¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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domingo, maio 31, 2009
 
DE COMO PERDI UMA
CAIXA DE CERVEJAS



A vida é uma sucessão de perdas e ganhos. EsTes são mais freqüentes no início da caminhada, afinal para um jovem tudo que vem pela frente é lucro. Com o tempo os ganhos vão mermando e as perdas dão o ar da graça. Principalmente de amigos. A propósito, até hoje não consegui definir qual o tempo necessário de convívio para que um conhecido se transforme em amigo. Houve época em que imaginei serem dez anos o suficiente. Pelo menos até o dia em que perdi um amigo de infância, relação de mais de quatro décadas. Ele doutourou-se pela USP e passou a ignorar os antigos companheiros de copo e de mesa. Nem mesmo meu doutorado em Paris salvou-me do ostracismo.

Às vezes, a gente perde cervejas.

Eu o conheci quando lecionava na Pós-Graduação em Letras, na UFSC. Foi amor à primeira vista. Já na primeira aula, fomos para a Lagoa da Conceição e terminamos a noite bebendo. De um temperamento esfuziante, sua alegria contaminava quem estivesse a seu lado e mesmo as mesas vizinhas. Tento uma definição: era pessoa que, se estivesse com câncer ou Aids, faria piada da própria doença e levaria todos seus interlocutores a rir com ele... dele mesmo.

Como aluno, foi daqueles que todo professor quer ter. Um professor não consegue fechar uma boa aula sem bons interlocutores e ele foi dos melhores. Já tinha alguns livros publicados quando chegou à Pós-Grad e era leitor dos bons. Só havia uma sombra em nossa relação, eu não conseguia gostar de sua literatura. Li todos os seus livros já publicados na época – e os tenho até hoje em minha biblioteca, com afetuosas dedicatórias –, mas não conseguia encontrar nada em nenhum deles. Tinha apreço pela pessoa, não pelo que escrevia. Como nunca me ocorreu que meus amigos tivessem de gostar do que escrevo, não via nisto problema algum.

Certa vez, fizemos uma aposta. “Em tantos anos (já não lembro quantos) – disse-me –, vou ficar rico com minha literatura”. Duvidei. Disse que para enriquecer com literatura, no Brasil, é preciso satisfazer os baixos instintos do grande público. Ou participar da máfia do livro paradidático. Paulos Coelhos da vida à parte, nenhum escritor faz sucesso no Brasil se não tiver amigos no poder, que impinjam seus livros ao sistema de ensino. Além do mais, ele não vivia no eixo Rio-São Paulo, onde os editores decidem quem vai ser ou não ser best-seller. Apostamos uma caixa de cerveja.

A vida nos separou, como se diz. Fui para Madri, ele voltou para sua cidade. Vim depois para São Paulo, onde nos encontramos algumas vezes. Ele doutorou-se pela USP e continuou lecionando e escrevendo. Quando eu trabalhava na Folha de São Paulo, enviou-me seu último romance. Sem que nada me pedisse, me senti tentado à divulgá-lo, afinal era o trabalho de um bom amigo. Passei o livro ao editor do caderno +MAIS!

- Olha, este livro acaba de ser lançado por um amigo meu, ele vive isolado lá no Sul, podes dar uma colher de chá?
O editor me ofereceu então o cálice do qual eu não esperava beber:
- Ele é seu amigo? Então você mesmo escreve.

Maldita boca esta minha, disse eu a mim mesmo. Durante dias e noites, olhei o livro por todos os ângulos, queria encontrar nele algo valioso, que sustentasse uma recomendação aos leitores. Não encontrei nada. Falo então do autor, pensei. Não era o caso, a resenha teria de ser sobre o livro. Voltei ao editor. Me desculpa, mas não consigo escrever a resenha. O livro não é bom? Então deixa pra lá.

Eu estava entre a cruz e a espada. Dado meu apreço ao autor, não conseguia queimar o livro. Elogiá-lo, muito menos. Seria vender gato por lebre para meus leitores. E meus leitores sempre me cobram. Me senti então na obrigação de comunicar o acontecido a meu amigo. Vivíamos ainda na época pré-internética, escrevi uma carta. Era nossa forma de comunicação. Resumo da ópera: ele nunca mais me escreveu.

Respeitei seu silêncio e também permaneci silente. Meus amigos sempre foram escassos. Se for contá-los nos dedos, sobram dedos. Naquele dia, sobrou mais um. Me lembrei da ruptura entre Sartre e Camus. Para Sartre, amizade não admitia discordâncias. "L'amitié, elle aussi, tend à devenir totalitaire; il faut l'accord en tout ou la brouille, et les sans-parti eux-mêmes se comportent en militants de partis imaginaires".

Paciência, que se vai fazer? Ele continuou insistindo em sua literatura. Ano passado, recebeu nada menos que cinco prêmios literários. O que, para mim, tornou-o altamente suspeito. Ora, ninguém recebe cinco prêmios literários num ano só por méritos literários. Fosse como fosse, achei que ele deveria estar muito feliz e me senti contente com isso.

Leio agora que um de seus livros foi recolhido pela Secretária de Educação de Santa Catarina, da rede de ensino médio, por seu conteúdo erótico. A Folha transcreve o que os donos da cultura catarinense consideram erótico: dois ou três palavrões e uma chupada. Nada que seja estranho a um adolescente. Mas o ensino oficial é isso mesmo. Sempre considera que alunos são castas almas sem sexualidade alguma. Intimamente, me solidarizei com meu ex-companheiro de botecos.

Mas havia algo mais na notícia. De acordo com nota oficial da pasta, o recolhimento foi determinado após dois professores lerem o livro antes da utilização em sala e comunicarem aos superiores. Foram recolhidos nas escolas 130 mil exemplares da obra.
Ou seja, o homem havia feito contato a máfia e passara a participar da confraria dos autores compulsórios.

Interrogado sobre o recolhimento de seus livros, disse: "Eu soube da interdição e fiquei horrorizado com isso". Curiosamente, não se horroriza com o fato de ter 130 mil exemplares de sua obra empurrados goela abaixo de 130 mil alunos.

Tinha razão. Vai ficar rico, se já não é. A vida são perdas e ganhos, dizia. Vejo que perdi uma caixa de cervejas.

sábado, maio 30, 2009
 
DITADOR VENEZUELANO
DESAUTORIZA FANZOCA



Vai mal o jornalismo nacional. Especialmente a Folha de São Paulo. Ainda há pouco, jornalistas experientes como Clóvis Rossi, Elaine Cantanhêde, Barbara Gancia, caíram como patinhos no conto da brasileira atacada por neonazis na Suíça. Em verdade, sobrou até para o Itamaraty e a Presidência da República. O intrépido ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, chegou a pedir ao governo da Suíça transparência nas investigações e rigor na punição dos agressores. O Supremo Apedeuta foi duro: “O que nós queremos é que eles respeitem os brasileiros lá fora como nós os respeitamos aqui e como nós os tratamos bem aqui. Acho que não podemos aceitar e não podemos ficar calados diante de tamanha violência contra uma brasileira no exterior”, afirmou.

Terça-feira passada, outra barriga monumental da Folha. Janio de Freitas descobre a presença de “um integrante da alta hierarquia da Al Qaeda” no Brasil. A manchete não durou sequer o que duram as rosas. Desde sexta-feira, não se fala mais no assunto.

Hoje, Clóvis Rossi reincidiu. Demonstrando uma insuspeita simpatia sobre o mais recente clown latino-americano, o cronista comenta o desafio do ditador venezuelano aos escritores que, liderados por Vargas Llosa, visitam a Venezuela: “Louve-se, aliás, Chávez por ter seguido essa linha ao propor um debate entre intelectuais de direita e de esquerda. Ideias se combatem com ideias, não com a censura, a prisão ou o banimento de quem as difunde”.

Rossi se referia ao debate proposto por Hugo Chávez aos escritores Vargas Llosa, do Peru, Jorge Castañeda, do México, Plinio Apuleyo Mendoza, da Colômbia, e o historiador mexicano Enrique Krauze, que foram a Caracas a convite do fórum Encontro Internacional pela Liberdade e Democracia. Os escritores decidiram que, para maior eficácia e clareza, o debate fosse apenas entre Chávez e Mario Vargas Llosa.

Ocorre que Hugo Chávez propôs o debate à tarde. "Eu digo seriamente, senhores da direita (...). Como eles dizem que [o debate] é comigo, eu aceito. Às 11h da manhã, eu lhes espero, portanto. "Alô, Presidente" abre as suas portas. Aí no salão Ayacucho. Venham, serão respeitados, sem evadir nenhum tema, qualquer tema é válido. Transmissão ao vivo."

À noite, outra era a disposição de Chávez. Quando a imprensa venezuelana já falava em “o debate do século” – como se o século já estivesse estertorando e tivesse idade suficiente para ser julgado –, Chávez recuou: "Vargas Llosa primeiro deve ganhar as eleições do Peru", afirmou em seu programa de TV”. O escritor foi candidato derrotado às eleições presidenciais peruanas de 1990.

Clóvis Rossi – levantando seu bracinho à la Dr. Strangelove antes do tempo – já havia até encontrado um motivo para simpatizar com o mais grotesco dos caudilhos latino-americanos. Só que seu ídolo decidiu que não é exatamente com idéias que se combatem idéias. Como o cronista parece não comunicar-se com a redação da Folha, acabou sendo desautorizado pelo próprio jornal em que escreve, na mesma edição em que escreveu.

 
MENSAGEM DO QUAGLIO


Saudações, Janer!


Não posso deixar de comentar seu texto “Einstein na berlinda”. Para começar, devo dizer que não entendo de física e não tenho títulos acadêmicos no campo das ciências naturais. Mas posso dizer que sou um leigo curioso, e gosto muito de ler e conversar sobre o assunto. Aliás, sou casado com uma cientista, e este tipo de assunto faz parte do meu cotidiano. Além do mais, tenho grande interesse em lógica e em filosofia da ciência, especialmente nas idéias de Karl Popper. Se no que vou escrever abaixo houver alguma tolice, por favor, releve, pois foi escrito apenas por um curioso, que não tem formação acadêmica em física ou filosofia.

Não pretendo defender o alemão nesta questão “Einstein x Poincaré”. Pelo que eu já li sobre o assunto, me parece que o francês realmente teria grande importância na elaboração da teoria da relatividade restrita, precedendo Einstein, embora este alemão mereça o crédito pela teoria da relatividade geral. Mas não posso concordar, de maneira alguma, com a sua comparação entre Einstein, Marx e Freud. Esta questão já foi elucidada pela brilhante análise comparativa que Popper faz das idéias de Einstein, Freud, Marx, Adler. Entre o final do século XIX e o início do século XX, todos estes tiveram a pretensão de atribuir o status de ciência a suas idéias.

Popper demonstrou que as idéias de Einstein, mesmo se se revelassem falsas, diferiam essencialmente das idéias dos demais. Isto porque a teoria da relatividade restrita é passível de refutação. Se suas predições se revelassem erradas, a teoria poderia ser descartada. As idéias de Freud, Marx, Adler, assim como as doutrinas religiosas, ou crendices quejandas, como a astrologia, são impossíveis de serem refutadas, pois seus seguidores sempre poderão elaborar hipóteses ad hoc para garantir sua sobrevida, mesmo que a realidade e a experiência as contradigam. Se o marxismo, o cristianismo, o freudismo, a astrologia, sobrevivem em nossa época, é porque seus seguidores insistem que a realidade ainda não as refutou. O exemplo clássico é a seguinte afirmação: “é errado dizer que o socialismo não deu certo porque nunca houve sociedades verdadeiramente socialistas, mas um dia elas existirão, conforme predito por Marx.” Outro exemplo: “Cristo voltará”.

O mesmo não seria possível em relação à teoria de Einstein. Suas predições não são vagas, imprecisas, do tipo “um dia acontecerá tal coisa...” O exemplo clássico é o experimento em Sobral, no Ceará, em 1919. Se os físicos britânicos naquela ocasião, no Nordeste do Brasil, não tivessem observado o desvio da luz provocado pela atração gravitacional do Sol, conforme predito pelas idéias de Einstein, não haveria como dar à teoria da relatividade a mesma sobrevida que é dada à psicanálise e ao socialismo. Popper demonstrou que a irrefutabilidade não é uma virtude, mas sim um defeito de uma idéia, enquanto a refutabilidade de uma hipótese é o melhor critério para enquadrá-la na categoria de científica, pois permite que ela enfrente um confronto com a realidade. Podemos dizer que as idéias da Marx ou de Freud, assim como as dos relativistas, pós-modernistas, religiosos, e demais exploradores da credulidade humana, são idéias “covardes”, pois evitam “comprar briga” com a experiência e com a realidade. São como aqueles sujeitos que apanham, ou que fogem da briga, mas que insistem em manter a pose de valentões, que batem, que não têm medo de ninguém. As idéias de Einstein, bem como as de Newton, Galileu, Darwin ou Mendel não são assim. Ao contrário, são idéias “valentes”, que sobrevivem aos constantes confrontos com a experiência, que entram na briga com a realidade objetiva, e se mantêm de pé.

O que o Peter Hayes parece querer fazer é justamente igualar a teoria de Einstein às idéias irrefutáveis, às ideologias políticas marxistas, às crendices religiosas. Mas, francamente, parece que esse tal Hayes quer aparecer. As idéias de Popper, Lakatos, e outros filósofos da ciência seguidores da mesma corrente sustentam (do ponto de vista lógico, formal, e não empírico), que idéias científicas não são como matemática ou lógica, ou seja, não são demonstráveis de forma absoluta, definitiva. Uma teoria científica, que tenta compreender o mundo, é diferente de uma demonstração matemática. Não se pode exigir da teoria da relatividade o mesmo rigor das demonstrações euclideanas. As teorias científicas sempre serão ou provisórias, ou se revelarão um “caso-limite”. A física de Newton, por exemplo, é válida, mas é um caso-limite, descreve a gravitação sem levar em conta aquilo que uma teoria mais abrangente, a de Einstein, pôde abarcar. A teoria de Einstein, por sua vez, poderá se revelar um caso limite de alguma teoria vindoura mais abrangente, e por aí vai (apesar da objeção, interessante, feita por alguns filósofos mais recentes, de que quanto mais abrangente uma teoria se torna, menos poder de previsão ela tem, e menos “científica” ela se torna). Assim, parece que Hayes está querendo dizer que a física de Einstein é ideologia apenas por causa de sua incompletude, sendo que isto nunca impediu outras idéias, como as de Galileu ou de Newton, de serem consideradas científicas. E=mc² está longe da U.T.I.

Em suma, pode-se até discutir se o crédito pela relatividade restrita é de Einstein ou de Poincaré, mas a própria teoria, seja de quem for, está longe de agonizar ou de sequer ser comparada com o marxismo ou o freudismo. Aliás, você já ouviu alguém falar em “einsteinismo” ou “galileismo”?

Também não concordo com a afirmação de que a glória de Poincaré foi salva por Lorentz. Henri Poincaré foi um matemático tão brilhante, com uma produção intelectual tão vasta e significativa para a matemática, que mesmo que ele não tivesse qualquer participação na teoria da relatividade restrita, seu fama estaria assegurada.

Caro Janer, você, no começo do texto, disse que entende menos da relatividade do que de grego. Tenho uma boa dica de leitura sobre o assunto. Há vários livros de divulgação científica que pretendem explicar a relatividade para leigos, mas, recentemente, eu vi em uma livraria (e comprei na hora), uma nova edição (atualizada) que a Zahar lançou do livro ABC da Relatividade, escrito por ninguém menos que Bertrand Russell. Até agora, tudo o que eu li do Russell valeu a pena ler.

Um grande abraço do seu leitor,

Humberto Quaglio

 
TESE DA AL QAEDA NO BRASIL NÃO
DUROU NEM O QUE DURAM AS ROSAS



Terça-feira passada, na Folha de São Paulo, Janio de Freitas revelava a prisão no Brasil de “um integrante da alta hierarquia da Al Qaeda. (...) A importância do preso se revela no grau de sua responsabilidade operacional: o setor de comunicações internacionais da Al Qaeda”.

Apressadinho, ainda no mesmo dia, o recórter tucanopapista da Veja já se perguntava, assumindo plenamente a barriga: "Integrante da alta hierarquia da Al Qaeda é preso em SP. Tarso vai protegê-lo?"

Dia seguinte, o paroxismo do recórter atingiu o clímax. Levantava suspeitas de que Lula e Tarso Genro pretenderiam acobertar a permanência de um terrorista no país. Até hoje, sábado, nenhum outro jornal assumiu a notícia irresponsável. Nem mesmo a revista do recórter. A Justiça Federal em São Paulo, por sua vez, informou ontem em nota distribuída à imprensa que as investigações contra Khaled Hussein Ali – o misterioso personagem K - foram encerradas e não há prova alguma de que o cidadão libanês faça parte da Al-Qaeda.

A hipótese desvairada de um terrorista da Al Qaeda operando no país não durou sequer o que duram as rosas. Quem deve estar feliz são os petistas e, particularmente, Tarso e Lula. Finalmente ficou comprovada a maldade da imprensa, que se dedica a caluniar o governo e o PT. Com seus artigos histéricos, Janio de Freitas e Reinaldo Azevedo prestaram um inestimável serviço a um governo e a um partido corruptos. E conseguiram, de inhapa, desmoralizar os jornais em que trabalham.

sexta-feira, maio 29, 2009
 
AINDA EINSTEIN


Mensagem do Eraldo

Caro Janer.

Em follow-up ao debate sobre a Relatividade, no blog, eu gostaria de dizer que a Relatividade foi, sim, apropriada e ideologizada por diversos setores da intelectualidade, dando origem ao que hoje chamamos de 'Relatividade cultural', que está na base de todos os equívocos ideológicos que vemos ao redor, notadamente questões racias/étnicas, como políticas de cota, etc.

Einstein não batizou a teoria, e não se sentia muito à vontade quando ela começou a ser chamada de 'Teoria da Relatividade'. Ele acabou se rendendo mais tarde. Seu trabalho original de 1905 chama-se "Da Eletrodinâmica dos Corpos em Movimento".

Einstein era um cientista "clássico", e não se filiava a ideologias. Mesmo sua militância no pacifismo e no movimento Sionista tinha um caráter pessoal e universalista. Ele veio a se decepcionar mais tarde com a agressividade do movimento, e acabou se afastando do 'hard core'.

Por fim devo dizer que o Princípio da Relatividade foi primeiramente enunciado por Galileu Galilei em seu tratado "Dialogo sopra i due massimi sistemi del mondo" [Diálogo Sobre os Dois Principais Sistemas do Mundo], de 1632, sendo conhecido como "Relatividade Galileana", e estabelece que as leis da física devem ser verdadeiras independemente das coordenadas do observador [em inglês 'frame of reference'].

Abraço,

Eraldo Marques



Mensagem do Francisco José

Bom dia, Janer,

Bravos pelo ceticismo, mas há afirmações bastante questionáveis nos dois textos sobre Einstein. Primeiro, é discutível que Poincaré tenha cunhado o termo Relatividade. Tal primazia cabe, no mínimo, ao físico Ernst Mach, que foi o primeiro a, seriamente, por em cheque os conceitos de tempo e espaço absolutos. Einstein nem usou o termo em seu artigo de 1905.

Quando Einstein publicou seu artigo nos Anallen ele era um obscuro funcionário público em Berna, enquanto Poincaré já era conhecido como um dos maiores matemáticos do seu tempo, senão o maior. Quem tinha mais condições de promover lobbies?

O autor do E=mc2 foi indubitavelmente Einstein, que, no seu desenvolvimento, aplicou as transformações de Lorentz e o princípio da velocidade-limite da luz. Poincaré jamais, repita-se, jamais, avançou que a velocidade da luz era um limite do universo. Portanto, nem de longe se pode atribuir o E=mc2 a Poincaré.

Nem muito menos a Lorentz, que era um físico conhecido e admirado por Einstein. As transformações de Lorentz derivam diretamente de um insight de um fisco escocês chamado Fitzgerald. Este sim, é que poderia ser considerado um precursor realmente efetivo do que ficou conhecido depois como a teoria da relatividade.

Supondo que o comitê do Nobel tenha titubeado em atribuir a relatividade restrita exclusivamente a Einstein, o que é altamente questionável, uma vez que o trabalho de Poincaré não contém o principal da teoria, que é a velocidade-limite da luz, o prêmio pela explicação do efeito fotoelétrico não pode ser considerado apenas um pretexto. A explicação é um dos eventos fundadores da mecânica quântica, que responde, em boa parte, pelo que o mundo é na atualidade.

Não se esqueça que, além da relatividade restrita, Einstein fez ainda a relatividade geral em 1915, mostrando que o espaço não só não é absoluto como também é uma “coisa”, que sofre a ação da matéria e energia. Ninguém se arrisca a dizer que a Geral foi prenunciada por Rienmann, que foi o matemático cuja geometria foi amplamente utilizada por Einstein para desenvolvê-la.

Dizer que Einstein não sabia distinguir uma grandeza de sua medida é de uma enormidade sem tamanho. No seu anno mirabilis, como é conhecido o ano de 1905 para Einstein, ele desenvolveu ainda o instrumento matemático do movimento browniano, que tem aplicações até na economia moderna.

Quanto a dizer que a Relatividade é uma ideologia, seja lá o que queira significar isso, as duas teorias de Einstein passaram por todos os testes de comprovação a que foram submetidas. Esse fato talvez seja único na história da física, já que a mecânica quântica ainda não goza de previsibilidade total dos fenômenos.

A inconsistência a que o segundo texto se refere, conhecida como o “paradoxo dos gêmeos”, já foi amplamente comprovada aqui mesmo na terra. Dois relógios sincronizados, um deixado na terra e outro a bordo de um avião, registram diferentes passagens dos tempos depois das viagens.

Os textos são mais um exemplo daquela convenção de Castela, quando Colombo desafiou os sábios a porem um ovo de pé. Eles também acharam fácil quando Colombo quebrou a casca e conseguiu fazê-lo.

Um abraço.

Francisco José de Queiroz Pinheiro

 
LEITORES REAGEM


Sobre câncer:

Vinícius Arcaro responde:

Janer, segue link com evidência da estatística que mencionei em mensagem anterior.

Cancer Research UK
http://info.cancerresearchuk.org/cancerstats/types/prostate/incidence/

... It is estimated from post-mortem data, that around half of all men
in their fifties have histological evidence of cancer in the prostate,
which rises to 80% by age 80 ...

Vinícius


Sobre Einstein:

Ricardo Weber objeta:

Prezado Janer,

A respeito do texto sobre Peter Hayes reproduzido em seu blog, cumpre observar que não se trata de um cientista da Universidade de North East coisa nenhuma. O sujeito é professor de política em Sunderland. Será que entende mesmo do riscado? Para mais detalhes:

http://tinyurl.com/m2pkb4

E como um pouco de ceticismo não faz mal a ninguém...

http://tinyurl.com/l4agt4

Cordialmente,
Ricardo Weber


Luis Claumman escreve:

Sintam o drama. Um professor de Política de uma universidade britânica publica um artigo no periódico "Social Epistemology" em que afirma ser a Relatividade, não uma teoria científica, mas uma ideologia. De fato, a tolice é tamanha que tal artigo me passou despercebido até que ele recebeu uma matéria no "Inovação Tecnológica". O Inovação é famoso por ser um berço de bizarrices e má interpretação de artigos científicos - mau Jornalismo Científico, puro e simples - mas não costuma escrever sobre esse tipo de artigo obscuro. Alguém ainda mais insano teria levantado a bola. De fato, o rastro de bosta que segui aponta até o agregador de notícias de ciência europeu AlphaGalileo que publicou, em 12 de maio, um artigo reproduzindo matéria do site da universidade.

E qual o problema com o artigo? Além do fato de ter sido reproduzido copiosamente por aí em sites de notícias, supostamente, de ciências sem uma palavra de confronto sequer? Todos!

Vou citar trechos da matéria da Ciência Hoje portuguesa (que não tem nenhuma relação com a homônima brasileira), que é praticamente tradução direta do release da universidade. Peter Hayes diz que, "a teoria da relatividade aborda inconsistências elementares, mas quando em 1919 foi popularmente divulgada, o mundo passou por uma guerra terrível e uma gripe pandémica e as ideias de Einstein surgiram como o tónico que a sociedade precisava. Com a confusão estabelecida, as pessoas deixaram de questionar as falhas que transpareciam".

Sério isso? A Relatividade foi aceita por causa da Gripe? Calma, tem mais. Hayes deve se achar O desbravador das ciências por dizer que a Relatividade é inconsistente por causa do Paradoxo dos Gêmeos, que ele chama de Paradoxo do Relógio:
"O Paradoxo do relógio ilustra de forma evidente as inconsistências da teoria que a tornam cientificamente problemática, mas ideologicamente poderosa".

Isso não é mais Paradoxo há muito tempo! Ao que parece, o autor leu um artigo de divulgação pela metade e saiu se achando máximo por ter percebido o furo na Teoria da Relatividade! E ainda parece ter gasto todo o artigo só com esse argumento pífio já que é o único citado nas matérias.

Sabe o que é mais irônico? O cara muito provavelmente deve ter um aparelho de GPS, que seria inútil sem as correções relativísticas. Deve ter feito uma Tomografia por Emissão de Pósitrons (PET), antipartículas essas que foram previstas na formulação relativística de Dirac da Equação de Schrödinger. E por aí vai. Aí você me abre um artigo que se diz tratar de uma crítica à relatividade, e ao invés de encontrar algo, por exemplo, sobre violação de Lorentz, me encontra uma crítica baseada no Paradoxo dos Gêmeos. AHVAPAPUTAQUEPARIU. E essa joça ainda recebe atenção da mídia. Mereço isso? Depois ficam de mimimi quando se fala mal das Ciências Sociais. Taí um representante típico delas. Se esse é o tipo de artigo aceito pela Social Epistemology, deve ter coisa lá muito mais engraçada que o do "Affair Sokal". E com um bônus: assombrosamente sinceros.

http://scienceblogs.com.br/dimensional/2009/05/055.php

Um abraço,
Luis


Luiz Felipe Martins escreve:

"O LHC (Large Hadron Collider) é o maior experimento científico já feito pelo homem, tendo sido criado para arremessar prótons uns contra os outros em velocidades próximas à da luz, recriando as condições momentos depois do Big Bang. Infelizmente, até agora ele não funcionou. E ele poderá de fato não funcionar, e não por causa de suas falhas elétricas ou mecânicas, mas porque as teorias básicas da física podem estar erradas".

Esta é a razão básica por que se faz experimentos: para mostrar que teorias da física podem estar erradas. Como o experimento de Michelson-Morley mostrou que a teoria do éter estava errada, e vários experimentos no início do século 20 mostraram que a mecânica newtoniana não se aplica em pequenas escalas.

L. Felipe Martins
Department of Mathematics
Cleveland State University

 
ÓDIO AO OCIDENTE


Comentando o caso do misterioso cidadão K, libanês que seria um integrante da alta hierarquia da Al Qaeda - segundo Janio de Freitas - diz o desembargador Baptista Pereira: “o paciente está sendo investigado pela Polícia Federal, na denominada Operação Imperador, originada de interceptações telefônicas, com a finalidade de investigar a existência de suposta organização denominada Jihad Media Battalion, que propagaria material de cunho racista e de intolerância e discriminação religiosa pela rede mundial de computadores, internet, visando à incitação do ódio aos ocidentais e o fomento de ideologia anti-semita, colaborando com grupos como Al-Qaeda".

Pelo jeito, ódio ao Ocidente virou crime. Ora, legislação alguma tipifica ódio como crime. Ódio é um sentimento personalíssimo, que se esconde no fundo de cada alma. Que me conste, jamais será prova material de qualquer crime. É sentimento que desconheço. Mas me parece ser direito inalienável de qualquer pessoa odiar – ou amar – quem quer que seja. Enquanto este ódio – ou amor - não se transformar em atos tipificados como crime, não é crime. Crime é o ato definido como tal pela lei, não a intenção subjetiva de matar, ferir ou prejudicar alguém. Quanto à incitação ao ódio aos ocidentais, se algum juiz quiser condenar alguém, a nata da intelligentsia brasileira devia estar na cadeia.

O ódio ao Ocidente tem, a meu ver, sua mais clara exposição no Manifesto Comunista. "Um fantasma ronda a Europa: o fantasma do comunismo" – esta é a primeira frase do panfleto. Fantasma é algo que ameaça. A ameaça de Marx, no caso, dirige-se ao continente que o gerou, à cultura por excelência ocidental. Ódio ao Ocidente nutriram todos os marxistas de todas as décadas, que jamais aceitaram seus mais importantes achados: democracia, eleições livres, livre expressão do pensamento, liberdade de imprensa, o conceito de indivíduo. Ódio ao Ocidente nutriram Marx, Lênin e Stalin. E também os mais reputados escritores do século passado, desde Sartre e Brecht a Pablo Neruda e Jorge Amado.

Ódio ao Ocidente é moeda bastante comum ... no Ocidente. Odiaram o Ocidente todos os intelectuais marxistas que defenderam Lênin, Stalin, Mao, Pol Pot, Castro, e eles foram legião. Filosofia, literatura e artes do século passado – e mesmo deste – estão eivadas deste ódio ao Ocidente. Odeiam o Ocidente todos os intelectuais europeus que defendem o Islã. Todos os defensores da imigração ilegal na Europa. Todos aqueles que julgam ser um direito dos árabes ter tribunais islâmicos para julgar árabes na Europa. Todos aqueles que defendem a infibulação da vagina e a ablação do clitóris em nome da diversidade cultural. Todos os padres que defendem a permanência de mendigos nas ruas, empestando as belas cidades que o Ocidente construiu.

Todos os defensores de culturas ágrafas, de tribos que não chegaram à Idade da Pedra, como se estas fossem iguais ou superiores à cultura ocidental. Todos os racistas que defendem a existência de cotas raciais na universidade e no trabalho. Essa gente que acha que negro vale por dois brancos na hora de disputar um lugar ao sol só porque é negro. Que índio tem direito a vastos territórios que sequer conseguiria controlar só porque é índio. Todos os antropólogos, sociólogos e outros oólogos que defendem o sagrado direito de os bugres enterrarem vivas suas crianças, quando as consideram inaptas para a vida. Todos os militantes de qualquer partido que defendam o direito à invasão de propriedades e depredação de laboratórios onde se faz ciência.

O ódio ao Ocidente e seus valores, à democracia, à liberdade de expressão, aos direitos iguais para todos - sem distinção de raça, cor ou fortuna – está incrustado nas universidades, nos jornais, nos tribunais... do Ocidente. É redundante buscá-lo em um pobre diabo oriundo do Líbano.

quinta-feira, maio 28, 2009
 
EINSTEIN NA BERLINDA


Em 2005, quando a imprensa toda celebrava Albert Einstein como o autor da mais famosa teoria do século passado, comentei algumas objeções feitas à sua teoria da relatividade. Não que as objeções fossem minhas. Entendo tanto da teoria da relatividade quanto de grego. Ou melhor, de grego até que entendo um pouco. Sem entender do riscado, reproduzi declarações de cientistas da área. Como o físico brasileiro César Lattes, para quem “Einstein é uma fraude, uma besta! Ele não sabia a diferença entre uma grandeza física e uma medida de grandeza, uma falha elementar”.

Mais ainda, Lattes fazia uma grave acusação ao físico alemão:

- Ele plagiou a Teoria da Relatividade do físico e matemático francês Henri Poincaré, em 1905. A Teoria da Relatividade não é invenção dele. Já existe há séculos. Vem da Renascença, de Leonardo Da Vinci, Galileu e Giordano Bruno. Ele não inventou a relatividade. Quem realizou os cálculos corretos para a relatividade foi Poincaré. A fama de Einstein é mais fruto do lobby dele na física do que de seus méritos como cientista. Ele plagiou a Teoria da Relatividade. Se você pegar o livro de história da física de Whittaker, você verá que a Teoria da Relatividade é atribuída a Henri Poincaré e Hawdrik Lawrence. Na primeira edição da Teoria da Relatividade de Einstein, que ele chamou de Teoria da Relatividade Restrita, ele confundiu medida com grandeza. Na segunda edição, a Teoria da Relatividade Geral, ele confundiu o número com a medida. Uma grande bobagem. Einstein sempre foi uma pessoa dúbia. Ele foi o pacifista que influenciou Roosevelt a fazer a bomba atômica. Além disso, ele não gostava de tomar banho...

Entrevistado pelo Diário do Povo, de Campinas, Lattes dizia que a fama de Einstein era fruto de um lobby:

DP - Então o senhor considera a Teoria da Relatividade errada? Aquela famosa equação E=MC² está errada?
César Lattes - A equação está certa. É do Henri Poincaré. Já a teoria da relatividade do Einstein está errada. E há vários indícios que comprovam esse ponto de vista.
DP - Mas, professor, periodicamente lemos que mais uma teoria de Einstein foi comprovada...
César Lattes - É coisa da galera dele, do lobby dele, que alimenta essa lenda. Ele não era tudo isso. Tem muita gente ganhando a vida ensinando as teorias do Einstein.

Outros pesquisadores chegaram à mesma conclusão. Segundo o engenheiro Christian Marchal, Henri Poincaré apresentou o princípio da relatividade no congresso científico mundial de Saint-Louis, no Missouri, em setembro de 1904. Em 5 de junho de 1905, reapresentou-o à Académie des Sciences de Paris, e o trabalho foi publicado em 9 de junho do mesmo ano. Segundo Marchal, o trabalho de Einstein sobre a relatividade em 1905 contém os mesmos resultados que o de Poincaré.

Para Marchal, a morte precoce de Poincaré por câncer em 1912 e a ausência no trabalho de Einstein sobre a relatividade em 1905 não seriam as únicas razões pelas quais o matemático francês é tão ignorado e Einstein tão célebre. Se Poincaré tivesse a possibilidade de publicar em uma grande revista de física, como os Annalen der Physik de Einstein, ele teria uma grande audiência. Mas ele só encontrou a Rendiconti del Circolo Matematico di Palermo para publicar seu trabalho maior de 1905, uma pequena revista de matemática que não era conhecida pelos físicos.

A glória de Poincaré acabou sendo salva por seu amigo holandês Hendrik Antoon Lorentz, prêmio Nobel de Física (1902). Em 1921, após o triunfo do eclipse do sol de 1919, o comitê Nobel se reuniu com um primeiro pensamento: "Nós devemos dar o prêmio Nobel a Einstein, pela relatividade". Lorentz protestou: "Não é justo!". E publicou um ensaio sobre a vida de Poincaré que ele havia escrito em 1914. "Poincaré obteve uma invariante perfeita das equações da eletrodinâmica e formulou o 'postulado da relatividade', termos que ele foi o primeiro a empregar".

Constrangido, o comitê Nobel pensou melhor e, após alguns meses de reflexão, decidiu dar o prêmio Nobel a Einstein, não pela relatividade... mas pelo efeito fotoelétrico. Marchal não cede: Poincaré é o pai do princípio da relatividade e o fundador da relatividade restrita.

Em Comment je suis devenu Einstein – La véritable histoire de E=mc2 (Paris, Carnot, 2005), Jean-Paul Aufray mostra definitivamente como foi montada toda a farsa. A imprensa – não só a brasileira, como também a internacional – não gosta de comentar tais fatos, afinal seria soterrar mais um mito, criado em boa parte pela mídia. Comentei estas declarações na época. Cheguei a perder um bom amigo, com quem convivia há cerca de trinta anos. Coisas da época. Houve um tempo em que relações eram cortadas em função de fatos ocorridos na Rússia. Foi o que afastou Sartre de Camus, para lembrarmos dois vultos das Letras. Mais adiante, amizades foram destruídas por fatos ocorridos no Vietnã e Camboja. Mais alguns anos, e pessoas cortavam relações por divergências a respeito de Cuba. Sempre a ideologia. Que parece ter contaminado inclusive a teoria da relatividade.

O leitor Luís Bonow me envia novas revelações sobre a polêmica. Marx já morreu, Freud está agonizando. Ao que tudo indica, Einstein já entrou na U.T.I. Desta vez, o que se discute não é a autoria do E=mc2, mas a própria teoria. Para discussão de quem entende do riscado, reproduzo o texto.

 
TEORIA DA RELATIVIDADE E IDEOLOGIA

Teoria da Relatividade é ideologia, e não ciência, defende pesquisador

Redação do Site Inovação Tecnológica (http://www.inovacaotecnologica.com.br)

27/05/2009

O LHC (Large Hadron Collider) é o maior experimento científico já feito pelo homem, tendo sido criado para arremessar prótons uns contra os outros em velocidades próximas à da luz, recriando as condições momentos depois do Big Bang. Infelizmente, até agora ele não funcionou. E ele poderá de fato não funcionar, e não por causa de suas falhas elétricas ou mecânicas, mas porque as teorias básicas da física podem estar erradas.

Voz dissonante

Esta idéia quase maluca, absolutamente dissonante no mundo científico, acaba de ser defendida pelo Dr. Peter Hayes, um cientista da Universidade North East, no Reino Unido.

"Os físicos teóricos têm colhido da árvore errada nos últimos 100 anos - porque a Teoria da Relatividade de Albert Einstein é inconsistente," afirma Hayes. "Ao longo dos anos, muitos têm apontado que há falhas lógicas na teoria. Já nos anos 1960 o professor Herbert Dingle alertou que experimentos de larga escala baseados na Teoria da Relatividade poderiam acabar destruindo o mundo. Talvez tenha sido uma sorte para nós que o LHC simplesmente quebrou," vaticina o pesquisador.

A Ideologia da Relatividade

Em seu último artigo, "A Ideologia da Relatividade", o Dr. Hayes argumenta que a Teoria da Relatividade de Albert Einstein - provavelmente a teoria científica mais famosa da história - deveria ser vista como uma ideologia, não como ciência. Ele argumenta que seus impactos na ciência e na cultura popular foram tão grandes precisamente porque, como uma teoria científica, ela de fato não faz sentido.

"A teoria de Einstein contém inconsistências elementares, mas em 1919, quando a teoria se tornou conhecida popularmente, o mundo estava saindo de uma guerra terrível, seguida por uma pandemia de gripe. As ideias de Einstein eram tudo o que 'eles' precisavam. Na pressa de divulgá-la, poucas pessoas pararam para questionar as falhas lógicas óbvias da teoria," diz Hayes, traçando um quadro típico de uma teoria da conspiração - ele não aponta quem eram os "eles" que precisavam de tal ideologia.

Críticos de Einstein

"Alguns dos primeiros críticos de Einstein assumiram posições de direita e antissemíticas e isso tendeu a desacreditar suas objeções técnicas à relatividade como sendo cientificamente superficial. Meu artigo investiga uma possibilidade alternativa: que os críticos estavam certos e que o sucesso da teoria de Einstein em suplantá-los deve-se à sua força como uma ideologia e não como uma ciência," propõe o pesquisador.

O Paradoxo do Relógio

Uma falha famosa na teoria de Einstein é o chamado Paradoxo do Relógio. Ele estabelece que se um relógio viaja a bordo de uma espaçonave, enquanto outro fica na Terra, quando o relógio da espaçonave retornar ele irá mostrar que se passou menos tempo do que o relógio que ficou na Terra.

Essa previsão viola o próprio "princípio da relatividade" de Einstein, que estabelece que, se você está na espaçonave deverá ser o relógio que ficou na Terra que andará mais devagar. Esta é uma crítica que a ciência nunca foi capaz de resolver satisfatoriamente.

"O Paradoxo do Relógio ilustra como a Teoria da Relatividade de fato contém inconsistências que a tornam cientificamente problemática. Essas inconsistências, contudo, tornam a teoria ideologicamente poderosa. Precisamente porque a teoria de Einstein é inconsistente, seus defensores têm se baseado em princípios contraditórios de uma forma que expande enormemente sua aparente capacidade de explicar o Universo," diz Hayes.

Como o Marxismo

"O mais incrível sobre a Teoria da Relatividade de Einstein é que ela continua se mantendo. Ela é construída sobre contradições, mas exatamente essas contradições significam que quase tudo 'prova' que ela está correta. É mais ou menos como uma teoria onde você diz que 1 + 1 = 2, mas também que 1 + 1 = 3," defende Hayes.

Contudo, o pesquisador não acredita que descrever a teoria de Einstein como uma ideologia, em vez de ciência, é o mesmo que dizer que a teoria não tem valor. "O Marxismo é uma ideologia, não uma ciência, mas Karl Marx continua dando insights valiosos sobre o funcionamento do capitalismo. Uma vez que a Teoria da Relatividade seja entendida dentro do que ela realmente é, uma ideologia, nós poderemos entender onde a Teoria da Relatividade pode oferecer insights para a ciência e onde ela não pode.

"O triunfo da Teoria da Relatividade representa o triunfo de uma ideologia não apenas na profissão de físico, mas também na filosofia da ciência," conclui Hayes.

 
A CHISPA DA FERRADURA


Na terça-feira, reproduzi uma entrevista com o deputado Aldo Rebelo, do PCdoB de São Paulo. A lucidez e propriedade com que analisa a questão indígena me surpreenderam na boca de um comunista. Algo parecia estar errado no universo.

Ontem, diante da Justiça Federal, o deputado afirmou que jamais soube da existência do mensalão. Que o Estadão já está definindo como “suposto esquema de pagamento de propina a parlamentares para influenciar votações no Congresso a favor do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva”. Ou seja, o que ainda há pouco era evidente, agora já é suposto.

"A partir do que pude testemunhar, eu não tive conhecimento nem vi esse esquema funcionando", disse Rebelo, após depor como testemunha de defesa dessa pérola sem jaça, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. "Para mim, não existiu”.

Algo estava mesmo errado no universo. O deputado – após uma fugaz crise de lucidez – voltou a seu estado normal. Em um comunista, a mentira é uma segunda natureza. De nada adianta expulsar a natureza pela porta, ela volta à galope pela janela.

Era apenas a chispa da ferradura quando bate na calçada, como gostava de dizer Agripino Grieco.

quarta-feira, maio 27, 2009
 
RECÓRTER TUCANOPAPISTA
HIDRÓFOBO EX-BOLCHEVIQUE
CAI NO CONTO DA AL QAEDA


Costumo afirmar que o melhor serviço que um jornalista pode prestar a Lula e ao PT é atribuir a Lula e ao PT fatos ou falsas intenções. Na Veja on line de hoje, um velho bolchevique da escola de outro velho bolchevique, o astrólogo Olavo de Carvalho, em seu afã de redimir-se dos pecados de juventude, vergasta qual xiita as próprias costelas com as correntes do antipetismo. Se Janio de Freitas não ousou responsabilizar Lula e o PT pela existência de “um integrante da alta hierarquia da Al Qaeda” no Brasil, Reinaldo de Azevedo ousa.

Pois é… Essa história só piora a cada hora. Informações que partem da cúpula da Polícia Federal e que circulam entre procuradores, transmitidas a jornalistas e a parlamentares, asseguram que surgiram, sim, os vínculos entre o tal indivíduo e a Al Qaeda. O dito-cujo, que já está solto, tem atividade regular em São Paulo, o que, por si, não quer dizer nada. Simpatizantes e militantes terroristas buscam sempre uma fachada legal para a sua atividade. Há tergiversação para todo lado. A nota do Ministério Público dá o que pensar. Seria necessário haver um “conteúdo criptografado” para ficar caracterizado o vínculo? Por quê? Uma coisa é certa: setores da PF e do próprio MP não gostaram do desfecho do episódio e reafirmam a ligação do agora ex-detido com a rede terrorista chefiada por Osama Bin Laden.

O recórter fala de “informações que partem da cúpula da Polícia Federal e que circulam entre procuradores”. Fala de "setores da PF e do próprio MP". Que informações são essas que jornal algum possui e que só ele, o bem informado, possui? Poderia citar algo mais concreto que “cúpula”, "setores da PF e do próprio MP" ou “entre procuradores”? Pelo jeito, não pode.

Ontem ainda, o recórter assumia plenamente a barriga de Janio de Freitas: "Integrante da alta hierarquia da Al Qaeda é preso em SP. Tarso vai protegê-lo?" Hoje, diante dos fatos, aventa que tudo pode não passar de um engano, para tirar o seu da reta no momento oportuno. Mas deixa no ar a insinuação:

Ainda que tudo não passasse de um engano — mas gente muito próxima do caso assegura que é fato —, as reações de Lula e Tarso Genro não poderiam ser piores. O presidente acusou interferência estrangeira no caso. Ora, segundo a procuradoria, “o FBI apenas pediu para receber informações sobre o caso para fins de inteligência”, cumprindo-se, diga-se, o seu papel. E peço que vocês atentem para o fato de que, em sua nota oficial, a Polícia Federal NÃO NEGOU os vínculos entre a pessoa que foi presa e a Al Qaeda. A investigação, é fato, se dá sob sigilo de Justiça, mas poderia ter havido um genérico “até agora, nada foi encontrado”. Não houve.

Quem é essa “gente muito próxima do caso”, que “assegura que é fato”? O recórter não as nomina. Em suas insinuações histéricas, está desmoralizando a revista em que escreve e entregando de bandeja, a Lula e a Tarso, argumentos para acusarem a imprensa de conspiração contra o PT.

 
YES! NÓS TAMBÉM
TEMOS AL QAEDA



O desejo de furar os demais jornais, a ambição de ser o primeiro a descobrir um fato de relevância, é um dos males que assolam o jornalismo. Não faz muito tempo, tivemos o caso da brasileira grávida atacada por neonazis na Suíça. Não estava grávida nem fora atacada. Mutilara a si mesma para obter vantagens do governo suíço. A “barriga” – não da moça – mas do jornalismo, foi obra de Ricardo Noblat. A Suíça foi caluniada nos jornais de todo mundo, como país que acolhe e tolera neonazistas, e o Noblat continua escrevendo como se nada tivesse escrito sobre a farsa. Desta vez, foi Janio de Freitas. Na edição de ontem da Folha de São Paulo, revelou, com manchete sensacionalista:

AL QAEDA NO BRASIL

ESTÁ PRESO no Brasil, sob sigilo rigoroso, um integrante da alta hierarquia da Al Qaeda. A prisão foi feita pela Polícia Federal em São Paulo, onde o terrorista estava fixado e em operações de âmbito internacional. Não consta, porém, que desenvolvesse alguma atividade relacionada a ações de terror no Brasil. A importância do preso se revela no grau de sua responsabilidade operacional: o setor de comunicações internacionais da Al Qaeda.


Já estava demorando. Finalmente! Nós também temos Al Qaeda. Sem citar fonte alguma, o jornalista inclusive deduz que o “terrorista” pertence à alta hierarquia da organização. Que, a meu ver, virou franquia. Qualquer atentado, se atribuído à Al Qaeda, adquire maiores dimensões. Quanto à Al Qaeda, esta não tem preocupação alguma em desmentir “sua” autoria. Toda notícia, mesmo falsa, só serve para prestigiá-la. Da mesma forma, a ninguém interessa noticiar a morte de Osama Bin Laden. Difícil acreditar que a maior potência do planeta, com todos seus recursos de espionagem, não tenha ainda encontrado um bandoleiro - que depende de diálise, pelo que se sabe - em fuga pelo deserto. Vivo, Bin Laden rende tanto aos americanos, que assim têm como justificar a base de Guantánamo e torturas, como aos muçulmanos, que mantém uma ameaça constante e letal sobre o Ocidente.

Nenhum jornal nacional assumiu o “furo” de Janio de Freitas. Nem mesmo o seu. Na edição de hoje, a Folha desvia o foco da notícia:

PF INVESTIGA ESTRANGEIRO POR RACISMO NA INTERNET

A Polícia Federal manteve preso por 21 dias o libanês K, comerciante de equipamentos de informática que mora em São Paulo, sob suspeita de que ele propagava na internet material com conteúdo racista.
Na edição de ontem da Folha, o colunista Janio de Freitas informou que um integrante da alta hierarquia da Al Qaeda tinha sido preso no Brasil.


O jornal menciona o colunista, mas logo dá uma nova versão da prisão. Trata-se em verdade de um libanês, que goza da condição "estrangeiro permanente" no Brasil e foi investigado por participação em um fórum na Internet. Segundo o desembargador do TRF (Tribunal Regional Federal) Baptista Pereira “o paciente está sendo investigado pela Polícia Federal, na denominada Operação Imperador, originada de interceptações telefônicas, com a finalidade de investigar a existência de suposta organização denominada "Jihad Media Battalion", que propagaria material de cunho racista e de intolerância e discriminação religiosa pela rede mundial de computadores, internet, visando à incitação do ódio aos ocidentais e o fomento de ideologia antissemita, colaborando com grupos como Al-Qaeda".

Ao que tudo indica, o Judiciário está assumindo os cacoetes do jornalismo. O desembargador, como qualquer repórter malandro, já fala em “suposta organização”. Triste país este nosso, em que “supostas organizações” constituem motivo para prender um cidadão. Se nem as tais de organizações têm existência comprovada, que se pode dizer de eventuais crimes por elas cometidos?

Segundo a procuradora federal Ana Letícia Absy, as investigações "não comprovaram que o preso em São Paulo é membro da Al Qaeda". Ainda segundo Absy, o libanês foi alvo de um inquérito aberto pela PF com base em informações do FBI, "sobre a existência de um fórum fechado da internet, publicado em língua árabe, com mensagens discriminatórias e antiamericanas".

Segundo a Folha, o Jihad Media Battalion “é uma organização virtual que propaga na internet um islã radical baseado na nostalgia de uma suposta idade de ouro que precisa ser revivida. Os responsáveis defendem a volta do califado que sucedeu Maomé, no qual, segundo eles, prosperava uma sociedade pura e honrosa. Os inimigos a serem combatidos são os EUA, Israel e os governos árabes aliados das grandes potências”. Que mais se pode esperar de uma organização que combate EUA e Israel? O site é amplamente divulgado na rede. Pelo jeito, o Judiciário e a PF, por uma questão de comodidade, estão investigando no Google.

O "suposto" Jihad Media Battalion – uso o adjetivo do desembargador – é acusado de divulgar vídeos com discursos de clérigos radicais e imagens de ataques antiamericanos no Iraque e no Afeganistão. Seria isto alguma novidade no mundo árabe? É o que faz a TV Al Jazeera Enghish, canal internacional da TV árabe com sede em Washington e acordo de parceria com o Grupo Bandeirantes, na Band News. Mais um pouco e os argutos investigadores e jornalistas concluírão que a Al Jazeera é o braço midiático da Al Qaeda.

Digamos que o cidadão K, como vem sendo chamado o misterioso libanês, tenha participado de fóruns fechados em língua árabe, com mensagens discriminatórias e antiamericanas, visando à incitação do ódio aos ocidentais e o fomento de ideologia antissemita. Ora, no universo muçulmano existem milhares – senão milhões – de fóruns antiamericanos, antiocidentais e anti-semitas. Ou alguém pretende que muçulmanos tomem a defesa do Grande Satã, do Ocidente ou de Israel?

Na imprensa nacional, só um antigo bolche que virou cristão novo assumiu a barriga de Janio de Freitas.

 
FALSO CURANDEIRO?


Leio no Globo, edição on line:

FALSO CURANDEIRO É DETIDO POR APLICAR GOLPES EM MG

Na linha fina:

Segundo a polícia, suspeito enganava vítimas com ajuda de mulher.
Ambos já haviam sido presos pelo mesmo motivo há cerca de um mês.


Pergunta que se impõe: existem verdadeiros curandeiros? A profissão já foi regulamentada? Falar em falso curandeiro é o mesmo que falar de falso psicanalista. Todo curandeiro é legítimo. Psicanalistas também.

terça-feira, maio 26, 2009
 
DEPUTADO COMUNISTA TEM
UM MOMENTO DE LUCIDEZ



É muito raro ouvir-se um depoimento sensato sobre a questão indígena no Brasil. Para minha surpresa, encontro ontem no Estadão, um depoimento lúcido e sensato... de um comunista. Falo do deputado do PC do B, Aldo Rebelo. O mesmo que teve a idéia nada feliz de proibir estrangeirismos no português falado no Brasil, como se as línguas fossem estanques. O mesmo que propôs a adição da farinha de mandioca à farinha de trigo, o que nos levaria a encomendar por amigos que fossem a Europa um mero pãozinho de farinha de trigo.

Com a entrevista de ontem, concedida ao repórter Roldão Arruda, Rebelo denuncia os desmandos da Funai, as pretensões das ONGs e antropólogos em construir Estados-fantoche, mostra o absurdo da expulsão dos arrozeiros de Roraima e a demarcação em área contínua da reserva Raposa Serra do Sol. O deputado comunista se redime de bobagens passadas. Merece transcrição.

''QUEREM QUE ÍNDIO CONTINUE TUTELADO''

Os índios brasileiros não são ouvidos pelas autoridades nos processos de demarcação de suas terras. O pior é que as demarcações ocorrem a partir de laudos antropológicos nem sempre confiáveis e sob pressão de organizações não-governamentais que insistem em tutelar os índios e apontar o Estado como ameaça à sua cultura. No conjunto isso estimula propostas secessionistas e põe em risco a integridade territorial do Brasil.

Em linhas gerais, esse foi o raciocínio que levou o deputado comunista Aldo Rebelo (PC do B) a apresentar na Câmara, em conjunto com seu colega Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), um polêmico projeto de lei que, se aprovado, obrigará o Executivo a submeter ao Congresso todos os processos de demarcação de terras indígenas. Na semana passada, em seu escritório político em São Paulo, o deputado, que já ocupou as cadeiras de ministro da Articulação Política e de presidente da Câmara, falou ao Estado, sobre o projeto e suas razões. A seguir, os principais trechos da conversa.

O que o levou a esse projeto, que transfere as demarcações do Executivo para o Legislativo?

O projeto não subtrai do Executivo a prerrogativa de demarcação das terras indígenas. Apenas o obriga a enviar a proposta ao Congresso, que analisa, promove as discussões, as negociações necessárias com as partes envolvidas. Depois a proposta é devolvida ao Executivo, na forma original ou modificada. É uma instância de negociação para todas as partes envolvidas, incluindo os índios, que não são ouvidos. O processo demarcatório é uma decisão unilateral da Funai (Fundação Nacional do Índio), que colhe o laudo - nem sempre rigoroso - de antropólogos e o submete ao Ministério da Justiça, que prepara o decreto de demarcação e encaminha ao presidente da República, que homologa.

Está mesmo dizendo que o governo não ouve os índios?

Não ouve. O caso da Raposa Serra do Sol é patente. Ali, um grupo grande de indígenas contestou a demarcação proposta pela Funai, mas não foi levado em conta.

A maioria dos índios era favorável à demarcação em área contínua.

Não creio. Pelo que apurei, em visitas à região, não havia maioria favorável. A relação entre os grupos de índios que vivem ali não é das mais amistosas e eles preferiam que a demarcação fosse em ilhas, onde cada tribo teria sua área demarcada, sem ser obrigada a conviver com outras. Isso também levava em conta as diferenças no estágio de evolução. Em Roraima existem indígenas que estão num estágio ainda próximo da coleta, da caça, e outros que são formados por pequenos fazendeiros, comerciantes.

O senhor falou que os laudos antropológicos que norteiam as demarcações nem sempre são rigorosos.

Ainda usando o exemplo da Raposa Serra do Sol, o laudo que deu origem àquela terra é eivado de fraudes. As mais diversas. Há fraude no censo que contabilizou a população indígena, na coleta de testemunhas, na contabilidade das malocas usadas como referência para a demarcação. Malocas localizadas na Guiana foram contabilizadas como se estivessem no Brasil. Tudo isso demonstra que é preciso uma autoridade que faça a mediação, para que não se cometam injustiças.

Falando em mediação, acha que os arrozeiros poderiam ter ficado na terra indígena?

Mas é evidente que sim. Já vi de tudo na vida. Já vi entrarem numa propriedade para desapropriá-la e trocá-la de mãos, como faz o socialismo, como fez Fidel Castro em Cuba. Mas destruir e imobilizar a capacidade produtiva, isso eu nunca vi. Como é possível transformar em crime a produção de arroz? Crime é contrabando, é narcotráfico.

Os arrozeiros não tinham títulos legais das terras.

Isso podia ser resolvido. Era só chegar e estabelecer um preço para eles. Aliás, porque os próprios índios não podiam arrendar aquelas terras? Obter algum tipo de benefício?

Por que isso não aconteceu?

Porque querem que o índio continue tutelado.

Afirma-se que, se seu projeto for aprovado, não haverá mais demarcação: serão todas barradas pela bancada ruralista do Congresso.

Acredito que o Congresso vai agir como tem agido, considerando em primeiro lugar a defesa da população indígena. Tudo que está sendo feito hoje decorre de uma autorização do Congresso - o Congresso Constituinte, que incluiu na Constituição a garantia e a defesa dos direitos indígenas. Eles sofrem de fato ameaças na sobrevivência física e na sobrevivência de suas culturas - daí a necessidade de demarcar suas terras, protegê-los. Mas ao mesmo tempo há necessidade de integrá-los; e não de estimular qualquer sentimento secessionista.

Acha que os antropólogos estimulam sentimentos secessionistas?

A antropologia, um ramo das ciências sociais, foi muito desenvolvida no auge do império britânico. O império estimulava, porque, por meio da ciência conhecia melhor os povos a serem subjugados. Em seus primeiros momentos, ela procurava convencer os chamados povos tribais, na África e em outros continentes, a se submeterem aos padrões da sociedade ocidental - porque isso interessava ao domínio britânico. Quando os impérios coloniais se desintegraram e essas sociedades tribais passaram a integrar embriões de Estados nacionais, a antropologia passou a aconselhá-los a permanecerem em seu estágio tribal, afirmando que os Estados nacionais eram uma ameaça. E é isso que, em resumo, vejo acontecer no Brasil. Dizem para os índios: continuem no seu estágio, o Estado nacional é uma ameaça a vocês. Eu acho que não há futuro para essas populações fora do Estado nacional brasileiro. O que vão constituir? Estados fantoches?

Pelo que diz, existe uma ameaça à segurança nacional.

No ano 2000, Orlando Villas Boas, que dedicou a vida aos indígenas, deu um depoimento a uma emissora de TV, hoje acessível pela internet, no qual fez uma advertência que é quase uma profecia. Disse que jovens ianomâmis estavam sendo levados para os Estados Unidos, onde iam ser treinados e aprender inglês. Depois retornariam ao Brasil para pedir a criação de um território próprio, um Estado. Nesse momento receberiam a proteção da ONU, que transferiria a tutela dessa população a uma grande nação. Ele dizia: "Eles não estão interessados nos ianomâmis, mas nas riquezas que há no subsolo."

Não acha isso fantasioso?

Não. No início do século 20 o Brasil perdeu 20 mil quilômetros quadrados do antigo Território de Roraima, em área consagrada, já demarcada como parte do território brasileiro. Inicialmente a Inglaterra enviou uma missão geográfica à região. Depois apareceu uma missão religiosa, que catequizou os índios, que, por sua vez, pediram a proteção da Inglaterra. Foi aí que os ingleses impuseram o litígio sobre a área. Ele foi submetido à arbitragem do rei da Itália, que dividiu o que era nosso: deu 20 mil quilômetros quadrados para a Inglaterra e deixou 20 mil para o Brasil. O território brasileiro sempre foi cobiçado.

O Brasil é signatário de convenções internacionais que tratam da questão indígena. Acha que podem constituir risco para a segurança nacional?

Sim. Principalmente a convenção da ONU que reconhece a soberania das populações indígenas.

Como vê a ação das ONGs?

O problema das ONGs é que veem os índios como instrumentos para estudos de caso de antropologia. Os índios dentro da reserva têm quase o status de uma cutia, uma paca, um bicho. Eles não têm direitos. São duplamente tutelados, pelas ONGs e pelo Estado.

Organizações envolvidas com questões indígenas dizem que a prioridade do Congresso deveria ser a votação do Estatuto do Índio.

Nós devemos votar o estatuto, demarcar as áreas indígenas, assegurar os direitos dos índios, garantir a presença do Estado no meio deles. Nós temos uma sub-Funai terceirizada, que praticamente entrega às ONGs a assistência aos índios. Queremos uma Funai forte, com uma política própria, que reconheça as dificuldades dessas populações. Como a sociedade nacional deve se comportar diante do índio? Segregando ou integrando? Eu defendo a integração.

Mesmo para os índios isolados, sem contato com outras culturas?

A nossa política sempre foi de fazer contato. Como é que o Estado vai prestar assistência a esses índios? Como vai levar assistência médica?

Não sente receio de ser identificado com grupos conservadores?

Não. Minha posição sempre foi em defesa da democracia, do socialismo e do Brasil.

 
LEITOR CONTESTA ESTATÍSTICAS
AVANÇADAS POR VINÍCIUS



Caro Janer

Achei interessante os números sobre o câncer de próstata porque levam a implicações de ordem econômica relevantes a todos. Apesar da probabilidade de se ter câncer iniciar em 50% e aumentar a partir dos 50 anos, vamos considerá-la invariável e igual a 50% a partir dos 50 anos e ver o que se pode esperar quanto ao número de casos (independentemente de terem sido diagnosticados) no ano passado.

As informações sobre a população do Brasil para 2008 estão disponíveis no site di IBGE. A tabela parcial abaixo mostra dados relativos à distribuição da população brasileira por faixa etária:

2008 Total Homens
Faixa de Idade 189.612.814 93.084.588

0-4 - 16.203.241 8.226.630
...
50-54 - 9.399.046 4.420.875
55-59 - 7.346.875 3.426.929
60-64 - 5.607.072 2.587.151
65-69 - 4.380.518 1.984.726
70-74 - 3.332.984 1.481.208
75-79 - 2.254.242 959.210
80 + - 2.410.106 991.003

15.851.102 (total da população a partir de 50 anos)

Assim era de se esperar que houvesse 7.925.551 novos casos (diagnosticados ou não) somente para a faixa etária a partir dos 50 anos se os 50% de chance de ter câncer passassem a valer a partir de 2008, o que representa uma verdadeira pandemia digna da abertura da caixa de Pandora ou de um Armagedon. Neste ritmo, em um futuro próximo esse câncer certamente concorrerá com a peste negra ou a febre espanhola pelo menos quanto ao número de casos.

No INCA (Instituto Nacional do Câncer) do governo o número total de casos de câncer de próstata esperados para 2008 é de singelos 49.530 (taxa de incidência de 52 por 100.000 pessoas) para toda a população. Para se ter uma idéia da diferença, se aplicarmos cem vezes essa taxa de incidência na população a partir de 50 anos obteríamos 824.257 casos para essa faixa, valor bem distante dos 7.925.551 casos anteriores. Infelizmente no site governamental não há dados sobre como varia a incidência com a idade.

As implicações financeiras decorrem da dificuldade de se chegar a certa idade a partir dos 50 sem ter contraído câncer. Como a cada ano que se envelhece a chance de não contrair esse câncer é de 50%, a probabilidade de se chegar sem ele aos 55 anos, por exemplo, é de 1,56% (1/2*1/2*1/2*1/2*1/2*1/2). Assim sendo, os planos de saúde teriam que passar a diluir obrigatoriamente o custo da futura doença proporcionalmente ao tempo necessário para o assegurado chegar aos 55 anos. Já para a saúde pública, o tratamento desse câncer poderia começar automaticamente depois dos 55 anos. Em caso de dúvidas, o mero toque retal seria suficiente para confirmar o diagnostico, quase não havendo necessidade do teste sangüíneo para PSA.

P.S.: Democratização perigosa – Depois da febre do déficit de atenção e do transtorno bipolar em crianças e adultos parece que uma nova doença psiquiátrica passa a nos assolar de modo ainda mais perigoso que as duas anteriores. Pelo menos é isso o que deduz do título de um novo livro de uma médica que apareceu recentemente: “Mentes Perigosas - O psicopata mora ao lado”. Que o diga o Hitchcock. Parece que finalmente todas as mulheres podem esperar pelo seu Normann Bates quando estiverem tomando banho...

Emerson Schimdt

segunda-feira, maio 25, 2009
 
MENSAGEM DO ALBUQUERQUE


Caro Sr. Janer,

Leio vosso blog há muito tempo, tenho muita satisfação em ler textos que instigam, concordando ou discordando deles, discordando principalmente no que se refere à sua verve algo misantrópica.

Emocionou-me a citação do Eclesiático, pois como médico e "cristão de idéia, não de fé", não praticante há muitos anos, conheço esta passagem e uso um estratagema, todo Hospital tem uma capela, naqueles em que eu trabalho não se foge à regra, pois ateus são os que menos resistem a uma prece no momento de desespero pela iminência do inexorável, da inefável - os deístas, ao contrário, tendem a perder a fé quando não são correspondidos, como se Deus, onipresente e onisciente, estivesse muito preocupado com a situação de fulano ou cicrano, individualmente.

Eu abro estrategicamente nesta passagem toda vez que passo na porta delas, e persistem, por muitos dias seguidos, as páginas abertas neste trecho, sinal de que as pessoas se interessam.

Toda vez que me vêm com essas baboseiras cretino-religiosas, mando lerem a passagem bíblica do Eclesiástico e comento: Quando morre, foi o médico; quando salva, foi Deus." Acaba aí a conversa.

A religiosidade nestes momentos pode até ser um consolo ou fortalecer um espírito desamparado num momento trágico, mas em nada interfere no prognóstico do paciente.

Espero que tenhamos pela frente mais artigos de vosso teclado, que fazem brilhar meus momentos de navegação na rede mundial.

Abraços,

Fernando Carreiro Albuquerque

 
O BRAVO BISPO PARAGUAIO
E NOSSOS BRAVOS GENERAIS



Recebo seguidamente e-mails furibundos, atacando o governo Lula, denunciando os desmandos do PT e defendendo o regime militar de 64, geralmente assinados por generais ou coronéis de pijama. São valentes, estes senhores, agora que reformados e sem voz na tropa. Quando exerciam seus comandos e detinham poder nas mãos, cães covardes com o rabo entre as pernas, permaneceram calados e subservientes ao governo. Hoje, isentos de punição por insubordinação e com soldo garantido, são modelos de bravura e indignação cívica. Lembram-me o bispo emérito Don Fernando Lugo, hoje presidente do Paraguai, acusado por três mulheres de ser o pai de seus filhos. Três, por enquanto.

Em entrevista ao jornal argentino Clarín, disse Don Fernando: "O celibato é uma opção pessoal de fé requerida pela Igreja Católica, mas tudo que o homem faz é sujeito a falhas. Acredito que apenas Deus é infalível. Tudo que o homem faz está sujeito a falhas. É o caso do celibato". Como nossos generais de pijama, o emérito reprodutor considera-se um bravo: "O fato do presidente reconhecer seu filho apesar de todo poder que tem é considerado por muitos um ato de bravura”.

Ou talvez de DNA. Atolado nas areias movediças da hipocrisia episcopal, quando mais esperneia, mais Don Fernando afunda. Por que não falou quando ainda tinha voz na Igreja? Sua confissão de “homem sujeito a falhas” seria um testemunho de vital importância ante uma igreja muda e insensível à sexualidade de seus pastores. Defroqué, seu discurso vale menos que um guarani. Ocorre que, se falasse enquanto bispo, estaria perdendo as regalias de Roma. Hoje, embalado pelas regalias do poder laico, se dá ao luxo de renunciar às antigas.

Esta é a razão da existência de tantos sacerdotes fornicadores na Igreja. Fora do generoso seio da Santa Madre, sentem-se como bezerros desmamados. Preservam então a batina, que além de fetiche para muitas mulheres, é garantia de sigilo de suas escapadelas. Mulher que dorme com padre está tranqüila: jamais será difamada no bar da esquina.

Mas Don Fernando, mesmo quando pretende parecer humilde, continua sofismando. O que está em jogo já nem é mais o celibato, mas o harém. Macho alfa dominante, o semental da pátria vai espalhando filhos por onde passa. Seria mais honesto se admitisse: “A monogamia é uma opção pessoal de fé requerida pela Igreja Católica, mas tudo que o homem faz é sujeito a falhas. Acredito que apenas Deus é infalível. Tudo que o homem faz esta sujeito a falhas. É o caso da monogamia".

Pois monogamia também é exigência de fé da Igreja de Roma, tão opressiva e castradora como o celibato. Que o diga o sábio rei Salomão, do tálamo de suas setecentas mulheres e trezentas concubinas. Bispos e generais, que por ofício têm de renunciar a um pensamento próprio em obediência a um poder maior, em muito se parecem.

domingo, maio 24, 2009
 
BÍBLIA, MEDICINA E LESBIANISMO


Escreve o leitor Antônio Augusto Silveira Escobar:

Prezado Cristaldo

Tu declaraste, em teu blog, que, na Bíblia, o lesbianismo não é condenado. No entanto, em Rm 1: 26,27 está escrito: "Por isso Deus os entregou a paixões aviltantes: suas mulheres mudaram as relações naturais por relações contra a natureza; igualmente os homens, deixando a relação natural com a mulher, arderam em desejo uns para com os outros, praticando torpezas homens com homens e recebendo em si mesmos a paga da sua aberração".



Meu caro Antônio:

traduzir "relações contra a natureza" por lesbianismo me parece ser um tour de force exagerado. Além disso, é coisa do Paulo que, como se sabe, é bastante perturbado pelas questões sexuais. No Levítico 20:13 lemos: "Se um homem se deitar com outro homem, como se fosse com mulher, ambos terão praticado abominação; certamente serão mortos; o seu sangue será sobre eles". As relações entre mulheres não são evocadas, porque aos olhos dos hebreus só há transgressão sexual quando há penetração.

Ainda no Levítico 20:15: "Se um homem se ajuntar com um animal, certamente será morto;também matareis o animal. Se uma mulher se chegar a algum animal, para ajuntar-se com ele, matarás a mulher e bem assim o animal; certamente serão mortos; o seu sangue será sobre eles". É porque houve penetração. Um dos expoentes do judaísmo rabínico, Maimônides, considera o lesbianismo proibido. Mas não prevê punição alguma para este comportamento, nem mesmo de açoitamento, porque nada existe contra na Torá. Por precaução, aconselha os maridos a vigiar rigorosamente suas mulheres, para que não recebem visitas com tais hábitos. É de supor-se que Rambam, o bom rabino, temesse que as moças descobrissem o bem bom.

A meu ver, nada autoriza interpetrar as "relações contra a natureza" paulinas com lesbianismo. Relações contra a natureza é expressão bem mais abrangente que lesbianismo. Na Suma Teológica, Tomás de Aquino enumera os “vícios contra a natureza”: a masturbação, a bestialidade, o homossexualismo (entendido como conjunção carnal entre duas pessoas do mesmo sexo) e a prática antinatural do coito, mesmo entre pessoas de sexo oposto e inclusive casadas. O Aquinata está falando de sexo oral ou anal. Não visam à reprodução. São, portanto, práticas proibidas.

Aliás, o texto varia de tradução para tradução. Na de João Ferreira de Almeida, por exemplo, lemos: "Pelo que Deus os entregou a paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural no que é contrário à natureza", o que é bem diferente. Considerando-se que Paulo sempre foi um inimigo declarado do prazer carnal, é óbvio que condenaria também as relações entre mulheres. Mas não chegou a falar de torpezas de mulheres com mulheres. Talvez tenha esquecido. O texto é ambíguo e não se pode afirmar com certeza se Paulo se refere ao lesbianismo.

Continua o leitor:

Aproveito o ensejo para contestar, também, as tuas repetidas críticas a respeito de cristãos que procuram ajuda médica de alta qualidade e que atribuem a Deus o sucesso das terapias às quais são submetidos. Em Eclesiástico 38: 1 - 9; 12 -15, está escrito:

"Honra o médico por seus serviços, pois também ele o Senhor criou. Pois é do Altíssimo que vem a cura, como presente que se recebe do rei. A ciência do médico o faz trazer a fronte erguida, ele é admirado pelos grandes. Da terra o Senhor criou os remédios, o homem sensato não os despreza. As águas não foram adoçadas com um lenho para mostrar assim a sua virtude? Ele é quem deu a ciência aos homens, para ser glorificado em suas obras poderosas. Por eles, Ele curou e aliviou, o farmacêutico fez com eles misturas. E assim Suas obras não têm fim, e por Ele o bem-estar se difunde sobre a terra. Filho, não te revoltes na tua doença, mas reza ao Senhor e ele te curará.(...)Depois dá lugar ao médico, porque o Senhor também o criou, não o afastes de ti, porque dele tens necessidade. Há ocasião em que o êxito está entre suas mãos. Pois eles também rezam ao Senhor, para que lhes conceda o favor de um alívio e a cura para salvar-te a vida. O que peca contra o seu Criador, que caia nas mãos do médico".

Segundo a Bíblia de Jerusalém (3.ed., editora Paulus, 2004), esta última frase citada não é uma descortesia em relação aos médicos, e talvez seja necessário adaptá-la desse modo: "Peca diante do seu Criador aquele que quer mostrar-se valente ou soberbo diante do médico".

Grato pela atenção.


Quem agradece é o cronista, Antônio. Quanto aos médicos, duvido que essa gente toda que atribui o sucesso de suas terapias a Deus tenha lido a Bíblia. São milhares, senão milhões, o número de pessoas que consulta médicos e atribui suas curas a uma instância superior. São raríssimos os católicos que sabem da existência do Eclesiástico, como é seu caso. O que tenho visto, no universo que freqüento, são pessoas que atribuem à Bíblia suas idiossincrasias e mesmo concepções contemporâneas de humanismo, afinal Deus não poderia ser o oposto daquilo que hoje se entende como humanismo. Acontece que geralmente o é.

Além do mais, o Eclesiástico é um livro controvertido. Não consta da TaNaK, a Bíblia hebraica. Considerado apócrifo até o século XVI, foi acrescido ao cânone bíblico pelos católicos no Concílio de Trento, com mais dez outros livros. Lutero também o considerava apócrifo e não existe nas bíblias protestantes. Que mais não seja, o vice-presidente José Alencar – o caso que citei na crônica - não pode brandir este texto. Ele é evangélico e os evangélicos, que derivam do protestantismo, não aceitam o Eclesiástico.

Como afirmei, coerência é bom, mas pode matar. José Alencar sabe disso.

 
MENSAGEM DO VINÍCIUS


Janer,

No atual estágio da medicina, a estatística indica que 50% das pessoas
terá algum tipo de câncer durante a vida e 25% morrerá em decorrência
da doença. Depois de 50 anos de idade, a probabilidade de câncer de
próstata é numéricamente igual à idade. Logo, quem chegar aos 100 anos
certamente terá câncer de próstata.

Vinicius Arcaro

sábado, maio 23, 2009
 
CÂNCER: FUMO, ÁLCOOL E PETROBRAS


Não sei se é a idade, não sei se é a época. Mas, de repente, não mais que de repente, me senti cercado de cânceres por todo lado. Do pequeno grupo de seis pessoas que constituímos nos anos 70, em Paris, fui o quarto acometido pela peste. É muita gente para um universo de meia dúzia. Dois partiram, entre estes minha Baixinha. Dois sobreviveram, entres estes este que vos escreve. Mas, para onde quer que me vire, me deparo com a doença. Ouço falar de casos distantes de Aids, cá e lá um enfisema ou cirrose, um de meus amigos tem problemas cardíacos. Nada que me cerque com a insistência do câncer. Outro dia, ao reencontrar um amigo que há tempos não vi, saudei-o:

- Faz um câncer que não nos vemos.

Ele ficou perplexo.

- Quem te contou?

Ninguém me havia contado nada. Eu falava do meu. Ele se referia ao dele, mais precisamente ao de sua companheira. Uma amiga de três décadas vem visitar-me. Mas não vinha exatamente por isso. Vinha para ver o irmão, que acabou morrendo de câncer. Em Porto Alegre, um bom amigo luta como pode para conjurar o mal. Isso sem falar que viveremos sob o signo do câncer nos próximos meses, já que de um câncer dependem as manobras sucessórias para 2010. Um vice com câncer não é tão grave. Vice é vice. Já uma candidata, é diferente. De repente, a eleição do vice se torna mais importante que a do titular.

O número de casos de câncer na cidade de São Paulo aumentou em 25% em cinco anos, diz uma pesquisa feita pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Pelo menos um entre cada 20 casos de câncer é causado pela ação de poluentes. Nestes dias em que se fala de CPI da Petrobras, é bom lembrar que a jóia da coroa não é inocente neste massacre. No suplemento Megacidades, lançado pelo Estado de São Paulo, leio que o diesel produzido pela estatal, que abastece caminhões e ônibus do país, tem altíssimas concentrações de enxofre, elemento cancerígeno. O padrão usado na Europa é de 50 ppm (partes por milhão). No Brasil, as concentrações variam de 500 ppm a 2 mil ppm. A empresa teria se comprometido a produzir o combustível com 50 ppm a partir deste ano. Nada li nos jornais sobre esta nobre intenção. Enquanto isso, na Europa, o teor máximo será reduzido para 10 ppm.

Não é só fumo e álcool que produzem câncer. A Petrobras também faz sua parte. O governador de São Paulo proíbe o cigarro em todos os lugares públicos do Estado. Claro que jamais proibirá o diesel da Petrobras. Ora, do cigarro você consegue fugir. Do diesel, só se mudando para o campo. Confira com seus interlocutores. Difícil encontrar um só que não tenha um caso em família ou em seu círculo. É câncer demais para meu gosto. Fala-se em uma pandemia da gripe suína. A imprensa que me desculpe, mas de meu posto de observação, a pandemia é outra.

Comentei outro dia a profunda incoerência – para não dizer falta de reconhecimento – dos pacientes que são curados por medicina de ponta e atribuem sua cura a Deus. Propus inclusive que os hospitais fizessem duas perguntinhas antes de receber um paciente. Você crê no poder de Deus para curar doenças? Acredita em cirurgia espiritual? Se a resposta for sim a estas duas perguntas, que o crente seja entregue incontinenti a Deus e à cirurgia espiritual. Se Deus cura, pra que hospital e boa medicina? É redundante e só faz sofrer. Se você vai usar de toda nossa ciência para depois atribuir a cura ao Dr. Fritz, então consulte logo o Dr. Fritz e não perca tempo com médicos.

Anteontem ainda, o vice-presidente da República, José Alencar, que vem lutando contra a peste há mais de dez anos, chorou durante um discurso na Universidade Federal de Minas Gerais. "Eu estou aguardando primeiro que Deus me cure, porque, se eu não estiver curado, não posso levar nenhuma proposta ao eleitor", disse à Folha de São Paulo. Nosso vice pede a Deus que o cure. Na hora de extirpar tumores, voa para o Sírio-Libanês. Se curar-se, a quem atribuirá a cura? A Deus, evidentemente. Se morrer, a culpa será do hospital e de seus médicos. Mas não era disto que pretendia falar. E sim de coerência.

 
DANIEL NA COVA DOS NEMENHAH


Em meio a isso, encontro crentes coerentes nas páginas internacionais. Mais precisamente, nos Estados Unidos. Trata-se de Colleen Hauser, cujo filho, Daniel, 13 anos, tem linfoma de Hodgkin. O menino poderia ser curado com quimioterapia, mas a família pertence a um grupo religioso chamado Nemenhah, que acredita em terapias “naturais” praticadas por índios e recusou o tratamento quimioterápico. Um juiz mandou prender Colleen e hoje mãe e filho estão foragidos e são procurados pelas autoridades de vários Estados.

Colleen Hauser e Daniel teriam deixado sua casa em New Ulm, no Estado de Minnesota, na segunda-feira, pouco após uma consulta médica na qual exames indicavam que o tumor estava crescendo. A doença, diagnosticada em janeiro, é considerada curável com quimioterapia e radiação, mas Daniel abandonou o tratamento após a primeira sessão. É o que leio nos jornais.

A isto se chama coerência. Nada de crer em terapias naturais e ao mesmo tempo buscar tecnologia de ponta. Um juiz decretou a prisão dos pais de Daniel e ordenou que o menino seja colocado sob a tutela do Estado. O pai da criança criticou as autoridades. "Não sei porque eles provocaram esta situação. Por que eles pensam que têm direitos sobre meu filho?"

Boa pergunta, em um país em que os Testemunhas de Jeová se recusam a qualquer transfusão de sangue, mesmo que corram risco de vida. Afinal, está escrito em Atos 15:28,29: “Com efeito, parecem bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor outro peso além do seguinte indispensável: que vos abstenhais das carnes sacrificadas aos ídolos, do sangue, da carne sufocada e da impureza. Dessas coisas fareis bem de vos guardar conscienciosamente”.

Segundo a advogada Fabiana Costa Lima de Sá, para precaver-se contra cirurgias com sangue, os crentes carregam um cartão intitulado “Documento Para Uso Médico”, renovado anualmente e assinado pela portador e testemunhas, com freqüência, parentes próximos, que hoje é considerado documento legal. A maioria deles também assina um termo de responsabilidade que isenta os hospitais e médicos de qualquer responsabilidade civil ao proverem o solicitado tratamento sem sangue. Foram criadas Comissões De Ligação com Hospitais, com o fim de amparar as Testemunhas na sua determinação de não aceitar infusões de sangue e firmar um espírito de cooperação entre pacientes e instituições médicas, que mantém contato, só no Brasil, com quase 1.300 médicos. No mundo todo, existem 40 mil médicos dispostos a tratar e operar Testemunhas de Jeová sem sangue.

Entre nós, esta postura encontra abrigo no artigo 46 do Código de Ética Médica: “(É vedado ao médico) efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e o consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal, salvo em iminente risco de vida”. Com uma ressalva, a do artigo 56: “(É vedado ao médico) desrespeitar o direito do paciente de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo e, caso de iminente risco de vida”.

Ocorre que os Testemunhas são mais de sete milhões no mundo todo, e só nos Estados Unidos há mais de meio milhão deles. Quanto aos crentes em Nemenhah, parecem não constituir massa crítica suficiente para produzir legislação. Se os pais de Daniel conseguirem fugir à ordem judicial de prisão, é claro que Daniel vai morrer. Se forem presos e Daniel for submetido ao devido tratamento, poderá salvar-se. Mas terá sido desrespeitada a liberdade de crença de seus pais. Pelo menos em um país que dá mais valor a crenças religiosas que à vida de um ser humano.

Na Bíblia, mesmo jogado na cova dos leões, Daniel foi salvo: “O meu Deus enviou o seu anjo, e fechou a boca dos leões, e eles não me fizeram mal algum; porque foi achada em mim inocência diante dele; e também diante de ti, ó rei, não tenho cometido delito algum”. Foram então jogados na cova os homens que haviam acusado Daniel, suas mulheres e seus filhos, e foram destroçados pelos leões.

Na cova dos Nemenhah, Daniel não tem chance alguma. Coerência é bom. Mas também mata. Nosso vice sabe disso.

sexta-feira, maio 22, 2009
 
MUSEU DA CORRUPÇÃO


Só uma memória enciclopédica seria capaz de abarcar o panorama da corrupção no Brasil, dadas suas dimensões e ramificações. Está na hora de surgir uma compilação geral dos desmandos do governo, partidos e empresas, uma espécie de dicionário, para a consulta de leitores perdidos nos meandros do pantanal.

Enquanto este dicionário não surge, almas abnegadas fizeram um esforço de síntese. De minha sobrinha dileta, recebo este mapinha:

http://www.dcomercio.com.br/especiais/2009/museu/index.htm

Vale uma visita. Divulgue-o, para que bem se entenda o país.

 
Crônica antiga:
MEUS DOIS TURCOS


(29/6/2001)


Em meus vinte e poucos anos, eu julgava que o bem-estar europeu era fruto de trabalho exclusivo dos europeus. Em Estocolmo, quando meus professores de sueco me perguntaram em que diska eu trabalhava, achei que havia um mal-entendido. Tinha eu cara de diskare (lavador de pratos)? Já nas primeiras semanas de Suécia, entendi que era visto não como um jornalista que estava lá para observar a vida no paraíso, e sim como mão-de-obra potencial. Observei meus colegas de curso: polacos, gregos, iugoslavos, turcos, árabes. Todos estavam ali tentando adquirir um conhecimento mínimo do idioma ... para trabalhar. Quanto a mim, que buscava apenas conhecer um idioma e um país novo, me sentia peixe fora d'água naquelas aulas. Quando descobri que dificilmente teria chances de trabalhar em minha área, fiz minhas malas... e voltei.

Quando alguém me fala que mobilidade social não existe no Brasil, costumo puxar da memória dois turcos de minha infância. Aconteceu há mais de quarenta anos, quando eu ainda vivia nos campos de Upamaruty. Eles chegaram de Dom Pedrito, cidade que eu ainda não conhecia, aliás não conhecia cidade nenhuma. Vinham em duas precárias bicicletas, enfrentando estradas de areia e barro, os porta-cargas repletos de espelhos, pentes, isqueiros, carretéis, agulhas, alfinetes, baralhos. Uma orgia de consumo para aqueles camponeses, separados da cidade por léguas de solidão. As mulheres da região recebiam os turcos com festa, eram as coisas da cidade que chegavam até seus modestos desejos. Ainda piá, eu os observava com espanto. Entre si, usavam uma algaravia incompreensível. Conosco, falavam com sotaque carregado. Hospitalidade oblige, sempre encontravam pernoite e comida em nosso rancho. À noite, me ensinavam, com o auxílio de grãos de feijão e milho, mistérios da matemática. Se mal se conseguiam fazer entender com palavras, eram exímios nesta linguagem universal, a dos números.

Os dois turcos voltaram muitas vezes em suas bicicletas àqueles pagos inóspitos. Até o dia em que chegaram de jipe, desta vez com tecidos, colchas, cobertores, toalhas e utensílios de cozinha, uma orgia aos olhos do mulherio lá da campanha. Voltaram muitas outras vezes, até o dia em que não voltaram mais. Quando fui conhecer cidade, encontrei-os em Dom Pedrito. Descobri então que sequer eram turcos, mas sírios. Tinham uma loja de tecidos, com três ou quatro funcionários. Quando abandonei a cidade, já tinham duas lojas e o dobro de funcionários. Bem mais tarde, quando me dei conta do que significava ser sírio, meus dois turcos me voltaram à lembrança. Haja pertinácia para sair de longínquos desertos das Arábias, atravessar um oceano, viver em país novo, outra língua, cultura distinta, e enfrentá-lo com duas bicicletas e algumas bugigangas de mascate no cargueiro.

Nasci entre gente pobre, que trabalhava na lavoura de sol a sol, fazendo uma agricultura de mão pra boca. Não tenho notícias de que alguém tenha prosperado como os dois "turcos" de minha infância. Claro que nenhum brasileiro de cepa se disporia a sair pedalando pampa afora, como os sírios, para juntar algum pecúlio de centavo em centavo.

Na Suécia, reencontrei os turcos — estes turcos de verdade — mais árabes, eslavos e mesmo latinos, encarregando-se do trabalho pesado ou sujo, que os hiperbóreos Svensons não se dignavam a enfrentar. Fui reencontrá-los mais tarde em Paris, nas mesmas tarefas. Certa noite, voltando para o Grand Hotel Saint Michel, aquele conhecido hotelzinho da folclórica madame Salvage, que abrigou brasileiros e latinos durante décadas e de grand só tinha o nome, tive surpresa insólita. Pedi minha chave ao porteiro da noite. Do catre instalado na portaria ergueu-se uma calva ilustre, inconfundível, a solene calva de um de meus professores de filosofia em Porto Alegre. Para ele, naquele momento, era melhor ser porteiro de hotel em Paris que catedrático no Brasil.

Destas andanças, algo aprendi sobre eles: imigrantes não se enganam. Só rumam rumo ao melhor. Um árabe que quebra pedras ou junta lixo em Berlim ou Estocolmo, vive evidentemente melhor que em sua villaya na Argélia. E ainda manda algum dinheiro aos que ficaram no deserto. Na época em que Giscard d'Estaing ofereceu passagem e mais dez mil francos aos migrantes que quisessem voltar a seus países, Slimane, um amigo argelino, me dizia: "Não volto. Podem me dar a França inteira. Não posso levá-la no bolso".

Imigrantes são seres diferenciados. Ousam deixar para trás pátria, família, passado, em busca de um futuro melhor. Nestes dias que correm, há pessoas morrendo no mar ou sufocadas em furgões, tentando entrar clandestinamente na Europa, via Itália, Espanha ou Inglaterra. Mas não vemos hoje — nem vimos em dias passados — alguém arriscando a vida para entrar em Angola, Cuba, Congo ou países da finada União Soviética.

O Brasil pode ser pesado de carregar-se às costas. Pessoalmente, nunca encontrei motivos para orgulhar-me deste país. Mas horrível também não é. Estes seres que não se enganam, os imigrantes, vêm para cá de todos os continentes, e inclusive do nosso. Isto atesta que o país é viável. Os italianos e alemães que um dia chegaram de mãos abanando no Brasil, construíram as cidades mais prósperas do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Japoneses e coreanos que aportam nesta São Paulo vão muito bem. O mesmo diga-se de árabes e judeus.

Você conhece nome e sobrenome de algum mendigo? Eu não. Deles só tomo conhecimento nos meses de inverno, quando repórteres saem a entrevistar moradores de ruas. Só tenho lido sobrenomes como Vieira, Soares, Santos, Silva, Silveira e por aí afora. Jamais ouvi falar de algum mendigo chamado Isaac ou Jacó, Abdul ou Tanako, Gert ou Salvatore.

Assim, quando intelectuais de classe média afirmam que este nosso sistema capitalista — que aliás nem chegou ao capitalismo — não dá chances a ninguém, costumo evocar meus dois turcos. Trabalhando, dá. Estendendo a mão para pedir, não dá.

 
APEDEUTA DA VEJA CRITICA
O APEDEUTA DO PLANALTO



Considero que maior desserviço não pode prestar um jornalista ao país do que fazer acusações falsas ou indevidas a Lula ou ao PT. Isto dá oportunidade aos petistas para posar como vítimas e desacreditar a imprensa. Pior ainda, com razão. Foi o que fez ontem o recórter tucanopapista serrista hidrófobo em seu blog na Veja. Em Istambul, Lula andou dizendo que no Brasil todo vendedor de roupa ou de qualquer outro produto que passe casa por casa é conhecido como "turco". Ainda tentou explicar:

- Qualquer vendedor que for vender um produto na casa das pessoas, prontamente ele é chamado de turco. Eu não sei se é o turco nascido em Istambul ou no tempo do Império Otomano, nascido na Arábia Saudita ou no Líbano.

Com sua antiética forma de fazer jornalismo, que consiste em reproduzir textos de outros jornais e apor um outro título, geralmente raivoso, escreve o apedeuta da Abril:

Num dia clássico, Apedeuta mistura turco com árabe — na Turquia!!! — e diz outra formidável batatada

Após transcrever um texto de Jamil Chade, do Estadão, comenta o recórter tucanopapista serrista hidrófobo:

Já comentei aqui outras vezes que Lula aprende pelo método indígena: com as orelhas. É notavelmente inteligente, mas espantosamente ignorante. E olhe que não lhe faltou tempo para aprender. Mas tem uma indisposição com a leitura conhecida e reconhecida. Ele deve pensar: “Para quê? Esse gente toda leu bastante é agora é minha subordinada”. É, faz sentido... É por isso que, suponho, Celso Amorim também tenha parado de ler.

O apedeuta de Veja crítica Lula por um de seus raros acertos. No interior do país, os mascates árabes sempre foram chamados de turcos. Assim como os imigrantes italianos, no Rio Grande do Sul, são chamados de gringos. Houve uma imprecisão, é verdade, na afirmação do apedeuta do Planalto. Eram chamados de turcos os sírios e libaneses, jamais os sauditas. Diga-se de passagem, não me consta que sauditas viessem mascatear no Brasil.

Se é polido ou diplomático fazer esta alusão pejorativa junto aos anfitriões turcos, isto é outro assunto. Mas condenar Lula quando Lula, por acaso, acerta, é demonstrar ignorância ainda maior que a de Lula.

 
DITO E FEITO


Escrevia ontem que, para a imprensa nossa, traficante é sempre suposto traficante. Não deu outra. Hoje, no portal Terra, leio:

STF APROVA EXTRADIÇÃO DE SUPOSTO TRAFICANTE AOS EUA

O Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou a extradição do suposto narcotraficante colombiano Pablo Joaquín Rayo Montaño aos Estados Unidos. Ele é acusado pelo governo americano de conspiração para o tráfico internacional de drogas e para a lavagem de ativos, mas a decisão do STF autorizou a extradição para que Montaño responda apenas pelo primeiro crime. (...) Os magistrados do STF destacaram que para que Montaño seja entregue ao governo americano, os Estados Unidos devem se comprometer a não condená-lo a mais de 30 anos de prisão, pena máxima prevista na legislação brasileira.

O suposto narcotraficante foi detido no dia 16 de maio de 2006 em São Paulo, como parte da operação Oceanos Gêmeos, coordenada por Estados Unidos e com a participação de Brasil, Panamá, Colômbia, Costa Rica, Venezuela, Equador e México.


O homem está preso há três anos por tráfico internacional de drogas, foi detido em uma operação coordenada por oito países e arrisca a ser condenado a mais de 30 anos de prisão nos Estados Unidos. Para os jornalistas, continua sendo um “suposto traficante”.

quinta-feira, maio 21, 2009
 
SOBRE SUPOSTOS E ASPAS


Você deve ter notado, Aender, que o “suposto” é mais usado nas páginas nacionais e locais. É uma atitude de auto-defesa não só do jornalista como também do jornal. Assim, se alguém escreve sobre “as contas de Maluf no Exterior”, está arriscando a ser processado por calúnia. Prefere então “as supostas contas de Maluf”. O adjetivo é uma prudente salvaguarda para evitar processos por parte de um suspeito ou indiciado em qualquer crime.

Já no noticiário internacional, onde o risco de processo é igual a zero, é recurso utilizado para preservar antigas crenças do redator. Ou para não ferir ideologias mortas e sepultadas. Nos dias em que trabalhei no Estadão, eu li - juro que li -, esta manchete:

SUPOSTOS TERRORISTAS EXPLODEM CARRO-BOMBA NO PERU

Uma ressalva é sempre oportuna. Poderia ocorrer que o carro-bomba tivesse sido montado por uma equipe de carmelitas descalças. Perguntei ao redator: supostos terroristas, companheiro? Ele releu o texto e justificou: força de hábito. Claro que ninguém vai grafar "suposto nazista". Quando se trata de nazistas, não há aspas nem supostos.

O cachimbo entorta a boca. De tanto usar a palavrinha, ela virou cacoete. Hoje, os jornalistas a grafam quase automaticamente. Se um traficante da favela é morto enfrentando a polícia com um AK-47 em punho, provavelmente teremos uma manchete como

POLÍCIA MATA SUPOSTO TRAFICANTE NA FAVELA

Enquanto não for condenado pela justiça como traficante, um traficante armado com um AK-47 será sempre um suposto traficante. Fica entendido, é claro, que um traficante jamais matará um suposto policial. O suposto é mais um dos subterfúgios do politicamente correto. Serve para inocentar, ainda que provisoriamente, os “excluidos”. Outro sinal de tráfego são as aspas. Têm múltiplas funções. Servem geralmente para marcar uma citação. Mas também para deixar clara a posição do editor. Os acontecimentos pós-queda do Muro geraram uma intensa batalha de aspas nas redações.

Certa vez, na Folha de S. Paulo, recebi um despacho que falava dos crimes do comunismo durante o regime dos Ceaucescu, na Romênia. Traduzi o texto, coloquei-o no bom tamanho e dei meu trabalho por feito. Dia seguinte, lá estava a notícia. Mas falava de "crimes" do comunismo. Com crimes entre aspas, para deixar bem claro que a redação não assumia a idéia de que comunistas pudessem cometer crimes.

Trabalhei mais tarde no Estadão. Um belo dia, recebo um telefonema de um colega da Folha:

— Janer, aquela nota sobre a Finlândia, foste tu que a redigiste, não foi?
De fato, fora eu. Mas como é que ele sabia?
— Pelas aspas. No texto se falava em "política de neutralidade", assim entre aspas. Só podiam ser tuas.

Me senti lisonjeado. Já era reconhecido até pelas aspas. Estas, na época, eu as assumia serenamente.

 
MENSAGEM DO AENDER


Kháire, ô Janer!

O seu texto me lembrou duas citações, lá vão:

"O pobre inteligente é um observador bem mais fino que o rico
inteligente. O pobre olha em redor, a cada passo; examina,
desconfiado, cada palavra das pessoas que vai encontrando; cada passo
que ele próprio dá impõe a seu espírito e a seu coração uma tarefa, um
dever. Tem o ouvido fino, é impressionável, experiente, leva
queimaduras na alma..." Knut Hamsum, Fome.

"290. A ignorância só degrada a pessoa quando é acompanhada de
riqueza. O pobre é limitado por sua pobreza e por suas necessidades;
no seu caso o trabalho substitui o saber e ocupa seus pensamentos. Por
outro lado, os ricos que são ignorantes vivem apenas para seus
prazeres e se parecem ao gado, como podemos notar diariamente. Isto é
ainda mais censurável porque não usaram a riqueza e o ócio para aquilo
que lhes empresta o mais alto valor." Schopenhauer.

Interessante ler esse texto. Hoje estava aqui nas minhas elucubrações
tentando imaginar um mundo onde o modelo greco-romano não tivesse
chegado ao esgotamento, dando brecha ao cristianismo, e tendo chegado
até hoje. Que mundo seria esse? Talvez menos doentio e mais realista,
mas como vamos saber...

Outra coisa, você que é jornalista poderia comentar, se é que ainda
não comentou, a respeito da palavra-muleta "suposto". Tudo em jornal
hoje é suposto, nada se afirma. Com certeza para se evitar processos.
Hoje estava ouvindo a BandNews e a repórter carioca disse que
"supostos" traficantes haviam sequestrado um ônibus. Supostos
traficantes poderiam até ser, mas que com certeza eram bandidos, eram.
Mas, do jeito que andam as coisas, até se ela fosse usar o vocábulo
bandido, a muleta do suposto estaria lá para escorá-lo. Daqui há pouco
frases como 'o corredor teve uma suposta lesão a nível de joelho
e não vai estar correndo na próxima maratona' serão supostamente (rs)
a nova realidade da língua.

Aender dos Santos