DIREITO DE MENTIR




Semana passada, o "filósofo" americano David Livingstone Smith andou dando entrevista à Veja. Segundo Smith, o mundo seria um caos se todos decidissem falar a verdade. O homem seria programado para enganar desde os primórdios da humanidade. Seja para proteger-se, seja para levar vantagem. Quem mente com desenvoltura, diz ele, pode até sobressair entre os demais. O exemplo clássico é o dos políticos, que mentem por profissão e continuam tendo o ouvido de milhares de pessoas. "A mentira está por toda parte. Ela é normal. Todos mentimos e quem diz o contrário mente. Temos dificuldade em nos reconhecer como mentirosos porque há um julgamento moral contrário. Mentimos para obter vantagens e para nos proteger de algo, o que significa que estamos, de certa forma, passando a perna em alguém. Quem mente bem costuma se dar melhor do que quem não consegue fazê-lo".

O governador eleito da Bahia, Jacques Wagner, parece ter lido a entrevista e a entendeu a seu modo. Em entrevista ao Estadão, disse que os petistas acusados de tentar comprar o dossiê Vedoin podem estar mentindo em seus depoimentos à Polícia Federal quando dizem não saber de onde veio o dinheiro (R$ 1,75 milhão) que seria usado na negociação do material destinado a envolver políticos tucanos com a máfia dos sanguessugas. Mas fez a ressalva:

- Ao réu é dado o direito de mentir, então não acho que o réu petista seja diferente de outros réus. Eu não estou defendendo que eles mintam. Estou dizendo que eles estão usando do direito, concedido pela lei, de que o réu não é obrigado a dizer toda a verdade. Se não fosse assim, seria simples descobrir os crimes. Eu posso estar com toda indignação em relação a esses que produziram tanto desgaste na reta final da campanha do presidente, mas, antes de eles serem petistas, são cidadãos brasileiros que se abrigam na lei.

O político petista, sem ser magistrado, está querendo criar jurisprudência. Não existe em lei alguma o direito de mentir. O que existe é o direito do réu de não incriminar a si mesmo. Este direito, Jacques Wagner o interpretou generosamente como direito de mentir. Os réus poderiam, por exemplo, afirmar tranqüilamente que o famigerado dossiê é obra do PSDB e estariam, segundo o súbito jurisconsulto, exercendo um direito sagrado. Vigisse esta exótica tese, mesmo assim deixaria brechas para deduções perigosas para a república petista. Segundo o novel jurisperito, o direito de mentir concerne ao réu. Quem não é réu - deduzimos - não goza deste direito sagrado.

Lula não é réu. Para melhor preservá-lo, Wagner poderia ter citado a constatação de Smith: "Quem mente com desenvoltura pode até sobressair entre os demais. O exemplo clássico é o dos políticos, que mentem por profissão e continuam tendo o ouvido de milhares de pessoas".

Se todos os homens do PT decidissem falar a verdade seria realmente um caos. Não digo para o mundo, mas pelo menos para a bandidagem que tomou posse do poder. Wagner o confirma.

 
DUAS CARTAS



Caro colunista Janer:

Imagine o espaço morto que ficará sem suas opiniões neste grande site-MSM. Seus artigos são sempre embasados em fatos e foram longos anos de leituras e experiências de vida. E sobretudo, pelo que entendi, o nobre colunista já esteve do outro lado,portanto, tem condições de fazer uma comparação abalizada das correntes filosóficas.O que não achamos correto é alguém pedir para que o jornalista cale a sua inteligência e portanto o poder de discernir entre o que melhor lhe convier. E até chegar ao cúmulo suplicar sua expulsão de um jornal porque suas idéias são dolorosas a alguns, não coadunam com a de um leitor. Devemos ser ecléticos, ler tudo que pudermos e escolhermos os melhores artigos e que desenhem com os nossos gostos filósoficos, do contrário ficaremos fadados a monotonia e seremos eternamente massa de manobra daqueles que estão por cima da carne seca. no final tiraremos nossas conclusões. É o mais lógico.Continue expondo suas idéias mesmo a despeito da dissonância com outras correntes sua ausência deixaria um vácuo muito grande de leitores assíduos às suas colunas. Um grande abraço.

Luiz Carlos Pontes


Na verdade, não querem necessariamente calar o Sr. Janer Cristaldo. Querem mudá-lo de endereço. Não é à toa que indicaram outros sites, comunistas, para domiciliá-lo. Janer sempre teve uma postura bem diferente dos outros colunistas, no tocante a questões religiosas. E por isso sofre tentativas de imposição da mordaça. Como a editoria do site exerce em seus domínios a liberdade de expressão, valor tão caro aos liberais, Janer pode, e deve, defender idéias em que acredita, mesmo que contrariando a tônica. Parabéns ao Midia Sem Máscara, por dar voz a colunista tão lúcido como o Sr. Cristaldo, por quem tenho apreço e admiração.

Eduardo Augusto dos Santos Monteiro

segunda-feira, outubro 23, 2006
 
AD USUM DELPHINI



Em minha última crônica, reproduzi trechos do livro Memórias Sexuais no Opus Dei, de Antonio Carlos Brolezzi, ex-numerário da organização. Tenho recebido não poucas mensagens de protesto, nas quais sou pichado ora como ateu, ora como herege, ora como infame. Houve até mesmo quem sugerisse que devia escrever em jornais bolcheviques. Ateu, creio que todos saibam que sou, e não vejo nenhum desvalor nisso. Vivemos em um Estado laico, não? Longe vão os tempos em que ser ateu era o caminho mais rápido para a fogueira. Ou alguém quer voltar àquela saudosa era?

Quanto a me recomendar para a imprensa comunista, creio que o leitor jamais deve ter lido as dezenas de crônicas que escrevi - já não digo ao longo de minha vida, mas pelo menos neste jornal - contra os bolches e seus compagnons de route. Nossa época está cheia de madalenas arrependidas, que um dia lutaram pela ideologia comunista e hoje fazem confiteor. Nunca fui madalena e muito menos arrependida. Quando havia abandonado o cristianismo, lá pelos 17 anos, fui cercado pelos camaradas. Perderam seu tempo. Eu já estudava filosofia e tinha elementos suficientes para julgar a precariedade do marxismo. Em meus dias de universidade, um amigo me definiu: "tu estás contra toda tua geração". Levei alguns anos para entender a frase. Ele queria dizer que eu não era marxista.

Curiosamente, não li uma palavra sequer contra o depoimento de Brolezzi, o cerne de minha crônica e autor das denúncias contra a Opus Dei. Verdade que, ao final da crônica, dei um rápido depoimento pessoal de meus dias de juventude, quando os padres queriam reprimir minha sexualidade. (O que foi muito oportuno, pois reagi e joguei fora a doutrina toda). Mas minhas considerações são apenas uma nota de pé de página ao livro do atormentado ex-numerário. Há quem fale, vagamente, em calúnias contra a Opus. Ora, se são calúnias, que se processe o autor. No entanto, pela reação de alguns leitores, parece que o autor do livro é este que vos escreve.

Isto é o de menos. O que me espanta nessas mensagens todas é o desejo expresso de expulsar-me do Midiasemmascara. "Sinceramente não consigo entender, não consigo captar, a razão da couraça de proteção que este MSM estende por sobre o tal Janer Cristaldo, o infame. Pela segunda vez uma minha mensagem de protesto contra um, digamos, artigo deste senhor não foi publicada, e nem sequer tive a delicadeza de receber uma resposta. Este site é conservador? É mesmo? Então por que vocês insistem em proteger as blasfêmias deste tal Cristaldo, o infame". Sintomático que o leitor tenha me pespegado o adjetivo infame. Era o mesmo empregado por Voltaire, quando bradava: Écrasez l'infâme! (Esmaguem a infame). Só que infame, para Voltaire, era a Igreja Católica.

Nada mais prazeroso para um homem honesto do que falar de si mesmo, diz um dos personagens de Dostoievski. É muito fácil soltar um insulto ao vento: fulano é infame. Ainda mais quando não se explica porque. O leitor me acusa de blasfemo. Ao que tudo indica, porque teço críticas à Igreja Católica. Ora, se assim for, boa parte da humanidade é blasfema, pois críticas à Igreja é o que não falta ao longo da História. Blasfemos seriam também os judeus, os luteranos, os protestantes, os evangélicos, isso sem falar nos marxistas, pois houve época - antes que padres católicos optassem pelo marxismo - em que os comunistas eram inimigos declarados do Vaticano. Eu fui católico, conheço bem a doutrina católica, tenho toda uma estante em minha biblioteca sobre religiões, cristianismo e catolicismo e não costumo pregar prego sem estopa. Dessa estante constam várias bíblias, mais a Torá, mais a bíblia judaica (recentemente editada no Brasil) e também um Alcorão. O leitor em questão, citando Gustavo Corção, me compara aos "cretinos de O Pasquim". Mais respeito, por favor. Eu conheço o tema sobre o qual escrevo e nada tenho a ver com aqueles moleques medíocres das esquerdas de Ipanema.

Que leitores discordem do que escrevo, entendo. Acho muito engraçado quando um leitor me escreve: "desculpe discordar, mas..." Ora, discordar é direito inalienável de todo leitor. Ninguém precisa pedir desculpas para discordar. Diga-se de passagem, gosto quando leitores manifestam discordâncias. Caso contrário, estaria escrevendo para mim mesmo. Que me contestem e me xinguem, também entendo. Mais difícil de entender é que pretendam calar-me. A impressão que tais leitores me passam é que querem um jornal ad usum Delphini. Aos jovens que chegaram tarde - ou não chegaram - às aulas de latim, explico. A expressão tem suas origens na França, onde vinha estampada na capa dos textos clássicos destinados à instrução do filho do rei Luís XIV, herdeiro do trono, dito o Grande Delfim. A coleção ad usum Delphini compreendia 64 volumes, censurados pelo duque de Montausier, sob a supervisão de Bossuet, um dos principais teóricos do absolutismo por direito divino.

Neste sentido, os zelosos guardiões da fé cristã em nada se distinguem dos velhos marxistas. Após 64, surgiram vários jornalecos católicos ou marxistas - Brasil Urgente, Movimento, Opinião, Versus - nos quais a uniformidade de pensamento era de um tédio atroz. Os artigos todos desses jornais levavam sempre a uma só conclusão e quem lia uma edição havia lido todas. Seus leitores os liam apenas para reforçar o que já pensavam. Não encontrávamos surpresa alguma em seus textos, nenhuma idéia nova, ou pelo menos diferente, que mais não fosse.

É o que parecem pretender certos leitores deste jornal: uma uniformidade de exército, uma proibição a qualquer olhar diferente. Mestre Corção - como diz o leitor - cita a epístola de São Paulo aos Gálatas: "Ainda que eu mesmo, ou um anjo descido dos céus, vos anunciasse outro evangelho e não este que vos anunciei, seja anátema".

Seja anátema para os cristãos, meu caro. Vivemos em um mundo plural e não me parece que o MSM seja porta-voz de qualquer religião. Leio dois ou três jornais por dia e eles estão repletos de reportagens ou artigos que não me agradam. Não será por isso que deixarei de lê-los. Pelo contrário, é por isso que os leio. Preciso saber o que pensam apparatchiks como Frei Betto, Leonardo Boff, Marilena Chauí, Tarso Genro, Emir Sader, preciso saber até mesmo o que Lula pensa que pensa. Se desconheço o que pensam os velhos bolcheviques, não tenho argumentos para combatê-los. Minha biblioteca, além de abrigar centenas de obras cristãs ou católicas, concede também um largo espaço aos autores comunistas. A derrota é certa quando não se conhece o inimigo.

Meu fanático leitor me faz lembrar um colega marxista de jornal, em meus dias de Caldas Júnior, em Porto Alegre. Estávamos em 73, por ocasião do golpe no Chile e ele fazia plantão no Correio do Povo. Quando se tornou inevitável a queda de Salvador Allende, ele não teve dúvidas: desligou o telex. Estabeleceu seu próprio ad usum Delphini. Como se, interrompendo o fluxo de notícias, conseguisse desviar os rumos da História. Dia seguinte, o editor teve de pedir ao jornal concorrente os telegramas das agências internacionais.

Meus fanáticos leitores (falo no plural porque vocês são legião): esse desejo de um jornal de pensamento único em nada difere do sonho de tiranos do século passado, desde Stalin a Mao, passando por Envers Hodja, Pol Pot, Ceaucescu e Fidel Castro. Vocês caíram em país errado. Uniformidade de pensamento, hoje, só na Pravda, no Gramma, no Osservatore Romano. Vocês pedem uma imprensa que o PT adoraria ter.

Neste Brasil de hoje, nem vocês nem o PT a terão.

domingo, outubro 22, 2006
 
AINDA O COMPOSITOR BOLCHEVIQUE E MEDÍOCRE



Janer,

não posso deixar de agradecer pela transcrição da mensagem no seu blog, o que muito me honra. Mas o que eu queria mesmo dizer, ainda sobre o "fazedor de ruídos", é que por ocasião do meu primeiro curso superior eu assisti a uma apresentação do Professor argentino Luis Mucillo e posso confirmar que ele era um verdadeiro talento. Lembro-me da minha surpresa ao constatar, na minha ignorância adolescente, que existia boa música erudita contemporânea. Eu nunca soube dos bastidores de sua saída, mas conhecendo o "ninho de cobras" que é a UnB e sabendo que envolve o maestro horribilis, essas informações não me espantam nem um pouco. Abração e uma ótima semana para você.

Costa Filho

 
ERA SÓ O QUE FALTAVA!


Agora não falta mais. Na França, os muçulmanos passaram a agredir os ginecologistas que atendem suas mulheres.

O ministro da Saúde francês, Xavier Bertrand, expressou ontem sua indignação depois da agressão contra um ginecologista por parte do marido de uma paciente em setembro passado, fato que foi denunciado pelo Colégio Nacional de Ginecologistas e Obstetras da França (CNGOF) como uma manifestação de "integrismo muçulmano". A segunda agressão do mesmo tipo aconteceu em 2003, na periferia de Paris. Segundo a CNGOF, dois ginecologistas-obstetras "foram agredidos fisicamente e feridos por maridos de pacientes, que argumentavam que médicos homens não podem examinar suas esposas muçulmanas".

Suponho que não esteja no Corão, mas o fato é que machos muçulmanos não suportam a idéia de que um médico examine intimamente suas mulheres. No ritmo em que marcha a submissão européia ao Islã, em breve os ginecologistas franceses seguirão as recomendações do sábio aiatolá Khomeiny, que determinava aos médicos iranianos munir-se de um espelho ao examinarem suas pacientes. Para não cometer o sacrilégio de olhar diretamente o sexo feminino.

sábado, outubro 21, 2006
 
SOBRE O COMPOSITOR BOLCHEVIQUE E MEDÍOCRE



De um leitor indignado, recebo estas informações:

Leio seu blog com grande prazer, sempre que posso. Acabo de ler o post sobre a montagem de Olga e resolvi lhe escrever para contar uma coisa sobre o sr. Jorge Antunes que sempre me deixa indignado quando dela me lembro. A música contempôranea, a verdadeira, não a cacofonia desembestada dos Antunes da vida, foi uma das minhas paixões adolescentes. Há mais de 10 anos, na UnB, havia um professor de composição argentino chamado Luis Mucillo, cheguei a ouvir algumas de suas peças, belíssimas de fato.

Se bem me lembro, ele não dispunha de toda a documentação ou títulos suficientes para a posição que ocupava, mas seu saber era notório. Os alunos o adoravam, e suas peças se distinguiam a cada concerto, pela profundidade, pelo lirismo. Isso deixava o sr. Jorge Antunes numa posição desconfortável, some-se a isso as infindáveis picuinhas do meio acadêmico. Eu freqüentava o departamento de música, mas não era músico, e conhecia muita gente lá. Eis o que aconteceu: o sr. Jorge Antunes deu um jeito de "impugnar" o saber notório do compositor argentino e expulsá-lo do departamento.

Luis Mucillo, tinha titulação, mas "européia". Essa titulação, por burocracia, não era reconhecida na UnB. Ele dava seis aulas diferentes ligadas à composição, numa carga horária extraordinária, como professor substituto. O Antunes não dava aula, ficava apenas flanando pelo departamento, e cuidando, pasme, dessa ópera que agora acaba de estrear. Isso sem estar de licença, viajava a Europa e deixava uma aula numa fita cassete (genial!) para os alunos. Ele queria obrigar o Mucillo a assumir mais responsabilidades, caso contrário seu contrato de professor substituto não seria renovado. Era apenas uma armadilha para expulsar o Mucillo, que tinha uma produção sólida e regular, como professor e compositor.

Os alunos fizeram um abaixo-assinado para que ele permanecesse. Acabou sendo expulso. Suas obras são executadas com freqüência em Buenos Aires e têm sido premiadas. O colegiado decidiu, com apenas uma abstenção, justo a de um ex-aluno do Mucillo, a não renovar seu contrato de prof. substituto. Em vez disso, o substituiriam por um co-repetidor, cargo esse ao qual ele poderia concorrer, mas não quis. Parece que o Antunes, socialista e arauto da esquerda, foi, segundo um professor da UnB, que o conhecia desde a época da ditadura, um tremendo cagüeta. Mas isso é boato, crível, mas boato.

 
POETA DE MÃO CHEIA


Já publiquei neste blog alguns poemas de juventude de Tarso Fernando Hertz Genro, doublé de poeta e agitprop, atualmente ministro das Relações Institucionais. Ou seja, Explicador-Geral da República. A última edição de Veja nos traz novas pérolas do jovem vate, de uma de suas obras sementais, Luas em Pés de Barro.

"A vovó Cacilda parecia uma patinha
e a vovó Julica elétrica e risonha conversava com lagartos"

"Quanto te esperei e quanto sêmen
inútil derramei até o momento"

"Em Cuba planta-se cana"

sexta-feira, outubro 20, 2006
 
POR QUE PROTEGEM O CRISTALDO?


Mensagem enviada ao MSM em 20/10/2006


Amigos,

sinceramente não consigo entender, não consigo captar, a razão da couraça de proteção que este MSM estende por sobre o tal Janer Cristaldo, o infame. Pela segunda vez uma minha mensagem de protesto contra um, digamos, artigo deste senhor não foi publicada, e nem sequer tive a delicadeza de receber uma resposta. Este site é conservador? É mesmo? Então porque vocês insistem em proteger as blasfêmias deste tal Cristaldo, o infame. Deixo apenas uma passagem do mestre Corção, em artigo no Globo, em agosto de 1971, quando se indignava contra pilherias dos cretinos de O Pasquim contra Nosso Senhor e a Santa Ceia.

Leiam e reflitam sobre o comportamento de vocês.

Um abraço do leitor e admirador (ainda),

"Neste ponto, recusando-me a acompanhar as intenções dos humoristas de O Pasquim, que já resvalavam para os esgotos, perdi-me em perplexidades. Ora parecia-me que não devia tomar conhecimento do fenômeno; ora parecia-me inadmissível deixar tamanho agravo sem nenhum protesto. No começo do século, um personagem de Chesterton, em A Esfera e a Cruz, quebra a bengaladas as vidraças do jornal que ofendia Nossa Senhora. Na Action Française, como "camelot du Roi", antes de espancar meio mundo com a pena, Bernanos usou generosamente a bengala. Mas os tempos passaram, a bengala saiu de moda, como estão saindo o pudor, o caráter e o respeito. E eu mesmo, que há 50 anos fui esgrimista, só posso hoje gemer com o alexandrino de Corneille: "O rage, o desespoir, o vieillesse ennemie". (...) Não fiz nenhum voto de estupidez e de hipocrisia e não posso aceitar de nenhum degrau da hierarquia que me venha dizer que "é válido" blasfemar, que não há nenhum mal em zombar das coisas santas, já que tudo, uma vez impresso, vira "material jornalístico". E lembro a epístola de São Paulo aos Gálatas: "Ainda que eu mesmo, ou um anjo descido dos céus, vos anunciasse outro evangelho e não este que vos anunciei, seja anátema"".


Luis Gustavo

quinta-feira, outubro 19, 2006
 
COMPOSITOR ABSOLUTAMENTE MEDÍOCRE



Janer,

seu artigo sobre a ópera Olga me fez lembrar da figura de Jorge Antunes, compositor absolutamente medíocre e professor de música da UnB (o que só demonstra a falência da Academia no Brasil). Ele é bem conhecido em Brasília por viver mendigando verbas públicas por intermédio da chatíssima mulher dele (que o considera um gênio absoluto) e durante certo tempo atormentou a área cultural do Itamaraty para a divulgação de suas obras no exterior. Certamente existe uma relação direta entre a baixa qualidade das obras de certos intelectuais brasileiros e sua necessidade famélica por verbas públicas. Abração e uma ótima quinta-feira para você!

Costa Filho

quarta-feira, outubro 18, 2006
 
SANTA OLGA E A INDIGÊNCIA MENTAL TUPINIQUIM



Estreou sábado passado, no Theatro Municipal de São Paulo, a ópera Olga, de Jorge Antunes. A Olga em questão é a Benario, aquela apparatchik alemã, oficial do Exército Vermelho, que veio ao Brasil em 1935 com Arthur Ernest Ewert e mais uma vintena de agentes comunistas, com a missão de transformar o país em uma republiqueta socialista ao estilo de Moscou. Os anos 30 foram de grande excitação bolchevique, Stalin investia não só no Brasil mas também na China e na Espanha. Como marionete desta equipe vinha o gaúcho Luís Carlos Prestes, disfarçado como marido de Olga.

Não é nem será preciso ir ao teatro para intuir que a ópera será um hagiológio da celerada alemã. É óbvio que um dos momentos culminantes da obra será aquele em que Getúlio Vargas a entrega para a Alemanha hitlerista. Jorge Antunes, inconformado com a série de negativas recebidas das empresas em patrocinar a montagem de sua ópera, organizou uma carreata em Brasília, na tentativa de enfiar a mão no bolso do contribuinte para trazer a público sua ode ao totalitarismo. Em um ímpeto teatral, pretendia organizar um ato público na Universidade de Brasília, onde enterraria a partitura em um cofre que, "quem sabe, poderia ser encontrado daqui a cem anos". Pelo jeito, tanto drama não foi necessário. No Brasil, nunca faltou empresário para patrocinar santorais a quem queria afundar o país.

Judia, Olga acabou morrendo em um campo de concentração. Sua extradição do Brasil e morte na Alemanha lhe conferiram uma aura de santidade e martírio. Quando na verdade nunca passou de uma bandoleira internacional. Getúlio ficou como o vilão da história, embora Luís Carlos Prestes o tenha apoiado mais tarde, em sua candidatura à Presidência da República. Condena-se em Getúlio o gesto de tê-la entregue a Hitler, após um pedido de extradição da Alemanha nazista. O que se esquece é que Olga obedecia as ordens de outro grande assassino de judeus, Stalin.

É espantoso que, 17 anos após a queda do Muro de Berlim, 15 anos após o desmoronamento da União Soviética, ainda se ergam altares a líderes comunistas. O que só demonstra a indigência mental - para não dizer mau-caráter - dos criadores tupiniquins.

terça-feira, outubro 17, 2006
 
WIKIPEDISTA TOMA VERGONHA



A Wikipedia sempre me pareceu um projeto irresponsável e demagógico.

Projeto irresponsável porque não se pode imaginar uma enciclopédia com verbetes cambiantes. Considerando-se ainda que os verbetes são feitos por qualquer um, sempre que estiver em jogo religião, política ou ideologia, teremos não conceitos mas opiniões. Em geral, opinião de fanáticos e torcedores. Em crônica passada, fiz observações a alguns verbetes, particularmente os que se referiam a vigaristas como Madre Teresa de Calcutá, Rigoberta Menchu, ou Bhagwan Shree Rajneesh, que depois de ter o nome mais sujo que pau de galinheiro, trocou-o para Osho. Leitores me advertiram que, em se tratando de celebridades, eu encontraria os mesmos equívocos mesmo em enciclopédias como a Barsa ou Britannica. Pode ser. Aliás, de fato é. Mas prefiro uma enciclopédia com erros permanentes do que outra com erros cambiantes. Como citar uma obra que muda seu texto conforme o humor de seus autores?

Projeto demagógico porque confere a qualquer um a qualificação de enciclopedista. O que explica a ira provocada por meu artigo. Todo militante da Wikipedia me considerou um inimigo figadal. Descobri algo de religioso nos wikipedistas: defendiam o projeto com o mesmo fanatismo que um cristão ou muçulmano defendem suas fés. Afinal, a Wiki os equiparava a um Voltaire, Rousseau, Diderot, D'Alembert.

Parece que os criadores da enciclopédia estão chegando às mesmas conclusões. Larry Sanger, um dos fundadores da Wikipedia, está lançando um serviço concorrente, mas cujo conteúdo será controlado por especialistas e com menor liberdade de intervenção para os visitantes. Frustrado com a qualidade do conteúdo, explica que quer garantir um conteúdo mais responsável em seu novo projeto, a citizendium.com. Os internautas poderão contribuir com seus textos, mas estes serão submetidos a um comitê de editores especializados e moderadores. Estes especialistas deverão demonstrar "um nível mínimo de qualificações, baseados em medidas do mundo real" como diplomas, explicou.

Já melhorou. Alguma qualificação se pede de quem pretenda construir conhecimento. Surge um outro problema. A consulta à Wikipedia era gratuita e só podia ser gratuita porque seus "enciclopedistas" não eram remunerados. Pesquisadores qualificados aceitarão colaborar sem serem pagos? É o que resta saber.

segunda-feira, outubro 16, 2006
 
L'ISLE ADAM E OS INIMIGOS DA NOITE



O advogado norte-americano JH Huebert pretende apresentar na Conferência Astronáutica Internacional, que acontece essa semana em Valência, na Espanha, um documento defendendo a presença de painéis publicitários na órbita do planeta. Huebert defende a instalação de outdoors no espaço para que fossem vistos da Terra, com ajuda de um telescópio. Claro que tal idéia só podia ter surgido do bestunto de um cidadão do país de Superman.

Há uns bons dez anos, já comentei um desses projetos megalômanos. Na época, era um russo, Vladimir Syromyatnovik, que pretendia iluminar cidades imersas na escuridão boreal, em uma faixa que ia do Canadá à Sibéria, passando inclusive pelo norte da Europa. Para isso, utilizaria um sistema de espelhos de 25 metros de diâmetro, colocado no espaço pela nave Mir. A brilhante idéia acabou indo para o lixo das idéias bestas, para felicidade dos que amam as noites.

Villiers de l'Isle Adam (1838-1889) é um visionário escritor francês de meados do século XIX. Filho de uma família nobre e decadente, deixou obra curta mas perturbadora. Entre eles, os livros Contes Cruels, Noveaux Contes Cruels, Histoires Insolites e L'Eve Future. Em um de seus contos, "L'Affichage Céleste", nos relata o projeto de M. Grave, um engenheiro - americano, é claro. Surpreso com a inutilidade das azuladas abóbadas celestes, que para nada servem a não ser para desenfrear a imaginação doentia dos últimos sonhadores. O céu precisava ser elevado à altura da época. Por que não retirar algum lucro desse imenso espaço estéril e vazio? Após muitas viagens e pesquisas, M. Grave aperfeiçoou lentes e refletores gigantescos, com os quais pretendia garantir às grandes indústrias e mesmo aos pequenos negociantes, o recurso de uma Publicidade Absoluta.

Após o entardecer, uma animação inusitada, "que só os interesses financeiros são capazes de proporcionar", tomaria conta dos espaços celestes. Potentes projetores lançariam, a partir de colinas, anúncios de echarpes rumo ao fundo do céu noturno, em algum espaço entre Sirius e Aldebarã. Entre as patas da Grande Ursa leríamos propaganda de espartilhos. A polícia projetaria nos céus fotos cem mil vezes ampliadas de criminosos, os políticos teriam seus sorrisos expostos sob a estrela Beta da Lira.

Mais de século antes de JH Huebert, L'Isle Adam antecipava ironicamente sua invasão dos espaços celestes. Evidentemente, nestes nossos dias televisivos, teríamos horários nobres e espaços privilegiados. A abóbada celeste seria o preferido de todos os gigolôs do absoluto e criadores de religiões. Imagine o leitor o poder de persuasão de um Cristo de braços abertos no entardecer, convidando os mortais a aderir à sua doutrina.

Quase quatro décadas mais tarde, em A Sinfonia Pastoral, André Gide evocava o mistério das noites. Nesta sofrida novela, um velho pastor anglicano, apaixonado por uma menina cega, pergunta-se: "Est-ce pour nous, Seigneur, qui vous avez fait la nuit si profonde et si belle?" A boa e velha noite, que embalou durante milênios o sono da vida no planetinha, está virando luxo de privilegiados. Hoje, se quisermos nos deixar envolver pela sua magia ancestral, precisamos viajar, e cada vez mais longe.

A invasão das abóbadas, maldição entrevista por L'Isle Adam no século XVIII, foi protelada. Agora paira sobre as noites, cada vez mais distantes de nós, a ameaça de Mr. Huebert. Que, felizmente, acabará também na lata de lixo aquela.

 
A CARNE É FORTE



São Paulo tem mistérios. Acabo de ler um depoimento insólito, relato que imaginaríamos situado nalguma aldeia espanhola ou italiana, há uns dez séculos atrás, em plena Idade Média. No entanto, acontece nesta metrópole, em pleno século XXI. Falo do livro Memórias Sexuais no Opus Dei, de Antonio Carlos Brolezzi. Não é livro que eu recomende a quem anda em busca de boa literatura. Apenas para quem gosta de informar-se sobre os abismos da miséria humana.

Brolezzi, 40 anos, professor do Instituto de Matemática e Estatística da USP, casado pela segunda vez e pai de uma filha, é mais uma destas pessoas que, sem ter maiores conhecimentos de história ou filosofia, caiu nas mãos de uma seita de fanáticos. Pertence àquela estirpe de pessoas como Salvador Dali, Luiz Carlos Prestes e Louis Althusser, que só foram conhecer sexo tardiamente. No caso em questão, aos 30 anos. Convidado para um curso de Astronomia por professores da USP, foi aos poucos cooptado para a Opus Dei.

"Quando eu entrei na USP para cursar Matemática começaram a me ligar, não me deixavam em paz um segundo. Criaram uma crise artificial de vocação. Vendem que somos especiais, que temos uma luz na testa, e ficamos seduzidos. Passamos a ter acesso a uma porta secreta, mostram uma sala onde só eles se reúnem. Você passa a ter uma vida secreta, não pode contar a sua família".

Brolezzi entrou para a Opus Dei aos 19 anos, sem jamais ter tido uma relação sexual, e logo chegou à condição de numerário, isto é, integrou-se oficialmente à organização. Uma vez nela, não podia olhar para mulheres, tinha de cuidar-se nos ônibus ou metrô para não roçar os seios de alguma mulher, suas leituras de jornais ou revistas eram previamente censuradas por seus superiores. Não estava autorizado nem mesmo a ler outdoors. Em tais confinamentos de jovens, a masturbação obviamente é a regra. Brolezzi tinha um curioso método para a prática, desenhava uma vagina em um caderno. Seu confessor ficou intrigado: como ele sabia desenhar a coisa, se nunca havia visto uma? "Eu disse que imaginei como se fosse uma boca, só que na vertical".

As restrições à masturbação na comunidade nos fazem voltar ao século XVIII, mais precisamente a 1710, quando o Dr. Tissot escreveu um dos clássicos da literatura obscurantista, L'Onanisme - dissertation sur les maladies produites par la masturbation. Neste monumento à estupidez humana, o autor nos mostra diversos aparelhos para impedir o onanismo, entre eles um cinturão e um colete antimasturbação, que serviam para impedir o toque do pênis. Para mortificar a carne, todo numerário devia portar, duas horas por dia - e todos os dias, exceto domingos e festas - um cilício, uma malha pontiaguda amarrada na coxa, que fere a pele com pontas de metal. Aos 60 anos, lhes é concedido o privilégio de não mais tomar banhos frios. Para evitar os atos solitários, seu confessor recomendou-lhe costurar uma camisa de flanela a um jeans e vestir o conjunto com o lado posterior pela frente, de modo a não ter acesso ao próprio sexo. Como em 1710, a masturbação continuava a ser vista como doença mental.

Tais precauções obsessivas com a sexualidade só produzem uma coisa: comunidades de erotômanos. A masturbação era moeda corrente. Sendo pecado mortal, os numerários não podiam comungar sem antes serem absolvidos pela confissão. A imensa fila nos confessionários tornava-se algo humilhante, pois denunciava os pecadores. Para afastar as tentações, Brolezzi adormecia rezando o terço. Em certas ocasiões, acordava com o instrumento de preces enrolado no instrumento de pecado.

Brolezzi fez mestrado na USP, entrou em ano de doutorado e, apesar do contato diário com suas colegas, continuava sem saber o que fosse a tal de vagina. Neste ponto da leitura, uma pergunta me passou pela cabeça. Como pode alguém viver numa metrópole sem ter idéia do que seja uma vagina, afinal elas estão mais ou menos expostas em qualquer banca de jornais? Minha pergunta era pertinente. Os membros da Opus Dei estão proibidos de olhar bancas de jornais e mais ainda, devem desviar de calçada se vêem uma pela frente. As restrições à leitura são de tal ordem que a própria bibliografia do doutorado em matemática tinha antes de ser revisada pelo seu confessor. Aos 30 anos, virgem ainda, foi levado por uma menina a um motel. Aconteceu o que seria de esperar-se, não conseguiu consumar a coisa.

Fiz meu ginásio em um colégio de oblatos e entendo as angústias de Brolezzi. Cilício e macacão anti-masturbação à parte, vivi todas estas peripécias. Pecado, confissão, absolvição, contrição, estado de graça. E de novo a monótona sucessão: pecado, confissão, absolvição, contrição, estado de graça. Vivia em permanente tensão, sempre em pânico antes de cada confissão, sempre humilhado pelo confessor a cada fim-de-semana e sem nunca chegar a um equilíbrio entre mim e meu sexo. As piores noites eram as de tempestade. Direis que eu era um megalomaníaco. Até pode ser. O fato é que a cada raio que caía dos céus eu sentia que o Deus todo-poderoso os endereçava a este temeroso pecador.

Até que um dia decidi ler a Bíblia com espírito crítico. Encerrei-me por três dias em meu quarto e, ao sair do quarto, estava liberto de toda aquela tralha opressiva. Não havia nada na Bíblia que determinasse aquelas punições tremendas mencionadas nos catecismos. Minha sexualidade deixou de ser sofrimento, mas motivo de alegria. Abandonei a idéia de pecado e de ilhapa também a de Deus. Bem entendido, isso ocorreu há mais de meio século atrás. Libertei-me cedo dos grilhões e tratei de recuperar o tempo perdido.

Falei de início nos mistérios de São Paulo. É espantoso constatar que estas torturas se repetem hoje, 2006, no espaço de uma megalópole cosmopolita, onde o sexo é onipresente nas ruas, praias e parques, bancas de jornais, outdoors e mesmo no vestuário das transeuntes. Mas a Opus é algo muito maior e nada tem a ver, em suas origens, com São Paulo. Foi fundada em 1928, pelo espanhol Josemaria Escrivá de Balaguer, monsenhor recentemente canonizado por João Paulo II. Segundo o vaticanista John Allen Jr., a Obra tem 85 mil seguidores (1.700 no Brasil), um patrimônio na casa do 2,8 bilhões de dólares e milhões de admiradores. A Opus sempre procurou se manter oculta e, não fosse o depoimento de suas ovelhas desgarradas, não teríamos conhecimentos destas barbaridades inconcebíveis no Ocidente hodierno. Depois ainda há quem se escandalize quando os muçulmanos cortam o clitóris de suas mulheres ou quando fustigam os próprios corpos até brotar sangue. A estupidez, além de universal, parece ser eterna.

A carne é fraca - diziam os padres e moralistas de meus dias de colégio. Sempre discordei deste axioma. A carne é forte, penso, tanto que tem sido fator de libertação de milhares de pessoas da opressão do obscurantismo. Aconteceu comigo, aconteceu com seminaristas e padres que não suportaram viver em conflito com o próprio corpo. Expulso do ginásio dos oblatos, antes de abandonar definitivamente a crença nas coisas do Além, militei algum tempo em JEC e JUC. Tive contato com padres mais abertos e até hoje lembro com afeto do Carlos Pretto, que costumava dizer: "Mulher e religião não se discute, se abraça". Era também dele a frase: "Se batina fosse bronze, que badaladas!"

Praticamente todos os padres que tiveram contato conosco - isto é, com jovens, moças e rapazes - acabaram largando a batina. Não conseguiram resistir à tentação daquelas militantes árdegas e todas hormoniosas que lhes confidenciavam seus pecados mais íntimos no silêncio das sacristias. "É vício qualquer tipo de antinatureza" - escreveu Nietzsche. "A mais viciosa espécie de homens é o padre: ele ensina a antinatureza".

Brolezzi, o doutorando da USP que não sabia como era o sexo feminino, libertou-se. Graças à carne. Quantos de seus colegas de Opus ainda não se torturam com o cilício e a abstenção sexual? Difícil saber. O que importa saber é que esta nossa época, tão científica e tão cheia de luzes, ainda abriga monstros morais dos tempos de Tissot.

domingo, outubro 15, 2006
 
MISTÉRIO, PROFUNDO MISTÉRIO!



Acabei de jantar com a TFP. Exato, a Tradição, Família e Propriedade. Não que a graça divina tenha me tocado e eu tenha me convertido ao culto de Maria. Nada disso. Em verdade, há anos janto com a TFP. Ou pelo menos tomo um vinho com eles. Explico.

O restaurante Baronesa, na Baronesa de Itu, fica a uma centena de metros de meu prédio. Como um de meus vícios é ler em restaurantes, sempre bato ponto no Baronesa aos domingos, nem sempre para jantar, mas pelo menos para ler um pouco, acompanhado de um bom chileno ou argentino. E é aos domingos que a TFP houve por bem se reunir lá. (Às sextas-feiras é a maçonaria).

São senhores de meia-idade para cima, todos de terno e gravata, distintivo na lapela. Chegam todos juntos, lotam umas dez mesas, sempre pedem pizza e três cervejas para cada mesa. Quando chega o mandachuva, todos se levantam, fazem a persignação e só depois se dedicam às pizzas. São todos bem apessoados, aparentam prosperidade econômica, em suma, fazem o perfil de profissionais liberais bem sucedidos. Misóginos totais. Desde que moro no bairro - e já lá vão seis anos - nunca vi uma mulher entre eles. Ao final da janta, de novo o sinal da cruz. Saem sempre todos juntos.

Eu, que de mariologia entendo um pouco, continuo até hoje perplexo. Pra início de conversa, eles dedicam suas vidas ao culto de uma mulher. Mas mulher alguma participa de suas reuniões. Em minha juventude, fui presidente de Congregação Mariana e também participava do mesmo culto. Nós cultuávamos uma mulher, é verdade, mas desprovida de qualquer sexualidade. Cultuá-la significava, paradoxalmente, cultivar a castidade. Adulto, o mistério de Maria me intrigou ainda mais. Qual foi a trajetória histórica desse personagem obscuro que - fora o fato de ser mãe de um deus - desempenha um papel quase imperceptível nos Evangelhos e no entanto hoje é cultuada como uma semideusa?

Enfim, tenho minhas respostas para o enigma, mas não é o caso de discuti-las agora. Entre os vários livros que tenho sobre o assunto e se o leitor quiser um título interessante, voilà: Mary - The Unauthorized Biography, de Michael Jordan. Há uma tradução para o espanhol, pelas Ediciones B, de Barcelona. O autor aventa, entre outras hipóteses, que Maria seria uma prostituta sagrada.

Outro fato que me intriga é a ausência de mulheres. Não suporto uma mesa sem mulheres. A mulher é o fator civilizador, que atenua a rudeza dos encontros entre machos. Mesmo que os machos sejam polidos, a mera presença de uma mulher sempre torna uma mesa mais amena, mais elegante. O mesmo ocorre com os maçons das sextas-feiras. Nenhuma mulher entre eles. Os extremos se tocam.

A sede da TFP fica numa rua próxima ao bar, inclusive o famoso oratório que nos 60 teria sido atacado por comunistas. Não é incomum ver-se, durante o mês de maio - mês de Maria - marmanjos ajoelhados frente ao oratório murmurando pais-nossos e ave-marias, por mais fria que seja a noite. Têm vários imóveis de altíssimo valor no bairro. Fico me perguntando: que profissões têm estes senhores? Terão mulheres, filhos? Se têm, por que não os levam a seus encontros? Como é que fazem os filhos? Qual a faixa de renda desta gente? Segundo meus garçons, seriam todos uns pés-rapados. Na saída, são sempre um ou dois deles que pagam a conta toda.

Como podem se prestar pessoas aparentemente prósperas e aparentemente cultas ao culto de uma crendice medieval? Sim, medieval, pois a virgindade de Maria não consta dos Evangelhos. Vontade de sentar entre eles e fazer uma longa entrevista, interrogá-los sobre suas vidas e seu dia-a-dia. Mas vejo que não há clima.

A turma começa a levantar-se, fazem o sinal da cruz e deixam o bar. Me recolho em minha leitura, murmurando com meus botões: mistério, profundo mistério!

Falar nisso, amanhã conto uma história de outro grupo exótico - para dizer o mínimo - a Opus Dei.

sábado, outubro 14, 2006
 
ORACIÓN


Serafin J. Garcia

Poeta uruguaio (1905-1985)


Tata Dios: yo no dudo que siás juerte;
que gobernés vos solo tierra y cielo;
que a tu mandao se apague'l rejucilo
y se amanse'l más potro de los vientos.

No dudo que haygas hecho esas estreyas
que sirven de candiles a los sueños,
y p'aliviar el luto de las noches
priendas la luna en su reboso negro.

No dudo que siás vos el que le puso
al colmiyo'e la víbora el veneno;
el que afiló las uñas de los tigres
y le dio juersa'l pico de los cuervos...

Pero dudo'e tu amor y tu justicia,
pues si juera verdá que sos tan güeno
no te hubieras yevao aqueya vida
qu'era pa mí más grande que tu cielo.

Vos sabés, Tata Dios, cómo la quise.
Eya jué'l sol que amaneció en mi pecho.
Por eya tuvo primavera mi alma
y echaron alas mis mejores sueños.

Eya era linda como las mañanas
cuando dispiertan yenas de gorjeos;
alegre como el ruido'e las colmenas;
graciosa como el'unco'e los esteros.

¡Y era tan güena, Tata Dios!... ¡Tan güena!
Nunca un rencor se cubijó en su pecho.
Pa tuitos tuvo corasón sin trancas
rebosao de ternuras y de afetos.

Y creyó siempre'n vos: tuitas las noches
s'endulsaba en su boca el Padre Nuestro,
mientras su almita'e pájaro aletiaba
ofertándose entera en cada reso.

¡Y tuviste coraje pa matarla!
¿No pensaste que yo tamién juí güeno,
que no meresco este dolor que sangra
la herida siempre viva'e su ricuerdo!

¿Cómo no viá dudar de tu justicia?
¿Cómo viá crer que tengas sentimiento
si vos, provalecido de tu juersa,
nos quitás siempre lo que más queremos?

¿Pa qué nos diste corasón, entonce'?
¿Pa qué nos esigís que siamos güenos,
si nos encariñás con este mundo
y en él ponés nomás que sufrimientos?

¿Cres que consuela tu promesa'e gloria?
Si aquí and'hemos nacido, ande queremos,
nos negás el derecho'e ser dichosos,
¡no sé pa qué nos va'servir tu cielo!

sexta-feira, outubro 13, 2006
 
CEGUINHO DE CARTEIRINHA



Meu caro Janer:

Aqui é o Vanderlei Vazelesk, professor do Colégio Militar do Rio de Janeiro.
Um detalhe, eu acho que não te contei. É que eu sou cego. Sou pai
de uma filha e procuro, por menos que enxergue, saber muito bem o que
acontece na minha casa.

Não te escrevo por politicamente correto, mas para concordar contigo, que a
gente tem obrigação de saber o que vai em casa.

 
PROFETA E PEDÓFILO


O Partido Popular Dinamarquês incluiu nesta semana uma caricatura do profeta Maomé como um pedófilo em um número de sua revista de distribuição interna, Folkeblad. A charge, na qual se vê o profeta com uma jovem, foi retirada de um livro de um autor alemão sobre Maomé e sua vida sexual, publicado em 2004. Nos próximos dias, teremos manifestações de ódio à Dinamarca em todas as mesquitas do mundo.

O deputado Nasser Khader, promotor da iniciativa Muçulmanos Democráticos, pediu ontem mesmo à presidente do partido, Pia Kjaersgaard, e ao primeiro-ministro, Anders Fogh Rasmussen, que se distanciem do conteúdo da charge para que não seja usada para "avivar" o conflito nas preces desta sexta-feira dos imames.

Ou seja, a biografia do profeta está proibida. Sabe-se que Maomé teve onze mulheres, entre elas Aisha, que tinha seis anos de idade na altura do seu noivado e, segundo os historiadores, foi deflorada aos nove anos.

quinta-feira, outubro 12, 2006
 
AFRODESCENDENTADA E AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA




Em meus dias de universidade, que já vão longe, reprovei certa vez uma menina negra. Ela protestou furiosa, quase espumando: "Racismo, professor, racismo". Pedi que viesse até minha mesa. Ela relutou, mas acabou vindo. Mostrei-lhe então minha lista de chamada. Eu havia dado zero a treze alunas e todas as demais eram brancas. Se algum racismo havia, era um racismo contra as brancas. Diante das evidências, a negrinha retirou seu cavalinho da chuva.

Fui salvo por uma dúzia de brancas. Imagine o leitor se por acaso a menina negra fosse a única a ser reprovada. Eu teria no mínimo um processo judicial pela frente. Estávamos nos anos 80, quando o racismo negro era ainda incipiente no Brasil. Hoje, está imperando na universidade.

Ocorreu na Universidade de Brasília (UNB). Há pouco, um aluno negro foi reprovado e conseguiu rever sua nota numa campanha política onde até a Central Única dos Trabalhadores (CUT) se mobilizou para ajudá-lo. "Ele acusava um professor de ter dado nota baixa por racismo. Mas outros quatro estudantes foram reprovados no mesmo semestre. Ele era o único negro", relatou Carla Teixeira, professora de Antropologia. Bem entendido, os brancos reprovados não tiveram sindicatos que os defendessem.

O professor perdeu a autonomia de cátedra. Quem decide agora se um aluno deve ou não ser reprovado é a CUT. A UNB está se tornando uma ilha de racismo negro. Quarta-feira passada, o professor Paulo Kramer, do curso de Ciência Política, acusado de racismo, teve de prestar depoimento. Por ter usado a palavra crioulada, em uma discussão sobre ação afirmativa nos Estados Unidos.

Crioulada - ou crioléu - diz o Aurélio, é um bando de crioulos. Mais um pouco e os editores do Aurélio serão processados, por terem registrado tais expressões. Inclusive "bando de crioulos". A ditadura do politicamente correto está pretendendo proibir palavras criadas pelo povo, como o são todas as palavras. De minha parte, já nem falo em negrada. Tenho preferido afrodescendentada.

Mas o politicamente correto na UNB vai mais longe. Kramer andou dizendo que não há desenvolvimento nos países onde não cai neve. Verdade que o rigor climático é um determinante de desenvolvimento, só nos trópicos o homem pode ficar esperando que os frutos caiam dos galhos das árvores. Em países frios, é preciso trabalhar para tirar o alimento da terra. Mas isto tampouco é dogma, como nos provaram os marxistas. Eles conseguiram fazer de países com neve países subdesenvolvidos. Kramer foi acusado de "determinismo climático". Que Kramer esteja enganado, ao não considerar o marxismo como fator de subdesenvolvimento até mesmo em países frios, isto se entende. O que não se entende é a tipificação do novo crime, o determinismo climático.

Pelo que me consta, hoje, nos Estados Unidos, nenhum professor ousa reprovar um aluno negro. Ao que tudo indica, estamos chegando lá.

quarta-feira, outubro 11, 2006
 
O AMOR É LINDO!



Os jornais trouxeram um afetuoso e insólito aperto de mãos entre Delfim Netto, o odiado factotum da ditadura militar, e Luiz Inácio Lula da Silva, o sindicalista que sempre denunciou a política de primeiro fazer o bolo, para depois dividir. Se alguém acha que há alguma diferença entre a política econômica do atual presidente e a dos governos anteriores, ouçamos o Supremo Apedeuta: Delfim não se elegeu por "vingança de um conjunto de elitistas, porque ele defendia a nossa política". Segundo Lula, Delfim foi a "única voz" defendendo sua política econômica.

Antônio Delfim Netto, homem de confiança do regime militar, foi ministro da Fazenda nos governos Costa e Silva e Garrastazu Médici, ministro da Agricultura no governo Figueiredo e embaixador do Brasil na França durante o governo Geisel. Nestes dias de segundo turno, passou a ser objeto de desejo do PT. "Quero dizer da minha alegria de estar aqui com Delfim, uma das pessoas de quem a gente mais divergia na década de 70" - disse Lula. "Eu, como dirigente sindical, fazia todas as críticas numa época em que a gente tinha contradição no Brasil muito forte. Ao mesmo tempo tinha o auge do autoritarismo militar, tinha o auge do crescimento econômico. De vez em quando, discutindo com meus companheiros, eu dizia que havia contradição enorme a esquerda tentando a fazer a revolução e nós dentro da fábrica tendo oportunidade de emprego".

Lula apoiando 64? O amor é lindo!

terça-feira, outubro 10, 2006
 
SUPREMO APEDEUTA COMEÇA A ENTENDER PT



O Supremo Apedeuta, candidato à reeleição pelo PT, disse hoje à noite na zona norte de São Paulo que o país precisa se mobilizar para evitar a vitória de Geraldo Alckmin. Bom sinal. O arrogante Lula de poucos dias atrás, que afirmava que se a oposição quisesse segundo turno teria de esperar 2.010, já está sentindo que arrotou vitória antes do tempo. Ocorre que o país não tem razão alguma para evitar a vitória de Alckmin. Mais razões tem para jogar à famosa lata de lixo da História a quadrilha que tomou posse do governo.

Mas o melhor de seu discurso vem adiante. "Agora temos que ir para a rua organizar, em cada cidade, em cada bairro, colocar as bandeiras dos partidos, e a gente vai junto, para não permitir que o mal maior aconteça neste país". O candidato parece estar começando a chegar à idade da razão. Se a outra única alternativa que hoje resta é o PT, ele já admite que o PT é um mal.

Difícil definir o que é mais doloroso em Lula, se a impropriedade de expressão ou suas contradições. Ontem ainda ele dizia que Alckmin havia se comportado no debate como "um delegado de porta de cadeia". Ora, não existe delegado de porta de cadeia. Delegado está na delegacia. A expressão é usada para advogados. Advogado de porta de cadeia é aquele estagiário à procura de uma primeira causa ou um rábula em busca de uma causa medíocre. A grande imprensa não parece ter notado esta brutal derrapada de prosódia.

Ainda atordoado pelas pancadas que levou de seu opositor e em falta de melhor bandeira, apega-se agora à acusação de que o governo de Alckmin significaria "o retrocesso das privatizações e da subordinação ao mercado e ao FMI".

Vamos por partes. Privatização não é obra do demônio. Ninguém tem saudades dos dias em que a telefonia nacional era reservada ao Estado, quando um telefone era sinal de status e custava de quatro a dez mil dólares. O leitor de mais idade deve lembrar-se de uma prática abominável que era tida como perfeitamente normal, a Bolsa de Telefones. Semanalmente, junto às cotações da bolsa, o Jornal da Tarde, de São Paulo, dava a cotação dos telefones, que variava de bairro a bairro. Telefone era investimento. Quem tinha pistolão junto ao Estado comprava uma centena deles e podia deitar-se de pernas para o ar, alugando ou revendendo os aparelhos. Essa corrupção a céu aberto só teve fim com a privatização da telefonia. Não me parece que o povão, essa pobre gente que vive de salário mínimo ou pouco mais que isso, veja com desagrado a privatização de uma Petrobras, por exemplo. Claro que os apaniguados da Petrobras não gostariam disso, sem falar que a Presidência da República perderia uma importante moeda de troca. Lula, militante de boa estirpe socialista, teme a privatização. Quanto menor o Estado, menos resta para roubar.

"Subordinação ao mercado e ao FMI". Essa é ótima! Temos hoje os juros mais altos do mundo e Lula vê no opositor uma possibilidade de subordinação ao mercado. Pagou ao FMI o que o FMI jamais sonhou cobrar. Que me conste, o único maluco a fazer isso na História foi Nicolai Ceaucescu, às custas da miséria da Romênia.

Bom militante do PT, Lula atribui ódio a quem quer que seja que tece uma crítica: "Poucas vezes vi na vida grosseria, tratamento impiedoso e ódio estampado na cara de adversários como vi no PSDB no debate", disse. Ódio, este é sempre o primeiro argumento que os petistas empunham quando alguém lhes dirige uma crítica. Está sempre na ponta da língua de qualquer petista: "Janer, por que tanto ódio?" Esta objeção, eu a ouço há mais de duas décadas.

O homem parece ter ficado sem norte após o debate de domingo. Qual mosca tonta, já nem sabe para que lado vai. Mas está melhorando. O PT já é um mal. Menor, mas mal. Longa é a jornada de um bruto até o entendimento.

segunda-feira, outubro 09, 2006
 
NÃO MINTA, PRESIDENTE!




Sexta-feira passada, eu escrevia neste blog:

Leio no noticiário que o presidente do PT, Ricardo Berzoini, anunciou nesta sexta-feira seu afastamento da presidência do partido. O anúncio foi feito por ele, assim que terminou a reunião da Executiva Nacional do PT. O motivo da renúncia, obviamente, foi a affaire do dossiê. Ué? Mas o caso do dossiê não era coisa do PT paulista, como afirmava Tarso Genro, o Explicador-Geral da República? A cada vez que os petistas tentam explicar o inexplicável, enredam-se cada vez mais. A grande pergunta é de onde surgiu o 1,7 milhão apreendido e destinado à paga do dossiê. Até o Supremo Apedeuta diz querer ver o caso esclarecido. Diz querer ver. Pois se quisesse realmente saber, bastaria uma atitude singela: perguntar aos petistas envolvidos de onde surgiu tanta grana. Domingo, temos debate entre Lula e Alckmin. Fosse eu Alckmin, esta seria a primeira questão que proporia a Lula. Se não propuser, terá sido por covardia ante o poder.

Geraldo Alckmin não se acovardou. Propôs a pergunta e a propôs em primeiro lugar. Daí para frente, foi uma pancadaria só, que mal dava ao adversário tempo de respirar. O chamado Picolé de Chuchu, sempre com ar de aluno primeiro da classe, revelou-se um pugilista contundente e implacável. E foi desfilando diante de um Lula atônito, semiparalisado pelo estupor, todo o rol de patranhas do PT, mensalão, valerioduto, envolvimento do banco BMG. Verdade que faltaram muitas: o assassinato de Celso Daniel, do Toninho do PT, o favorecimento do Primeiro-Filho com 15 milhões de reais da Telemar e por aí vai.

Golpeado e sempre se atrapalhando com as palavras, Lula respondeu que quer saber, mais do que ninguém, "quem arquitetou esse plano maquiavélico", quer saber o conteúdo do dossiê e a origem do dinheiro. Ora, por maquiavélico se entende algo bem arquitetado, e não o desastre montado por três ou quatro patetas. Lula está escandalizado porque o "plano maquiavélico" falhou. Não falhasse, estaria gozando os frutos da tramóia. Quanto ao conteúdo, está amplamente divulgado na Internet. Quanto à origem do dinheiro, que é o que agora realmente importa, nada impede que o presidente pergunte a seu banqueiro-churrasqueiro: "cá entre nós, companheiro, a picanha está no ponto. Mas de onde veio mesmo aquela grana toda?"

Tentando defender-se canhestramente, Lula disse não ser policial, mas presidente da República e garantiu que a Polícia Federal irá descobrir a origem do dinheiro. "Uma investigação séria é demorada", concluiu. Ora, poderia ter recorrido aos préstimos de seu ex-ministro Antonio Palocci, que em 24 horas descobriu a colossal fortuna amealhada por um humilde caseiro nordestino. 25 mil reais se descobre na hora. 1,75 milhão, com um pacote de dólares no meio, é bem mais demorado.

"Não minta, Lula!" - disse Alckmin. Estou entrando nos 60 anos e pela primeira vez em minha vida tive o prazer de ver um opositor dizer isso a um presidente da República. Lula mentiu desde sempre, desde os dias de sindicalista até hoje. Mentiu quando vociferava contra o FMI. Hoje paga até mesmo o que nem é cobrado. Mentiu quando vociferava contras as medidas provisórias e hoje tornou-se campeão na emissão de medidas provisórias. Mentiu quando dizia defender o funcionalismo público. Mal subiu ao poder, enfiou a mão no bolso dos aposentados. Mentiu desde sempre porque está envolto em uma mentira maior, o Partido dos Trabalhadores, onde trabalhadores mesmo é o que mais falta. O PT é um partido organizado por intelectuais saudosos do bolchevismo. Precisavam de um operário como ícone e apanharam o que estava mais à mão, o mais dócil, o mais manipulável. Ocorre que o operário mais à mão estava cansado de ser operário e quando foi eleito já vivia por duas décadas escorado no mecenato de um empresário. O PT pretende que um operário chegou ao poder em 2003. Nada disso. Chegou ao poder um desocupado.

Em entrevistas televisivas, sempre vi os jornalistas engolindo as mentiras esfarrapadas de Lula, como se algum código deontológico determinasse que um jornalista tem de aceitar passivamente as potocas que um entrevistado lhe conta. Pela primeira vez em minha vida, tive a chance de ver e ouvir de um candidato aquilo que há muito deveria ter sido dito: "Não minta, Lula!" Lula recebeu a reprimenda como um menino envergonhado de suas artes. O problema é que não são artes, mas crimes.

Recorrendo a suas metáforas toscas, disse o Supremo Apedeuta: "Nem um presidente, nem um pai de família tem como saber de tudo. Quantas vezes, você está na cozinha, acontece algo na sala, e você não fica sabendo". Sem falar que um pai de família precisa ser ceguinho de carteira para não saber o que acontece na sala, não se pode admitir que um presidente da República, que dispõe de serviços de informação muito bem equipados, não saiba o que acontece em seu partido ou nas salas contíguas à sua.

"Se os companheiros erraram, têm de pagar", disse o Supremo. Sempre evitando cuidadosamente a palavra crime. Como fazia Josiph Vissarionovitch Djugatchivili após seus massacres. "Nós erramos", dizia Stalin. Um erro se corrige com uma admoestação, um pedido de desculpas. Crime é mais grave. Os petistas têm cometido crimes em sua tentativa desesperada de manutenção do poder e contam com um capo complacente, sempre o primeiro a definir crimes como erros.

O PT está intuindo as futuras conseqüências de seus crimes. No dia 02 deste mês, antes mesmo do debate, um dos cães de guarda do regime, Ciro Gomes, ameaçava com guerra civil: "Se a população brasileira mais pobre sentir que, mesmo por dentro das instituições, uma prática golpista tirou a possibilidade de Lula se eleger, eu temo realmente pelo dia seguinte que o Brasil vai viver". Ou seja, a oposição pode disputar uma eleição. Desde que não a ganhe. Se ganhar, é golpe. Os aprendizes de tirano aprendem rápido suas lições de casa e pensam mais longe que o próprio chefe.

Nesta segunda-feira, na Folha de São Paulo, Ciro volta a dizer que teme pelo que pode ocorrer caso Lula perca estas eleições devido às acusações de corrupção. "Imagine se esse povão achar que tomaram a eleição do Lula por manipulação de um escândalo pela televisão?" Ocorre que o escândalo não foi produzido por nenhum opositor e sim pelo próprio PT. Desconfortáveis com a idéia de ter dado um tiro - um canhonaço, eu diria - no próprio pé, os áulicos de Brasília pretendem que tenha sido a oposição quem puxou o gatilho. O PT está cheio de cadáveres no armário e não encontra um jeitinho plausível de trazê-los à luz do dia.

O debate de domingo deu novo alento ao eleitorado que está farto de um governo atolado até o pescoço em corrupção e que pode ser reeleito graças à corrupção miúda que promove entre os mais pobres. Fosse eu Alckmin, no próximo debate começaria com uma primeira pergunta: como é que é, presidente, ainda não conseguiu descobrir a origem daquele 1,7 milhão?

Somos todos ouvidos.

domingo, outubro 08, 2006
 
MI TAPERA


Elias Regules



Entre los pastos tirada
como una prenda perdida
y en el silencio escondida
como caricia robada,
completamente rodeada
por el cardo y la flechilla
que como larga golilla
van bajando a la ladera
está una triste tapera
descansando en la cuchilla.

Alli, en ese suelo fué
donde mi rancho se alzaba,
donde contento jugaba,
donde a vivir empecé,
donde cantando ensillé
mil veces al pingo mio,
en esas horas de frío
en que la mañana llora,
cuando se moja la aurora
con el vapor del rocío.

Donde mi vida pasaba
entre goces verdaderos,
donde en los años primeros
satisfecho retozaba,
donde el ombú conversaba
con la calandria cantora,
donde noche sedutora
cuidó el sueño de mi cuna,
con un beso de la luna
sobre el techo de totora.

Donde resurgen valientes,
mezcladas con los terrones,
las rosadas ilusiones
de mis horas inocentes,
donde delirios sonrientes
brotar a millares ví,
donde palpitar sentí,
llenas de afecto profundo,
cosas chicas para el mundo
pero grandes para mí.

Donde el aire perfumado
está de risas escrito,
y donde en cada pastito
hay un recuerdo clavado:
tapera que mi pasado
con colores de amapola
entusiasmada enarbola,
y que siempre que la miro
dejo sobre ella un suspiro
para que no esté tan sola.

sexta-feira, outubro 06, 2006
 
PERGUNTA AOS CARAS, PÔ!


Leio no noticiário que o presidente do PT, Ricardo Berzoini, anunciou nesta sexta-feira seu afastamento da presidência do partido. O anúncio foi feito por ele, assim que terminou a reunião da Executiva Nacional do PT. O motivo da renúncia, obviamente, foi a affaire do dossiê.

Ué? Mas o caso do dossiê não era coisa do PT paulista, como afirmava Tarso Genro, o Explicador-Geral da República? A cada vez que os petistas tentam explicar o inexplicável, enredam-se cada vez mais.

A grande pergunta é de onde surgiu o 1,7 milhão apreendido e destinado à paga do dossiê. Até o Supremo Apedeuta diz querer ver o caso esclarecido. Diz querer ver. Pois se quisesse realmente saber, bastaria uma atitude singela: perguntar aos petistas envolvidos de onde surgiu tanta grana.

Domingo, temos debate entre Lula e Alckmin. Fosse eu Alckmin, esta seria a primeira questão que proporia a Lula. Se não propuser, terá sido por covardia ante o poder.

quinta-feira, outubro 05, 2006
 
EU, HOMEM SEM PECADOS, ME CONFESSO



Alguns leitores ficaram chocados com minhas críticas recentes a Sua Santidade, por seu pedido de misericórdia a Deus pelas vítimas do Boeing da Gol. Não poucos me perguntam porque odeio tanto o papa. Ora, não odeio ninguém. Estes leitores devem estar contaminados pelo petismo. Esta pergunta é típica de petista. Mal tecemos uma crítica ao PT, lá vem a objeção: mas por que tanto ódio ao PT? Ora, se crítica fosse sinônimo de ódio, a humanidade toda só avançaria odiando. Não penso assim. Com ódio só se chega ao retrocesso, a ditaduras, torturas, matanças colossais. Foi o que fizeram os marxistas no século passado, ao insuflar o ódio entre as classes como estratégia de conquista do poder. China, 65 milhões de cadáveres. URSS, 20 milhões. Coréia do Norte e Camboja, dois milhões cada. Vietnã, um milhão. Europa do Leste, mais outro milhão.

Por outro lado, em duas crônicas recentes, a respeito do pronunciamento de Bento XVI sobre o Islã, tomei a defesa de Sua Santidade. Não posso admitir que cabeças-de-toalha fanáticos determinem o que se pode ou não se pode dizer no Ocidente. Sem falar que o papa enunciava uma verdade histórica, encontrável em qualquer livro de história ou enciclopédia. Mas não posso defender um homem que, do alto de sua curul cardinalícia, acoberta os crimes de seus sacerdotes.

Há também quem ache que desejo a extinção da Igreja Católica. Nada disso. Aceito todas as religiões. Enfim, quase todas: não posso aceitar essas que usam lavagem cerebral para conquistar adeptos. Aceito todos os pensamentos diferentes. Exceto aqueles que querem proibir todo pensamento diferente. Um mundo em que todos pensassem igual seria algo monótono e sem graça. Mesmo aceitando a idéia de religiões, me sinto com pleno direito para criticá-las. A Idade Média já vai longe. Nenhuma igreja, nenhum pontífice habita hoje um topos uranos, fora do alcance de qualquer crítica.

Diz um leitor: "algumas, talvez muitas vítimas, pediram, suplicaram naqueles poucos segundos de queda livre no ar pelo perdão dos seus pecados". Isso é coisa que ninguém pede ante uma morte súbita. Nesse instante, o que passa pela mente é uma visão rápida da vida toda, uma sensação de pânico e nada mais. Misericórdia pediria quem, acreditando em Deus e temendo a justiça divina, se sentisse o último dos pecadores - se é que tivesse tempo para tanto. Ora, para pecar é preciso crer na noção de pecado. Só religiosos pecam. Quem não crê, não peca. Eu, por exemplo, sou um homem sem pecado algum.

Pedir misericórdia ao deus católico significa crer nesse deus. Como pode Bento XVI pressupor que as pessoas que estavam naquele vôo eram todas católicas e viviam em pecado? Eu me sentiria insultado se um papa qualquer pedisse misericórdia por minha alma. Para começar, nem em alma acredito. Muito menos em imortalidade da dita ou em justiças do Além. No dia em que estiver partindo, não pedirei misericórdia a potestade alguma. Mas se um sacerdote me oferecesse uma generosa taça de sangue de boa safra, de preferência sub specie carmenère ou malbec da Cordilheira, de bom grado aceitaria o sangue divino.

"A fé católica não lhe é indiferente" - diz o leitor. Sim, não me é indiferente. Pois vivo imerso nela. Vivesse na Grécia antiga, provavelmente estaria xingando todos os deuses da Pólis. Vivesse em mundo muçulmano, eu xingaria Alá e os aiatolás. Claro que xingaria uma vez só, pois na segunda já estaria morto. O que condeno na Igreja não é sua fé. Que creiam no que quiserem e boa sorte a todos. O que condeno é essa mania teocrática dos católicos de pretender influir em Estados laicos, em questões como homossexualismo, aborto, matrimônio. Não vivemos em universo muçulmano. No Ocidente a cisão entre Estado e Igreja ocorreu há séculos e o Vaticano parece ainda não ter percebido isto.

Bento XVI, homem crente e temeroso a Deus, é quem devia pedir misericórdia por ter acobertado crimes de pedofilia. Uma coisa é um homem, em um momento de desvario, cometer um crime. Outra, e bem mais grave, é um homem acobertar friamente, sentado em uma escrivaninha, os crimes de milhares de outros homens. Em um texto soberbo, intitulado Ni victimes ni bourreaux, Camus recusava a violência confortável que provém de intelectuais cujas palavras vão mais longe que os atos. A absolvição tácita de Bento XVI a milhares de padres criminosos é bem mais grave que o crime cometido por cada um.

Vou mais longe: devia não apenas pedir misericórdia ao deus que cultua, como também deveria responder criminalmente por seus atos. Acobertar crimes é também um crime. Não será por sentar na cadeira de Pedro que um homem pode permanecer impune ante a lei penal.

quarta-feira, outubro 04, 2006
 
DR. STRANGELOVE E O SEGUNDO TURNO


Heloísa Helena, um dos últimos estertores do velho bolchevismo, dizia há pouco que no PSOL não há centralismo democrático. Ontem, central e democraticamente, declarou aos jornais que todo militante de seu partido está proibido, nada menos que isso, de declarar voto, seja em quem for.

Falei hoje com uma amiga, petista enrustida, que acabou votando na gralha do agreste, talvez envergonhada de depositar seu voto no PT ou em Lula. Em segundo turno, vai votar em quem? Em Lula, é claro!

Os petistas sempre me lembram o Dr. Strangelove, do filme homônimo de Kubrick. Quem o viu deve lembrar dos reflexos condicionados do braço esquerdo do cientista semiparalítico, que mal seu dono se descuidava, se erguia na saudação nazista. Strangelove tinha de contê-lo com a mão direita. Petista é assim mesmo. Abandona o PT envergonhado, mas ficam os reflexos. "Democracia é assim, não é?" - explicava-se minha amiga. "Vota-se em um ou outro partido".

Até pode ser. Mas não me consta que faça parte da doutrina democrática votar em uma quadrilha de ladrões.

terça-feira, outubro 03, 2006
 
QUEM PEDIU MISERICÓRDIA?



Em mensagem encaminhada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, o papa Bento XVI invocou "a misericórdia divina sobre os passageiros e tripulantes envolvidos na tragédia".

Alguém por aí pediu misericórdia? Alguém estava precisando de misericórdia? Quem ou o quê autoriza Sua Santidade a presumir que passageiros e tripulantes do Boeing da Gol eram pecadores que necessitavam da misericórdia divina?

Misericórdia estarão necessitando os padres pedófilos que o então cardeal Joseph Ratzinger acobertou durante seu cardinalato. A denúncia foi feita em documentário da BBC, "Sexo, Crimes e o Vaticano", produzido pela TV aberta britânica. A reportagem exibe um documento secreto interno da Igreja, intitulado Crimen Solliciatonis (Crime da Solicitação), segundo o qual os bispos são instruídos a impor um juramento, no qual a vítima, o acusado e eventuais testemunhas se comprometem a manter sigilio absoluto sobre o caso. A quebra do juramento levaria à excomunhão.

Antes de ser eleito papa, Ratzinger era o encarregado de zelar pela obediência aos termos deste documento. A reportagem, conduzida por Colm O'Gorman, que foi estuprado por um padre católico aos 14 anos, apresenta material colhido nos Estados Unidos, Brasil e em Roma.

Sua Santidade está mais enrascada que Lula no caso do dossiê. Sete papas já sofreram impeachment. Um deles, coincidentemente, chamava-se Bento. Era o IX. Eleito em 1032, foi deposto em 1044. Retomou sua curul em 1045. Usando um expediente muito usual no nosso Congresso, abdicou no mesmo ano, para depois voltar em 1047. Foi deposto definitivamente em 1048.

Se alguém está precisando de misericórdia, certamente não são as vítimas do vôo 1907.

segunda-feira, outubro 02, 2006
 
LONGA VIDA AO PT!



"Um novo ciclo de uma ofensiva terrorista midiática de um monopólio brutal da direita terminou mudando alguns votos que levariam Lula a ganhar no primeiro turno" - disse hoje o sociólogo marxista Emir Sader, em Havana. "Com isso, a direita tenta impor um clima de mudança de opinião para tentar consolidar seus votos e avançar sobre o voto de Lula, expressamente a classe média do centro-sul do país, onde terminou ganhando alguns pontos".

A esquizofrenia parece ter tomado de assalto o cérebro dos apparatchiks petistas. Para começar, pessoa alguma em pleno gozo de suas faculdades mentais poderá afirmar que os fatos que levaram ao segundo turno foram produzidos por uma hipotética direita. A menos que Sader entenda como direita o PT. Todos os escândalos da era petista foram protagonizados por petistas ou aliados. Todos. Sem nenhuma exceção. Desde o caso de extorsão do Waldomiro até a recente história do dossiê. Passando por mensalão, dólar na cueca, quebra de sigilo do Francenildo, e por aí vai. A oposição nunca produziu um só fato que servisse como base de acusação ao PT. Nenhum. Nada.

Só o PT consegue destruir o PT. Longa vida ao PT.

 
O ARTIGO DE ROBERT REDEKER




Comentei rapidamente outro dia um artigo de Robert Redeker, um professor de filosofia do ensino médio no interior da França, publicado no Le Figaro. No artigo, intitulado "O que o mundo livre deve fazer diante da intimidação islâmica?", o professor dizia que o Alcorão é um livro de incrível violência e defendeu o papa Bento XVI por seu discurso com comentários sobre o Islã, há duas semanas. O jornal foi proibido no Egito e Redeker está escondido em algum lugar na França. Voilà l'article:

Comme jadis avec le communisme, l'Occident se retrouve sous surveillance idéologique. L'islam se présente, à l'image du défunt communisme, comme une alternative au monde occidental. À l'instar du communisme d'autrefois, l'islam, pour conquérir les esprits, joue sur une corde sensible. Il se targue d'une légitimité qui trouble la conscience occidentale, attentive à autrui: être la voix des pauvres de la planète. Hier, la voix des pauvres prétendait venir de Moscou, aujourd'hui elle viendrait de La Mecque! Aujourd'hui à nouveau, des intellectuels incarnent cet oeil du Coran, comme ils incarnaient l'oeil de Moscou hier. Ils excommunient pour islamophobie, comme hier pour anticommunisme.

Dans l'ouverture à autrui, propre à l'Occident, se manifeste une sécularisation du christianisme, dont le fond se résume ainsi: l'autre doit toujours passer avant moi. L'Occidental, héritier du christianisme, est l'être qui met son âme à découvert. Il prend le risque de passer pour faible. À l'identique de feu le communisme, l'islam tient la générosité, l'ouverture d'esprit, la tolérance, la douceur, la liberté de la femme et des moeurs, les valeurs démocratiques, pour des marques de décadence.

Ce sont des faiblesses qu'il veut exploiter au moyen "d'idiots utiles", les bonnes consciences imbues de bons sentiments, afin d'imposer l'ordre coranique au monde occidental lui-même.

Le Coran est un livre d'inouïe violence. Maxime Rodinson énonce, dans l'Encyclopédia Universalis, quelques vérités aussi importantes que taboues en France. D'une part, "Muhammad révéla à Médine des qualités insoupçonnées de dirigeant politique et de chef militaire (...) Il recourut à la guerre privée, institution courante en Arabie (...) Muhammad envoya bientôt des petits groupes de ses partisans attaquer les caravanes mekkoises, punissant ainsi ses incrédules compatriotes et du même coup acquérant un riche butin".

D'autre part, "Muhammad profita de ce succès pour éliminer de Médine, en la faisant massacrer, la dernière tribu juive qui y restait, les Qurayza, qu'il accusait d'un comportement suspect". Enfin, "après la mort de Khadidja, il épousa une veuve, bonne ménagère, Sawda, et aussi la petite Aisha, qui avait à peine une dizaine d'années. Ses penchants érotiques, longtemps contenus, devaient lui faire contracter concurremment une dizaine de mariages".

Exaltation de la violence: chef de guerre impitoyable, pillard, massacreur de juifs et polygame, tel se révèle Mahomet à travers le Coran.

De fait, l'Église catholique n'est pas exempte de reproches. Son histoire est jonchée de pages noires, sur lesquelles elle a fait repentance. L'Inquisition, la chasse aux sorcières, l'exécution des philosophes Bruno et Vanini, ces mal-pensants épicuriens, celle, en plein XVIIIe siècle, du chevalier de La Barre pour impiété, ne plaident pas en sa faveur. Mais ce qui différencie le christianisme de l'islam apparaît: il est toujours possible de retourner les valeurs évangéliques, la douce personne de Jésus contre les dérives de l'Église.

Aucune des fautes de l'Église ne plonge ses racines dans l'Évangile. Jésus est non-violent. Le retour à Jésus est un recours contre les excès de l'institution ecclésiale. Le recours à Mahomet, au contraire, renforce la haine et la violence. Jésus est un maître d'amour, Mahomet un maître de haine.

La lapidation de Satan, chaque année à La Mecque, n'est pas qu'un phénomène superstitieux. Elle ne met pas seulement en scène une foule hystérisée flirtant avec la barbarie. Sa portée est anthropologique. Voilà en effet un rite, auquel chaque musulman est invité à se soumettre, inscrivant la violence comme un devoir sacré au coeur du croyant.

Cette lapidation, s'accompagnant annuellement de la mort par piétinement de quelques fidèles, parfois de plusieurs centaines, est un rituel qui couve la violence archaïque.

Au lieu d'éliminer cette violence archaïque, à l'imitation du judaïsme et du christianisme, en la neutralisant (le judaïsme commence par le refus du sacrifice humain, c'est-à-dire l'entrée dans la civilisation, le christianisme transforme le sacrifice en eucharistie), l'islam lui confectionne un nid, où elle croîtra au chaud. Quand le judaïsme et le christianisme sont des religions dont les rites conjurent la violence, la délégitiment, l'islam est une religion qui, dans son texte sacré même, autant que dans certains de ses rites banals, exalte violence et haine.

Haine et violence habitent le livre dans lequel tout musulman est éduqué, le Coran. Comme aux temps de la guerre froide, violence et intimidation sont les voies utilisées par une idéologie à vocation hégémonique, l'islam, pour poser sa chape de plomb sur le monde. Benoît XVI en souffre la cruelle expérience. Comme en ces temps-là, il faut appeler l'Occident "le monde libre" par rapport au monde musulman, et comme en ces temps-là les adversaires de ce "monde libre", fonctionnaires zélés de l'oeil du Coran, pullulent en son sein.

Les réactions suscitées par l'analyse de Benoît XVI sur l'islam et la violence s'inscrivent dans la tentative menée par cet islam d'étouffer ce que l'Occident a de plus précieux qui n'existe dans aucun pays musulman: la liberté de penser et de s'exprimer.

L'islam essaie d'imposer à l'Europe ses règles: ouverture des piscines à certaines heures exclusivement aux femmes, interdiction de caricaturer cette religion, exigence d'un traitement diététique particulier des enfants musulmans dans les cantines, combat pour le port du voile à l'école, accusation d'islamophobie contre les esprits libres.

Comment expliquer l'interdiction du string à Paris-Plages, cet été? Étrange fut l'argument avancé: risque de "troubles à l'ordre public". Cela signifiait-il que des bandes de jeunes frustrés risquaient de devenir violents à l'affichage de la beauté? Ou bien craignait-on des manifestations islamistes, via des brigades de la vertu, aux abords de Paris-Plages?

Pourtant, la non-interdiction du port du voile dans la rue est, du fait de la réprobation que ce soutien à l'oppression contre les femmes suscite, plus propre à "troubler l'ordre public" que le string. Il n'est pas déplacé de penser que cette interdiction traduit une islamisation des esprits en France, une soumission plus ou moins consciente aux diktats de l'islam. Ou, à tout le moins, qu'elle résulte de l'insidieuse pression musulmane sur les esprits. Islamisation des esprits: ceux-là même qui s'élevaient contre l'inauguration d'un Parvis Jean-Paul-II à Paris ne s'opposent pas à la construction de mosquées. L'islam tente d'obliger l'Europe à se plier à sa vision de l'homme.