¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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segunda-feira, dezembro 06, 2010
 
SÃO PAULO QUER LEGALIZAR
PROFISSÃO DE ASSALTANTE



Há dois ou três dias falei da vocação deste país nosso para a criação de profissões inúteis. O Brasil é um dos raros países que conheço onde existem ascensoristas. Como se quem usa um elevador fosse incapaz de apertar um botão. Onde existem também cobradores nos ônibus. Pior ainda: quando se introduziram catracas nos ônibus de São Paulo, os sindicatos protestaram e mantiveram os cobradores. Hoje, você tem catracas e mais um cobrador, que olha você colocar seu tíquete na catraca. Ou aproveita seu ócio para dormir.

Em setembro passado, comentei que, por R$ 51 mensais, um sindicato em São Paulo oferece "segurança jurídica", uniformes, cadastro e registro profissional em carteira de trabalho para flanelinhas da capital. No vácuo da ausência de regras municipais, a entidade, que abriu as portas ao público em agosto, tem como respaldo uma lei federal de 1975. A promessa é de que o associado nunca será preso se apresentar o registro de "guardador e lavador de veículos automotores".

Ou seja: a extorsão está legalizada em São Paulo. Por 51 reais, está garantido a qualquer vagabundo extorquir seu dinheiro. Caso você não pague, terá o carro riscado ou os pneus furados. São ameaças que não me atingem. Não tenho carro, nunca tive. Primeiro porque não gosto de carro. Segundo, porque com carro não se vai longe. Um outro motivo são os flanelinhas. Às vezes, de carona com algum amigo, somos atacados por um desses extortores. Minha vontade é de enfiar-lhe uma bala na testa. Ainda bem que tampouco tenho revólver.

Se um sindicato dava suporte legal à extorsão, agora é a Prefeitura de São Paulo e a Polícia Militar que planejam legalizar de vez a extorsão. Com o pretexto de fazer um projeto piloto para combater flanelinhas ilegais que atuam na cidade, pretende-se agora legalizar o assalto perpetrado por marginais contra qualquer pessoa que tenha carro. Cadastramento na Secretaria Municipal do Trabalho, uso de uniformes oficiais e fiscalização específica por agentes das subprefeituras, PM e Guarda Civil Metropolitana são algumas das ações cogitadas no plano. As possibilidades foram discutidas no dia 25 do mês passado, em reunião com o Ministério Público Estadual (MPE).

O local onde o projeto será testado - um "ponto crítico" de atuação de flanelinhas - deve ser definido ainda neste mês. Os pontos cogitados até aqui são áreas conhecidas pela presença de "guardadores de carros" na cidade: vias próximas da Rua 25 de Março, no centro, arredores do Anhembi, na zona norte, e o Estádio do Pacaembu, na zona oeste. Nesses locais, aponta o MPE, são cobrados entre R$ 5 e R$ 20 para deixar o carro na rua. Em julho, o MPE instaurou inquérito exigindo enfrentamento do problema por prefeitura e PM.

Flanelinha é assaltante. Que país é este em que se regulamenta a profissão de assaltante? Onde há um sindicato de assaltantes? Não tenho carro. Mas me indigno pelos que têm. Você paga à Prefeitura para estacionar e além disso tem de pagar ao vagabundo para não ter o carro danificado. A lei confere ao assaltante o direito de assaltar. Pior que tudo, os proprietários de carros aceitam passivamente a extorsão, como se assaltar fosse direito líquido e certo de quem quer que se habilite ao ofício.

Se sem uniforme os marginais já achacavam os proprietários de veículos, imagine agora com a autoridade que confere um uniforme. Há alguns anos, em Curitiba, se pretendeu regulamentar a profissão de mendigo. Cada pedinte teria uma carteirinha que lhe daria direito a esmolar. Creio que a brilhante idéia não vingou. O sindicato que dá suporte legal aos assaltantes estima que a capital tenha 15 mil flanelinhas.

No que depender da Prefeitura, nos próximos dias teremos 15 mil marginais com o direito de assaltar garantido por lei.