¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sexta-feira, setembro 25, 2009
 
COMIDAS NATURALES


Pois, meu caro Augusto,

há uma evidente conspiração internacional contra a carne vermelha. Pelo jeito, vem do Norte e pretende condenar o Sul. Quase todas as restrições à carne vermelha, pelo que leio, têm suas fontes nos Estados Unidos. Logo aquele país em que metade ou mais da metade da população é obesa ou tem sobrepeso, de tanto beber refrigerantes ou comer em Mcdonalds.

Pero no pasarán.

Não tenho nada contra vegetarianos, até já convivi com alguns deles. Lembro que, nos tempos de universidade em Porto Alegre, uma menina conseguiu levar-me a um restaurante herbívoro. Comi umas gororobas esquisitas. Se não me falha a memória, cada bocado tinha de ser mastigado quarenta vezes. Em torno a mim, comensais esquálidos e pálidos ruminavam lentamente aqueles pastos, quais bois no campo, enquanto ela me fazia uma preleção sobre comida ying e comida yang. Fiz alguma piada sobre o assunto e quase levei um prato em pleno rosto, agora não lembro se de ying ou se de yang. A moça optara pelo budismo e considerava um crime comer subprodutos de seres vivos. Saí de lá faminto. Fui direto ao Chalé da Praça XV e me regalei com um suculento filé.

Vez que outra, surge uma vegetariana em minha vida. Falo assim no feminino, porque em geral são mulheres. Varões, somos mais omnívoros. A solução é buscar um restaurante italiano, onde além de carnes há pastas e pizzas. As restrições a alimentos de modo geral têm origens religiosas. Judeus e muçulmanos, por exemplo, se proíbem da carne suína. Tant pis pour eux! Jamais conhecerão as delícias de um cochinillo. Os judeus vão mais longe. Não comem nem mesmo frutos do mar. Das carnes bovinas, não comem a picanha.

E por quê? Porque lá no Gênesis, Jacó lutou contra um homem – ou contra um anjo, segundo algumas versões, ou contra o próprio Deus segundo outras – e seu adversário, ao ver que não prevalecia contra ele, tocou-lhe a juntura da coxa, e se deslocou a juntura da coxa de Jacó. “Por isso os filhos de Israel não comem até o dia de hoje o nervo do quadril, que está sobre a juntura da coxa, porquanto o homem tocou a juntura da coxa de Jacó no nervo do quadril”.

Quanto aos vermelhos, eles até podem detestar os produtores rurais. Está no DNA dos comunistas abominar o capital. Mas não desdenham a bona-chira. Já contei mas conto de novo. Em meus dias de Paris, eu tinha um amigo gaúcho, médico cheio da grana e comunista, que seguidamente passava por lá. Chamava-se Walter Simm e já morreu. Convidava-me para restaurantes caros nos quais, na condição de estudante, eu não tinha muito como ir. Que não me inquietasse, ele pagava tudo. Degustamos gigots e filés, steaks tartar e boeufs bourguignons, sem preocupação nenhuma com o efeito estufa. Naqueles dias, ainda não fora descoberto o novo apocalipse. Assim, foi graças a um defensor incondicional do proletariado que conheci a mais sofisticada cozinha francesa. A meu ver, como bom militante devotado à causa, ele pesquisava qual seria a cozinha ideal à qual um dia os affamés de la terre teriam acesso. Se você quiser conhecer os melhores restaurantes do mundo, consulte um comunista.

O que me espanta em tudo isto, repito, é ver uma secretaria de município assumir uma filosofia oriental e propor aos munícipes uma dieta vegetariana. Isso é impor princípios religiosos em um país que se pretende laico. Minha restrição a tal medida não é pessoal. Eu até que gosto de comidas naturais. Em meus dias de Madri, freqüentei muito um restaurante chamado Comidas Naturales. Lá tudo era natural, tanto o boi como o porco ou o cordeiro.

Nada contra.