¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sábado, junho 12, 2010
 
BOLÍVIA QUER TORNAR
OFICIAL JUSTIÇA PARALELA



Tenho comentado, ao longo destas crônicas, a tendência cada vez mais em moda em nossos dias, a de criar diferentes legislações para os cidadãos pertencentes a um mesmo Estado. No Brasil, negro vale por dois brancos em vestibular, índio pode estuprar, espancar mulheres e matar crianças, desmatar e exportar mogno, o MST pode invadir propriedades e próprios federais, demolir laboratórios e culturas transgênicas. Se um outro cidadão que não pertence a estas tribos fizer o mesmo, cai sobre ele todo o rigor da lei.

Na Europa, os muçulmanos reivindicam o direito a práticas que na Europa constituem crime, como a ablação do clitóris e a poligamia. Na Alemanha, citando o Corão, a juíza Christa Datz-Winter, de Frankfurt, negou o pedido de divórcio feito por uma mulher muçulmana que se queixava da violência do marido. A juíza declarou que os dois vieram de um "ambiente cultural marroquino em que não é incomum um homem exercer um direito de castigo corporal sobre sua esposa". Se um alemão bate em sua mulher, estão estabelecidas as condições para o divórcio e para a punição do marido. Muçulmano pode bater à vontade.

Costumo afirmar que quando em um Estado há duas ou mais legislações, então há dois ou mais Estados. Falei em “tendência cada vez mais em moda em nossos dias”. Me corrijo. Isto não vem de nossos dias. Há dois mil anos, uma seita de fanáticos já tinha a mesma pretensão.

Celso, nobre romano, autor de Discurso Verídico, que foi queimado pela Igreja e do qual só temos notícia pela contestação de Orígenes em Contra Celso, em sua época já acusava os cristãos de rebeldes contra a ordem estabelecida. Se se negavam a participar na vida pública e civil, isto equivalia a estabelecer um Estado dentro do Estado, com normas e costumes próprios, mas distintos dos do Império. Se se contentassem em anunciar um deus novo, isto pouco importava aos romanos. Mais deuses, menos deuses, tanto faz como tanto fez. Ocorre que se empenhavam em denegrir os deuses do país que os acolhia.

Leio no El País que a Bolívia é o primeiro país na América Latina a oficializar a nova moda. Evo Morales anunciou ontem que pretende assinar uma nova lei reconhecendo a validade da “justiça indígena e comunitária”, com a qual se justifica uma série de linchamentos no país. A última vítima da tal de justiça foi Santiago Flores, um cidadão de 51 anos, lapidado na última segunda-feira em Jununa, a 620 quilômetros de La Paz, acusado de violação.

Santiago foi enterrado boca abaixo, segundo os costumes indígenas, para impedir que seu ajayu (alma ou espírito) moleste os habitantes da comunidade, agora sob pacto de silêncio. Segundo o jornal espanhol, não se trata de um caso isolado. Há uma semana, na mesma província de Potosí, um grupo de indígenas entregou às famílias os corpos de quatro policiais que investigavam o contrabando na região. Os índios era os responsáveis pelo linchamento e entregaram os cadáveres amparando-se nas normas de sua jurisdição e com a condição de não serem denunciados pelo crime.

Nesta “justiça” não há recursos. Se um jilakata (autoridade indígena) emite uma sentença, que é verbal, as partes ou vítimas não podem recorrer a outra instância. Não existem cifras precisas, mas em 2007 foram registrados 57 casos de linchamento. Segundo Evo Morales, os índios têm uma cultura de vida, não de morte. (Estranha cultura de vida!) O governo defende a oficialização da justiça paralela. “A justiça ordinária já tem normas, mas a comunitária não. Os irmãos das comunidades têm de trabalhar uma proposta, convertê-la em lei e aprová-la no Congresso”, disse o deputado Isaac Ávalos, do Movimiento al Socialismo (MAS).

Se a moda pega no continente, maus dias nos esperam pela frente. Verdade que no Brasil índio já pode estuprar, ter relações com crianças de 10 ou 11 anos e matar (inclusive os próprios filhos) impunemente, com o beneplácito dos tais de indigenistas e com a cumplicidade do Estado de direito. Negro em vestibular vale por dois brancos e os tais de sem-terra podem invadir propriedades à vontade.

Só nos falta oficializar a justiça paralela.