¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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quarta-feira, janeiro 28, 2009
 
LEITOR PROTESTA CONTRA MEUS
MOMENTOS SUBLIMES DA BÍBLIA



Ao contrário da Lia, que diz adorar ler os “momentos sublimes da Bíblia”, Há quem pareça não estar gostando muito. “Porque você não publica os ensinamentos de Cristo nos teus "momentos sublimes da Bíblia"? O sermão da montanha e as coisas que ele ensinou durante sua vida?” – pergunta Rodrigo. O que lembra minha falecida mãe, preocupada com a segurança da cria, naqueles idos de 64: “Por que não escreves sobre flores, meu filho? Há tantas no Brasil”.

Ora, meu caro, o sermão da montanha é muito batido. Todo mundo o conhece e os padres seguidamente o repetem em suas homilias. Ao Novo Testamento, eu prefiro o Antigo. Ali se sente melhor Jeová e seu poder. Nele existem centenas de histórias do Povo Eleito, os poderes e os desmandos dos reis de então, o relato dos patriarcas, o erotismo da Sulamita e a sabedoria milenar do Kohelet. (Aliás, estes são os meus dois livros prediletos. Poemas transgressores, custo a entender como tenham sido incluídos no cânone bíblico. Canta Sulamita:

O meu amado meteu a sua mão pela fresta da porta, e o meu coração estremeceu por amor dele. Eu me levantei para abrir ao meu amado; e as minhas mãos destilavam mirra, e os meus dedos gotejavam mirra sobre as aldravas da fechadura. Eu abri ao meu amado, mas ele já se tinha retirado e ido embora. A minha alma tinha desfalecido quando ele falara. Busquei-o, mas não o pude encontrar; chamei-o, porém ele não me respondeu.

Encontraram-me os guardas que rondavam pela cidade; espancaram-me, feriram-me; tiraram-me o manto os guardas dos muros. Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, se encontrardes o meu amado, que lhe digais que estou enferma de amor.


Enferma de amor! A expressão é soberba. E é bom lembrar que se a enferma Sulamita andava em busca de seu amado pelas ruas de Jerusalém, não era para casar, não!

Ou a sabedoria do Kohelet:

Vaidade de vaidades, diz o pregador; vaidade de vaidades, tudo é vaidade.
Que proveito tem o homem, de todo o seu trabalho, com que se afadiga debaixo do sol? Uma geração vai-se, e outra geração vem, mas a terra permanece para sempre.
O sol nasce, e o sol se põe, e corre de volta ao seu lugar donde nasce.
O vento vai para o sul, e faz o seu giro vai para o norte; volve-se e revolve-se na sua carreira, e retoma os seus circuitos.
Todos os ribeiros vão para o mar, e contudo o mar não se enche; ao lugar para onde os rios correm, para ali continuam a correr.
Todas as coisas estão cheias de cansaço; ninguém o pode exprimir: os olhos não se fartam de ver, nem os ouvidos se enchem de ouvir.
O que tem sido, isso é o que há de ser; e o que se tem feito, isso se tornará a fazer; nada há que seja novo debaixo do sol.


Sabedoria sofrida de um rei-filósofo, que reinou sobre Israel. Por outro lado, para edificação dos crentes, prefiro aqueles trechos mais ignorados da Bíblia. Aqueles momentos em que o bom Jeová mata e manda matar, massacra e manda massacrar homens, velhos, mulheres e crianças. Ou será a Bíblia uma espécie de canal de televisão, onde o leitor se detém sobre o que faz bem à sua pobre alminha e zapeia rápido sobre o que não lhe apraz? Não é assim que vejo o Livro. Penso que deve ser lido e relido em sua totalidade.

Em todo caso, para alegria do Rodrigo, qualquer hora comentarei as coisas que o Cristo ensinou durante sua vida. Talvez comente aquele trechinho em que ele chamou uma cananéia de cadela.