¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sábado, abril 30, 2011
 
SOBRE ERNESTO SÁBATO (I)

(entrevista concedida à professora Inês Skrepetz)



Inês Skrepetz - Você acha que Ernesto Sábato é um intelectual humanista? Por quê?

Janer Cristaldo - Todo intelectual sempre se pretende um humanista. Tanto os marxistas cuja filosofia massacrou cem milhões de pessoas em busca do homem novo e da sociedade justa, quanto os nazistas que mataram outros tantos em nome da pureza racial. Sábato começou sua vida como militante comunista. Certamente se considerava um humanista naqueles dias. E certamente continuou se considerando humanista quando percebeu seu equívoco e passou a criticar o comunismo.

IS - O que você entende por humanismo no século XXI?

JC - Humanismo é uma palavra-ônibus, que transporta um monte de significados. Tentando cercar a palavrinha, peço auxílio a Ferrater Mora. Resumindo: a palavra foi usada a primeira vez em 1808, em alemão (Humanismus), pelo educador bávaro F. J. Niethammer, que entendia o conceito como a tendência a destacar a importância do estudo das línguas e dos autores clássicos. A palavrinha migrou para a Itália (umanista) para designar os professores das chamadas “humanidades”. Humanista era um homem ligado às artes liberais, ou seja, história, poesia, retórica, gramática e filosofia moral.

Na época atual, segundo Mora, fala-se de humanismo para designar também certas tendências filosóficas, especialmente aquelas nas quais se põe em relevo algum “ideal humano”. Como os ideais humanos são muitos, proliferaram os humanismos. Teríamos assim um “humanismo integral” (Maritain), um humanismo liberal, um humanismo existencialista, um humanismo científico e várias outras derivações. Algumas tendências humanistas priorizam a noção de “persona”, em oposição a idéia de indivíduo. Outras se caracterizam pela noção de sociedade aberta, em oposição à sociedade fechada. Outras, por destacar o caráter social do ser humano. Outras, por colocar em destaque que o homem não se reduz a uma função determinada, senão que é uma totalidade.

Afirmar que Sábato é um intelectual humanista, não é incorreto. Mas não quer dizer grande coisa.

IS - Na obra A Resistência, escrita em 2000 (p.100), Sábato faz uma reflexão crítica ao humanismo. Estaria ele negando ou buscando formular um novo conceito de humanismo?

JC - Deste caso específico não poderia falar. É o único livro dele que não li. De qualquer forma, como todo escritor, mais dia menos dia teria de abordar o assunto. Em entrevista que me concedeu nos anos 70, Sábato dizia que Marx foi um dos que mais lutou com seus livros contra a escravidão no mundo capitalista, especialmente na Inglaterra vitoriana com a qual conviveu, e tem partes filosoficamente de valor. “Também devemos reconhecer, frente ao homem abstrato de Hegel, alheio à terra e ao sangue, a frase de Marx : ‘O homem não é um ser abstrato, fora do mundo: é o mundo dos homens, do Estado, da sociedade’. Sua consciência é uma consciência social, enunciando assim um novo humanismo frente às enteléquias iluministas e racionalistas tipo Voltaire”.

Se Sábato rompeu com o comunismo, sempre lhe resta uma certa nostalgia do marxismo. Em Três Aproximações à Literatura de nosso Tempo, escreve: “Marx enuncia os princípios de um novo humanismo: o homem pode conquistar sua condição de "homem total" levantando-se contra a sociedade mercantil que o utiliza. Ele, como Camus, descendentes de Pascal, exerceram este mesmo humanismo áspero, essa mesma repugnância pelo engano e o auto-engano, para auscultar o homem conturbado pela grande crise de nosso tempo”.


Em Homens e Engrenagens, repele o antigo conceito de humanismo: “No momento em que o humanismo se extasia com a antigüidade, no momento em que faz de seu culto um jogo cortesão e refinado, torna-se conservador e reacionário: técnicos como Leonardo, os homens que melhor representam o espírito da modernidade, verão como charlatães esses senhores que passavam o dia discutindo na Academia, esses pedantes que haviam voltado as costas à linguagem popular para entregar-se à vã ressurreição do latim, esses presunçosos que haviam deixado de chamar-se Fortiguerra ou Wolfgang Schenk para converter-se, grandiosamente, em Carteromachus e Lupambulus Ganimedes. Desta forma, o humanismo passa do tema da liberdade ao tema do dogma, ao dogma da antigüidade. E da revolução passou à reação”.

IS - Qual a relação de Sábato com o existencialismo?

JC - Diria que nenhuma. O existencialismo é uma corrente filosófica e Sábato, embora discuta filosofia, nunca se pretendeu filósofo nem aderiu a qualquer doutrina. Mas há muito em Sábato, particularmente em Informe sobre cegos, de um movimento artístico do início do século, o surrealismo, influência de seu convívio com Oscar Domínguez e André Breton em Paris. Em Homens e Engrenagens, confessa: "Ali, em 1938, soube que minha fugaz passagem pela ciência havia terminado. Embora o doutor Jekill ainda medisse a radiatividade do actínio durante o dia, Hyde vagava noturno e solitário pelas ruas de Paris, ou começava a escrever as páginas de um romance catártico ou se revolcava na pura irracionalidade, promovendo escândalos com os pintores surrealistas. Como compreendi então o valor moral do surrealismo, sua força destrutiva contra os mitos de uma civilização finda, seu fogo purificador, mesmo apesar de todos os farsantes que se aproveitavam de seu nome!"

Mas, escritor atento a seu tempo, também se preocupou com o existencialismo. É ainda em Homens e Engrenagens que escreve: “Tanto que naquelas cidades nórdicas, formadas em torno das fortalezas feudais, o surgimento da nova civilização iria se realizar com atributos mais bárbaros e modernos, em cidades essencialmente mercantis, com as mais típicas características do capitalismo moderno. Mas ao mesmo tempo, paradoxalmente em aparência, seriam o berço das reações mais violentas contra a nova civilização: o romantismo e o existencialismo”.

Volta ao assunto em Três Aproximações: “O existencialismo, e em geral o romantismo, é a revolta dos elementos femininos da humanidade”.

IS - Para Sábato, seria o existencialismo um humanismo, como defendido na obra de Sartre?

JC - Estou hoje distante da obra de Sábato, em todo caso não lembro de ter lido nenhuma declaração sua neste sentido. Verdade que em "Sartre contra Sartre ou a missão transcendente do romance", um dos ensaios das Três Aproximações, o ensaísta argentino vai dedicar seu tempo a esmiuçar o pensamento sartriano. Mas sua preocupação não é o humanismo, e sim o fato de que, em abril de 1964 Sartre renegou sua obra de ficção, afirmando que um romance como A Náusea não tem sentido algum quando em alguma parte do mundo há uma criança morrendo de fome.

Sábato indigna-se com tal postura: “É quase inimaginável que um pensador do porte de Sartre tenha chegado a pronunciar por convicção teórica tal precariedade. E como em alguém de sua honradez intelectual é impossível a demagogia, não resta senão a hipótese sobre a oculta (e para ele culposa) antinomia que existe entre sua visão filosófica e sua militância política. Senão, como explicar de outro modo que um intelecto como o seu não observe que esta tese conduziria não só ao repúdio de um romance metafísico como também à extirpação da arte, da ciência pura e da filosofia em sua totalidade? De que modo pode salvar uma criança, nem tanto a música de Bach mas a teoria de Einstein ou a fenomenologia de Husserl? A aplicação conseqüente do critério sartriano nos obrigaria a renunciar às mais altas atividades do espírito para combater apenas por ideais políticos”.


Quanto ao existencialismo sartriano, Sábato é cheio de dedos. Escreve em Heterodoxia:

“O homem só tem fé no racional e abstrato, e por isso se refugia nos grandes sistemas científicos ou filosóficos; de maneira que quando este Sistema vem abaixo - como mais cedo ou mais tarde acontece - sente-se perdido, cético e suicida. A mulher confia no irracional, no mágico, e por isso dificilmente perde a fé, porque o mundo jamais pode revelar-se mais absurdo do que ela o intuiu pela primeira vez. o credo quia absurdum é feminino, como toda a filosofia existencialista (embora seja feita por homens; por homens, bem entendido, fortemente propensos à feminilidade). Racionalizar o universo e Deus é empresa tipicamente masculina, loucura própria de homens. Por esta razão, não creio no existencialismo de Sartre. Sua chave mais profunda deve ser buscada em seu primeiro romance, em sua náusea ante o contingente e gelatinoso, em sua propensão viril pelo nítido, matemático, limpo e racional. Sua obra filosófica é o desenvolvimento conceitual desta obsessão subconsciente. Este desenvolvimento leva fatalmente a uma filosofia racionalista e platônica”.

Ainda no mesmo livro: “Como a criança teme a escuridão, o homem teme o Caos Universal. (...) Uma vez lá, no refúgio de alta montanha, acabamos por almejar a vida, não obstante ou mesmo por sua sujidade e sua desordem, e assim voltamos do pensamento puro à vida e ao romance. O existencialismo é uma volta ao perigo e não se deve estranhar que suas palavras mais usuais sejam vertigem e angústia”.

Tampouco acredita na sistematização do existencialismo: “Jaspers precedeu Heidegger, Marcel precedeu Sartre. Mas não se acredita senão no sistemático. Por outro lado, sistematizar o existencialismo é tão espantoso como codificar o surrealismo, da maneira como Breton o fez, inaugurando essa espécie de Academia dos Bons Costumes no Inferno”.

 
SOBRE ERNESTO SÁBATO (II)

(entrevista concedida à professora Inês Skrepetz)



IS - Quem é Sábato para Janer Cristaldo?

JC - Foi um bom acontecimento em minha vida. Em Buenos Aires, certo dia, comprei Sobre Héroes y Tumbas. Fui a um bar, creio que na Lavalle com Suipacha, para um "trago largo". Abro o livro e me deparo com a nota policial que abre o livro: um crime e um suicídio ocorridos em circunstâncias misteriosas, frutos aparentemente de um gesto de loucura. Mas certas inferências conduziam a uma hipótese mais tenebrosa, em virtude de um estranho "Informe sobre Ciegos" que Fernando Vidal Olmos havia concluído na noite de sua morte.

Não interrompi mais a leitura. Mais ainda, comprei todos os demais livros do autor. Passei aqueles dias todos em Buenos Aires, mergulhado na leitura de Sábato. E ainda mais: comprei outros exemplares de cada livro para presentear amigos.

Em Abbadón, el Exterminador, encontrei esta mensagem jogada ao mar, dirigidas a "un querido y remoto muchacho".

"Te desanimás porque no sé quién te dijo no sé qué. Pero ese amigo o conocido (que palabra más falaz!) está demasiado cerca para juzgarte, se siente inclinado a pensar que porque comés como el es tu igual; o, ya que te niega, de alguna manera es superior a vos. Es una tentación comprensible: si uno come con un hombre que escaló el Himalaya, observando con suficiencia como toma el cuchillo, uno incurre en la tentación de considerarse su igual o superior, olvidando (tratando de olvidar) que lo que está en juego para ese juício es el Himalaya, no la comida. Y por eso tan pocas veces el creador es reconocido por sus contemporáneos: lo hace casi siempre la posteridad, o al menos esa espécie de posteridad contemporánea que es el extranjero. La gente que está lejos. La que no ve cómo tomás el café o te vestis”.

Isso foi em 75. Na época, eu andava um tanto desbussolado. Estava pensando em isolar-me do mundo e cheguei a fazer concurso para trabalhar em um farol na costa brasileira. Escrevia, mas sem muita convicção. Escrevi a Sábato, pedindo permissão para traduzir aquele capítulo de Abbadón. Enviei-lhe junto um artigo que escrevi sobre a descoberta de sua obra. Não tinha muita esperança de resposta. Para minha surpresa, uma semana depois, daquele homem que eu imaginava encerrado em algum hospício, com camisa-de-força, recebi uma afável carta.

Santos Lugares, 1 de agosto de 1975

Mil gracias, querido y generoso Cristaldo, por su hermosa carta, por sus buenos deseos, por todo. Y además por su artículo en el diário.

Espero que en próxima correspondência me envie algo de lo que escribe, aunque, lamentablemente, mi conocimiento del português es muy precário: puedo leer con pleno sentido un ensayo, pero difícilmente uma obra narrativa, en que el lenguaje es mucho más rico y sutil.

Lo que recomendo su amigo argentino (“Deixe de pesquisar Sábato e pesquise seu próprio interior”) es válido en algun sentido, no en outro. Entiéndame que no hablo de mi obra, pues podría ser la obra de todos los escritores que sobre usted han tenido y tienen influencia: el conocimiento de uno mismo pasa por el conocimiento de los demás, y particularmente por el de los seres que han ahondado en la condición del hombre; esa es la dialéctica existencial que nos rige y que Kierkegaard expresó diciendo, más o menos: “Más ahondamos em nuestro corazón, mas ahondamos em el corazón de los otros”. Y reciprocamente, cabría agregar. En lo su amigo tiene plena razón es que no debe limitarse a un autor.

Sí, mi obra no es conocida en Brasil. Pues la edición de EL TUNEL está agotada y no se reedito jamás. Y HEROES salió en Portugal. De la edición brasilera nada sé, pues parezco condenado por alguna maldición. Fuera de lo sobrenatural, hay algo muy simple: no pertenezco a ninguna logia o máfia literária, vivo en un rincón del mundo y no tengo um agente literario como la senõra Carmen Balcells, que promueve casi militarmente las obras del grupo de Cortázar, Fuentes, V. Llosa y G. Márquez.

Qué le puedo hacer, así es mi destino. Hace tiempo que me he resignado a este destino de soledad, al queyo mismo me he condenado por mi independencia política e por mi resistência a apoyar movimientos de moda, tanto en lo político como en lo literário. Si relee la “carta a un remoto joven” lo comprenderá.

Si usted puede hacer algo para que esa misteriosa editorial brasilera Artenova acelere la edición de HÉROES, le quedaré muy agradecido. Em cuanto a lo que me propone com EL ESCRITOR Y SUS FANTASMAS, le mandaré pronto las pruebas de galera de uma edición totalmente rehecha, que es la que será traducida en algunos países europeus. Mientras tanto, te envio un librito mío como pequeño testimonio de profundo reconocimiento y de afectuosa amistad.

E. Sábato


Fiquei perplexo com a atenção que o escritor me concedia. Ao que tudo indicava, o homem não estava em camisa-de-força. Daí decorreu uma longa amizade, encontros em Santos Lugares, Buenos Aires, Paris e São Paulo. E uma correspondência de meia centena de cartas, de parte a parte. Quando me candidatei a uma bolsa em Paris, decidi que estudaria sua obra. Antes de partir, como tomava um navio em Buenos Aires, fui visitá-lo.

 
SOBRE ERNESTO SÁBATO (III)

(entrevista concedida à professora Inês Skrepetz)



O convite de traduzir toda sua obra ocorreu quando estava em Paris. Comecei com Sobre Héroes y Tumbas, retraduzi El Túnel e avancei por Abbadón e seus ensaios. Traduzir um autor complexo como Sábato - pelo menos que diz respeito à sua ficção – é sempre um desafio. Para mim era uma forma de unir o útil ao agradável. Se pretendia desenvolver uma tese sobre o argentino, a tradução me obrigava a lê-lo vírgula a vírgula.

A tradução de Sábato no Brasil teve muitos percalços. Os direitos autorais estiveram em mãos de pelo menos duas editoras, sem que nada fosse publicado. Sábato acabou assinando contrato com a Francisco Alves, do Rio e convidou-me para traduzi-lo. Eu estava terminando a tradução de Héroes, quando o professor Deonísio da Silva, da UFSCAR, me envia uma nota do Jornal do Brasil, que dizia este livro já estar em fase de impressão. Comuniquei-me com Sábato. Sua resposta:

11 de setiembre
Mi querido Cristaldo:

La condición que puse a Editora Alves es que se empleará su traducción o ninguna outra. Estoy esperando ahora la respuesta, pero sin duda será así. Estaremos en Paris desde el 1º de noviembre hasta el 10, em el Hotel d’Isly. Um abrazo muy fuerte y cariñoso para los dos,

E. Sábato


Sei lá que intrigas ocorreram, mas foram conjuradas. Meu orientador jamais ouvira falar nem do autor nem de sua obra. Depois de minha tese, escreveu um livro sobre Sábato e saiu a fazer palestras sobre ele na Europa. Ou seja, contribui um pouco para a educação de meu professor e para uma maior difusão de Sábato no velho continente.

Que representa hoje Sábato para mim? Foi uma boa experiência conhecê-lo, foi um belo desafio traduzi-lo. Foi um interlocutor fascinante e muito me honra ter merecido sua amizade.

IS - Dentro da sua autoridade como tradutor de Sábato, como você compreende a produção literária deste autor, tão marcada pelos seus romances e, no entanto, que produziu muito mais ensaios e críticas do que propriamente Literatura?

JC – É um dos mais importantes escritores latino-americanos, que por muito tempo foi sabotado pelas esquerdas, por ter ousado denunciar o comunismo. Houve época em que, ao falar-se em literatura latino-americana, dizia-se: Borges, Cortázar, Garcia Márquez, Vargas Llosa, etc. E só. Cheguei um dia a perguntar a Sábato se não estava escrevendo com o pseudônimo de Etc.

Tendo escrito apenas três ficções em sua vida, conseguiu um grande momento na ficção latino-americana, com Sobre Hérois y Tumbas. Mas cometeu um grave equívoco em Abbadón, ao fazer o hagiológio de um dos mais frios assassinos do continente, seu conterrâneo Ernesto Che Guevara. Pelo jeito foi uma recidiva de seus dias de marxismo. Em minha tese sobre Sábato e Camus, Mensageiros das Fúrias, dediquei um capítulo a esta parte do livro. Na época, eu considerava que um escritor, uma vez que toma um personagem histórico como personagem, tem todo direito de pintá-lo a seu modo. Hoje, não penso assim. Embarquei no equívoco do outro Ernesto.

Sábato nasceu em 1911, seis anos antes da Revolução de 17, que se pretendia a redenção da humanidade. Em sua juventude, não se tinha conhecimento dos crimes de Lênin e muito menos, mais tarde, dos crimes de Stalin. Estes só começaram a ser conhecidos em meados dos anos 30. Ora, em 1930, Sábato participava ativamente do Partido Comunista argentino.

Em 1934, começam suas discordâncias políticas e filosóficas com o marxismo, o que faz com que os dirigentes do partido o enviem às Escolas Leninistas de Moscou, mas antes deve participar do Congresso contra o Fascismo e a Guerra, em Bruxelas, presidido por Henri Barbusse. Encontra-se com dirigentes do mundo todo e confirma suas suspeitas, que culminam com o começo dos "processos" de Moscou. Decide fugir do congresso e vai para Paris, onde passa o inverno de 34-35 na clandestinidade e na miséria. Rompe com o Partido, que abandona lá por 35 ou 36, por ocasião das primeiras purgas de Stalin. Foi quando desceram do barco Camus, Koestler, Gide, Ignazio Silone, Louis Fischer, Stephen Spender, Richard Wright. Desde então, Sábato tem sido um crítico feroz dos regimes totalitários socialistas.

Foi um homem que viveu as contradições do século que percorreu desde o início. Foi honesto quando passou a militar no Partido e mais ainda quando o abandonou. Sua ruptura: "Enojado com a escravidão moral, intelectual e física que o stalinismo impunha, consciente do divórcio que provocava entre a realidade de nosso país e o regime soviético e, enfim, tendo tomado consciência de que muito pouco restava da teoria marxista na escolástica que se injetava na Rússia, inclusive com tortura e morte, acabei por deixar o movimento pelo qual havia abandonado família, estudos e segurança. Nos quase quarenta anos então transcorridos, jamais reneguei os ideais de justiça social e de liberação nacional, como creio ter provado através de minhas atitudes públicas".

É escritor que não morre. Sobre Héroes é definitivamente um clássico da literatura do continente.

sexta-feira, abril 29, 2011
 
SIC TRANSIT GLORIA MUNDI


Se há algo que não entendo no mundo, é o culto a personagens míticas. Por exemplo, as bodas reais na Inglaterra. Que fizeram de importante na vida o príncipe William e a Kate Middleton para atraírem a atenção de dois bilhões de pessoas no mundo, que é o número estimado de telespectadores do enlace? Um nasceu príncipe e ela, plebéia, foi a eleita do príncipe. E daí? O culto a eles prestado pelas multidões em nada difere ao culto um dia prestado a Hitler ou Stalin, Mao ou Kim Il Sung, Beatles ou Bono Vox.

Ou melhor, talvez entenda. Estes espécimes foram muito bem definidos no século passado por um judeu da Ucrânia. É o Kleinen Mann, de Wilhelm Reich. Ou o Zé Ninguém, como foi traduzido em português: “O homem pequeno é aquele que não reconhece sua pequenez e teme reconhecê-la; que procura mascarar a sua tacanhez e estreiteza de vistas com ilusões de força e grandeza, força e grandezas alheias. Que se orgulha de seus grandes generais mas não de si próprio. Que admira as idéias que não teve, mas jamais as que teve. Que acredita mais arraigadamente nas coisas que menos entende, e que não acredita no que quer que lhe pareça fácil de assimilar”.

Daí a acreditar no papa, em Hitler ou Stalin, basta um pequeno passo. Estas gentes, eu as conheço desde minha adolescência. Continua Reich: “Tu mesmo te desprezas, Zé Ninguém. Dizes: ‘quem sou eu para ter opinião própria, para decidir sobre minha própria vida e ter o mundo como meu?’ E tens razão: quem és tu para reclamar direitos sobre tua vida? Deixa-me dizer-te.

“Diferes dos grandes homens que verdadeiramente o são apenas num ponto: todo grande homem foi um dia um Zé Ninguém que desenvolveu apenas uma outra qualidade: a de reconhecer as áreas em que havia limitações e estreiteza em seu modo de pensar e agir. O grande homem é pois aquele que reconhece quando e em que é pequeno”.

Mas Reich falava do grande homem. Que grandeza tem o principito? Se tem alguma, desconhecemos. Ao que tudo indica, a época anda carente de contos de fada, com príncipes e cinderelas, carruagens e castelos. Só falta o dragão. Dragão tem pouco prestígio nos dias que correm. Milhares de pessoas estão acampando nas proximidades da Abadia de Westminster para esperar a passagem dos noivos. Até parecem os panacas que em São Paulo acamparam junto ao Morumbi para ver um apologista das drogas e um sonegador do imposto de renda, o McCartney e o Bono Vox.

Não tenho apreço nenhum por esses personagens construídos pela mídia. Sim, porque é a mídia quem os constrói. Os jornalistas os criam e depois passam a prestar-lhes culto, como se algum valor tivessem. Para que serve um rei? Pelo que sei, para receber colegas e posar para cartões postais. Não por acaso, a imprensa – a mesma que os alimenta – criou a expressão “rainha da Inglaterra”, para definir a condição de um político que ocupa um alto cargo mas não dispõe de poder algum.

Gilles Lapouge, o correspondente do Estadão em Paris, tenta uma resposta ao enigma, em sua coluna de ontem: “A questão é a seguinte. Por que ato de prestidigitação essa monarquia, que não serve para absolutamente nada, continua a fascinar? Lembremos que o rei tem três funções apenas: ele outorga honrarias, nomeia o primeiro-ministro que o Parlamento lhe diz para nomear e dissolve, nas mesmas condições, o Parlamento.

“A essa pergunta, podemos dar respostas racionais. "Esse sistema assegura a permanência de uma classe dominante competente, unida pelos laços de família, de geração em geração", disse Edmund Burke, no século 17".

Será que assegura? Os franceses guilhotinaram seus reizinhos e a França, hoje, bem ou mal, é dirigida por uma classe dominante competente. Verdade que, ao visitarmos os castelos da realeza francesa, as guias turísticas a ela se referem com um ar nostálgico. Suponho que os franceses, diante da pompa toda de Londres, a cada vez que ocorrem tais bodas, sintam-se profundamente arrependidos de terem cortado a cabeça de seus reis.

Já estive perto de rainhas e príncipes. Mas por acaso, quase sem saber. Faz uns bons vinte anos, talvez trinta. Eu estava em Madri, no hotel Inglés, na Calle Del Viejo Idiota. Ou seja, na Calle de Echegaray. José Echegaray, personagem polêmico de fins do século XIX, era engenheiro, matemático, dramaturgo, político... e recebeu o prêmio Nobel de Literatura em 1904. Valle-Inclán, escritor galego que vivia na mesma rua, dava como endereço Calle del Viejo Idiota. E consta que mesmo grafando assim o endereço, recebia correspondência.

Já contei, mas o caso é pertinente. Na Calle del Viejo Idiota há um restaurante que nada tem demais, a não ser ser simpático. É o La Cacerola. Antes de las doce del medio-día, você paga apenas o que come. O que bebe é brinde. Como em viagens não sou de acordar cedo e considero que dez horas é um momento indelicado para tomar café, começo com alguns pinchos regados a cerveja ou vinho. Naquele dia havia uma excitação inusual no boteco. Uma velhota saía e voltava a toda hora para limpar as vitrines pelo lado de fora. Era a cozinheira do Cacerola. Eu ainda não havia lido os jornais, não imaginava o que me esperava.

Lá pelas tantas, a faxineira entra aos pulos na sala, gritando: “yo lo he visto. El principito. Y me hacía así”. E fez o sinal de quem acenava. Só então me dei conta que estava presenciando um momento histórico e não sabia. Saí do bar e olhei para a Carrera de San Jerónimo, que corta a Calle del Viejo Idiota. Um aparato colossal de segurança, que se estendia do Palácio Real até o Paseo del Prado, tomava conta das ruas e telhados.

Era o juramento do príncipe Filipe às Cortes Espanholas. Junto com o príncipe vinham rei, rainha e as infantas, mais um corpo de cavalaria mais ajaezado que um toureiro com seu traje de luces. A cozinheira ganhou seu dia naquela manhã. Deve ter passado meses e meses feliz, sentindo-se íntima do principito.

Estranho o poder dos donos do mundo. Quantas pessoas Filipito terá feito feliz, com um simples olhar dirigido à Calle del Viejo Idiota?

Abril de 1980 foi um mês pródigo para tropeçar em personalidades. No dia 16, eu bebericava uma cerveja e lia no Select, no Boulevard du Montparnasse. Lá pelas tantas, um burburinho perpassou o café e muita gente foi para a rua. É que passava na esquina, rumo ao cemitério Montparnasse, um ilustre cadáver, o de Sartre. Certamente, o mais famoso e equivocado pensador do século passado. Nem retirei meus olhos do livro. Podia estar passando ali o cadáver de De Gaulle, não me diria nada.

No dia 30 do mesmo abril, estive na coroação da rainha Beatrix, na Holanda. Também por acaso. Era feriadão na França e levei duas amigas parisienses para conhecer Amsterdã. Não havia uma mísera vaga nos hotéis. A menos que buscássemos um a pelo menos cem quilômetros de distância. Decidimos dormir no carro, à beira de um canal. Acordei cheio de pelos com um cachorro me lambendo a barba. Da Beatrix, só tenho uma lembrança. Atrapalhou meus dias de Amsterdã.

Ah! E também já vi o papa. No caso, o João Paulo II, que domingo que vem competirá postumamente com as bodas de Londres. Será o dia de sua beatificação. Quem deve estar vibrando, lá no Além, é o sacerdote mexicano Marcial Maciel, o fundador dos Legionários de Cristo, morto em 2008.

Acusado de abusar sexualmente de mais de 20 seminaristas - incluindo os próprios filhos - Maciel teve filhos com várias mulheres e, como um outro santo moderno, o Martin Luther King, foi plagiador emérito: plagiou descaradamente o livro de cabeceira da legião, intitulado Saltério de Meus Dias, e impôs a toda a organização um quarto voto de silêncio para se proteger de denúncias. Um de seus antigos colaboradores o acusa inclusive de ter envenenado seu tio-avô, o bispo Guízar, que apoiou a bem-sucedida carreira eclesiástica do sobrinho no México dos anos 1930.

Deste santo senhor, temos fartas fotos sendo abençoado pelo papa João Paulo II, recebido em audiência especial no Vaticano. Centenas de denúncias sobre o padre Maciel chegaram à mesa de Wojtyla. O papa as desprezou. Maciel enchia praças e estádios de futebol em suas viagens pelo mundo. Era merecedor da benção papal. Não é todos os dias que um pedófilo priva com um papa. Daqui a dois dias, um milhão de pessoas estará homenageando o santo homem que abençoou um criminoso.

Mas falava que vi Sua Santidade. Eu passeava às margens do Tibre, quando ouvi uma voz tronituante que vinha dos céus. Pensei ser o próprio Cara. Mas falava em italiano. Como era de supor-se que Jeová falasse hebraico, conclui que devia ser seu vice. Era. Uma multidão de carolas o ouvia na Piazza San Pietro.

Em suma, se coincidi num mesmo ponto geográfico com essas sumidades, foi por mero acaso. Sou um pouco como Julien Sorel, o personagem de Stendhal, que estava na batalha de Waterloo e não tinha idéia precisa do que acontecia ali.

Não tenho preocupação alguma com o tal de sucesso. Sucesso é uma soma de equívocos. Mas guardo ternas lembranças dos bons momentos que passei com anônimos amigos e namoradas, em singelos botecos da vida.

quinta-feira, abril 28, 2011
 
Meus poemas diletos:
ORACIÓN


* Serafin J. Garcia

Tata Dios: yo no dudo que siás juerte;
que gobernés vos solo tierra y cielo;
que a tu mandao se apague'l rejucilo
y se amanse'l más potro de los vientos.

No dudo que haygas hecho esas estreyas
que sirven de candiles a los sueños,
y p'aliviar el luto de las noches
priendas la luna en su reboso negro.

No dudo que siás vos el que le puso
al colmiyo'e la víbora el veneno;
el que afiló las uñas de los tigres
y le dio juersa'l pico de los cuervos...

Pero dudo'e tu amor y tu justicia,
pues si juera verdá que sos tan güeno
no te hubieras yevao aqueya vida
qu'era pa mí más grande que tu cielo.

Vos sabés, Tata Dios, cómo la quise.
Eya jué'l sol que amaneció en mi pecho.
Por eya tuvo primavera mi alma
y echaron alas mis mejores sueños.

Eya era linda como las mañanas
cuando dispiertan yenas de gorjeos;
alegre como el ruido'e las colmenas;
graciosa como el'unco'e los esteros.

¡Y era tan güena, Tata Dios!... ¡Tan güena!
Nunca un rencor se cubijó en su pecho.
Pa tuitos tuvo corasón sin trancas
rebosao de ternuras y de afetos.

Y creyó siempre'n vos: tuitas las noches
s'endulsaba en su boca el Padre Nuestro,
mientras su almita'e pájaro aletiaba
ofertándose entera en cada reso.

¡Y tuviste coraje pa matarla!
¿No pensaste que yo tamién juí güeno,
que no meresco este dolor que sangra
la herida siempre viva'e su ricuerdo!

¿Cómo no viá dudar de tu justicia?
¿Cómo viá crer que tengas sentimiento
si vos, provalecido de tu juersa,
nos quitás siempre lo que más queremos?

¿Pa qué nos diste corasón, entonce'?
¿Pa qué nos esigís que siamos güenos,
si nos encariñás con este mundo
y en él ponés nomás que sufrimientos?

¿Cres que consuela tu promesa'e gloria?
Si aquí and'hemos nacido, ande queremos,
nos negás el derecho'e ser dichosos,
¡no sé pa qué nos va'servir tu cielo!

* Poeta uruguaio nascido no 5 de junho de 1905, en Cañada Grande, Departamento de Treinta y Tres. Publicou "Tacuruses" (1936), "En carne viva" (1937), "Tierra Amarga" (1938), "Burbujas" (1940), "Barro y Sol" (1941), "Asfalto" (1944), "Raíz y Ala" (1949), "Romance de Dionisio Díaz" (1949), "Las Aventuras de Juan el Zorro" (1950), "Agua Mansa" (1952) y "Flechillas" (1957).

Apesar da temática gauchesca e da proximidade geográfica, J. Garcia é praticamente desconhecido no Rio Grande do Sul. Enquanto os cetegistas vivem falando em “patrão grande da Querência Eterna”, o poeta uruguaio, em seu singelo linguajar de homem do campo, faz uma profunda reflexão que tem preocupado os teólogos desde que o deus único passou a existir.

quarta-feira, abril 27, 2011
 
SENADOR FRÁGIL E INDEFESO SOFRE
BULLYING DE JORNALISTA MALVADO



Da França, recebo de Roberto Veiga:

Olá, Janer,

bullying pra mim é no ambiente escolar o equivalente do que costuma ser chamado de assédio moral no ambiente profissional. Concordo que seja meio estúpido criminalizar o bullying (na verdade, é demagógico), já que nem menor estuprador e assassino é punido nesse país, mas discordo quando você desdenha disso, como se fosse algo que não traz maiores conseqüências para a vida da vítima e que por isso não mereça a atenção dispensada. Bullying não se resume a desentendimentos (comuns e inevitáveis) entre crianças e adolescentes em situações isoladas, com troca de insultos e safanões que no dia seguinte já se esquece.

Caracteriza-se, muito pelo contrário, por uma pessoa (a vítima) sendo constantemente assediada e geralmente por toda uma "galera" (os agressores). Passar a infância e a adolescência, época de formação da personalidade, sendo perseguido e humilhado, dia após dia, por outras crianças e adolescentes tem sim sua gravidade. Se o bullying gera ou não malucos como o do Realengo, isso pra mim é o de menos. Defendo o direito que uma pessoa tem, ainda mais uma criança ou adolescente num ambiente como o escolar onde ela esta pra ser cuidada, de não sofrer esse tipo de abuso. E isso implica a punição, também no ambiente da escola (suspensão, no limite mesmo expulsão), daqueles que o cometem.


Em termos, Roberto. De fato, não faz bem a uma pessoa, em sua infância ou adolescência, ser perseguida e humilhada, dia após dia, por seus colegas. Mas ninguém é perseguido dia após dia. Apenas de vez em quando. De qualquer forma, são situações que passam e nada justifica que, depois de adulto, o fulano massacre dez ou vinte crianças. É o que está sendo feito no caso do débil mental do Realengo. Já li defesas entusiastas do celerado e artigos considerando que devemos entendê-lo e perdoá-lo. É uma tendência contemporânea das esquerdas. Nenhum criminoso é culpado. São pobres vítimas desta sociedade malvada.

Que uma escola tome providências para afastar um aluno que não se adapta ao convívio com seus colegas é algo que me parece razoável. Daí a mobilizar a máquina da justiça e pedir um a quatro anos de reclusão para quem molesta seus colegas, como pretendem os promotores da Infância e Juventude de São Paulo, me parece exagero. Sem falar que é medida inócua. O tal de bullying geralmente ocorre entre adolescentes. Alguém já viu adolescente ir para a cadeia neste país? Adolescente tem carteirinha de 007, que confere direito a matar.

Se o assassino fluminense tivesse menos de 18 anos, seria condenado no máximo a três anos de internação. Sua liberação seria compulsória aos 21 anos. Seria punido com um aninho de prisão por cada três cadáveres. Em que planeta vivem estes senhores do Ministério Público, que pedem quatro anos de reclusão por pendengas de adolescentes?

Vamos adiante. Trote de calouros não é bullying? Não é humilhação submeter vestibulandos a banhos de lama, ovos quebrados no rosto e gracinhas outras. Isso quando não gera mortes, como já aconteceu em São Paulo. Em 99, o estudante Edison Tsung Chi Hsueh, brasileiro filho de imigrantes, ao entrar na Faculdade de Medicina da prestigiosa USP, foi jogado em uma piscina. Edison não sabia nadar e no dia seguinte seu cadáver foi encontrado no fundo da piscina. Dos duzentos veteranos presentes ao trote, ninguém sabia de nada, ninguém viu nada. Os assassinos, hoje membros da elite brasileira, permanecem até hoje impunes.

Há dois anos, causou alguma repercussão na imprensa o trote aos calouros da faculdade de agronomia da UnB. De acordo com a agência de notícias da universidade, os novos alunos - já sujos de tinta, ovos, farinha e vinagre - tiveram que escorregar por uma poça de água no corredor do Minhocão. Estudantes sem camisa eram incentivados a escorregar de barriga no chão molhado. Em outra brincadeira, os calouros lambiam leite condensado de uma lingüiça encapada com um preservativo.

Num curral improvisado nos fundos da universidade, os estudantes participaram ainda de uma gincana. A prova seria rodar ao redor de um cabo de vassoura com a testa em uma das extremidades até ficarem tontos para depois pularem em uma piscina de lama com pedaços de vegetais, legumes, folhas, galhos e lixo.

Isso não seria bullying? Ou bullying só é bullying quando ocorre no ensino médio? Os trotes universitários são bem mais violentos e humilhantes que o eventual assédio sofrido nos colégios. Com a agravante de que são praticados por universitários que se dirigem a cargos de responsabilidade na sociedade. Algum promotor pedirá quatro anos de reclusão para os futuros componentes da elite nacional?

A imprecisão do bullying é tamanha que o governo catarinense, ao legislar sobre o assunto, não conseguiu traduzir a palavra. Pela primeira vez na legislação brasileira temos um crime com nome ianque. Não vejo nada demais no fato de que as pessoas usem expressões inglesas ou francesas para designar produtos do mercado ou componentes da informática. Mas fica feio para quem legisla definir um crime tipificado em nossos códigos com nome estrangeiro.

Tão imprecisa é a definição de bullying, que o senador Roberto Requião a ela recorreu ao tomar o gravador de um jornalista. Ao ser interrogado sobre a pensão que recebe como ex-governador do Paraná, o senador não teve dúvidas. Avançou para cima do repórter e confiscou seu instrumento de trabalho. Que depois foi devolvido, com a gravação devidamente deletada.

“Acho que é um momento correto para resolvermos esse problema e acabarmos com o abuso, com esse verdadeiro bullying que sofremos, nós, os brasileiros, parlamentares ou não, nas mãos de uma imprensa, muitas vezes, absolutamente provocadora e irresponsável”, disse Requião ontem, em discurso no Senado.

Coitadinho do senador! E nós que pensávamos que só adolescentes eram vítimas de bullying. Neste país, nem nossos humildes e indefesos senadores estão a salvo da sanha de jornalistas truculentos e malvados e de suas perguntas inconvenientes.

terça-feira, abril 26, 2011
 
PROMOTORES PRETENDEM
PROIBIR A ADOLESCÊNCIA



Depois do massacre do Realengo, bullying é palavrinha que tomou conta dos jornais. É mais um desses conceitos ianques, tipo bipolaridade, que são importados por jornalista aculturados sem maiores reflexões. Tanto que a palavrinha até agora não conseguiu ser traduzida pelos jornais. Já há quem pense em tipificar um novo crime no Código Penal. Se é bom para os Estados Unidos, deve bom para nós.

No fundo, o eterno desejo das esquerdas, de condenar a sociedade por qualquer crime e isentar o indivíduo de qualquer responsabilidade. O maluco que fuzilou doze crianças no Rio não é um criminoso. Mas uma vítima. O coitadinho sofreu bullying na escola. Normal que saísse a matar crianças.

O tal de bullying está previsto na legislação de vários Estados americanos, desde Washingotn ao Delaware, passando pela Florida e Massachussets. É definido ora como agressão física a estudantes, funcionários da escola, ora como destruição da propriedade física, ora como a prática de qualquer expressão, gesto ou padrão de comportamento físico ou verbal com a intenção clara de causar abalo físico ou emocional aos estudantes na área das escolas públicas e nas suas adjacências.

No Brasil, curiosamente, a assembléia catarinense e o poder executivo instituíram um programa de combate ao bullying, sem sequer se preocupar em traduzir a palavra importada. Diz o governador do Estado, através da lei nº 14.651, de 12 de janeiro de 2009:

Art. 1º Fica o Poder Executivo autorizado a instituir o Programa de Combate ao Bullying, de ação interdisciplinar e de participação comunitária, nas escolas públicas e privadas, no Estado de Santa Catarina.

Parágrafo único. Entende-se por bullying atitudes agressivas, intencionais e repetitivas, adotadas por um indivíduo (bully) ou grupo de indivíduos contra outro(s), sem motivação evidente, causando dor, angústia e sofrimento e, executadas em uma relação desigual de poder, o que possibilita a vitimização.

Art. 2º O bullying pode ser evidenciado através de atitudes de intimidação, humilhação e discriminação, entre as quais:

I - insultos pessoais;
II - apelidos pejorativos;
III - ataques físicos;
IV - grafitagens depreciativas;
V - expressões ameaçadoras e preconceituosas;
VI - isolamento social;
VII - ameaças; e
VIII - pilhérias.

Art. 3º O bullying pode ser classificado de acordo com as ações praticadas:

I - verbal: apelidar, xingar, insultar;
II - moral: difamar, disseminar rumores, caluniar;
III - sexual: assediar, induzir e/ou abusar;
IV - psicológico: ignorar, excluir, perseguir, amedrontar, aterrorizar, intimidar, dominar, tiranizar, chantagear e manipular;
V - material: destroçar, estragar, furtar, roubar os pertences;
VI - físico: empurrar, socar, chutar, beliscar, bater; e
VII - virtual: divulgar imagens, criar comunidades, enviar mensagens, invadir a privacidade.

Ou seja, a santa e bela Catarina está criminalizando, em nome de uma moda importada, atitudes normais de adolescentes. Está querendo criminalizar o insulto, expressão espontânea e inócua de quem sente raiva, os apelidos – que em geral são pejorativos –, as grafitagens, que deveriam ser tipificadas em danos ao patrimônio, as ameaças, que são normais na vida de qualquer adolescente e em geral resultam em nada. E por aí afora. Desde quando é crime empurrar, socar, chutar, beliscar, bater? Desde quando pilhéria é crime? Isto faz parte da adolescência. Ou pretende alguém proibir as piadas? Há só um item na lei catarinense que mereceria uma atenção especial, o assédio sexual. Mas isto já está tipificado em lei, a de número 10224, de 15 de maio de 2001.

Prudentemente, a lei estúpida não prevê punições. Ora, se não há punição, tanto faz como tanto fez. Leio na Folha de São Paulo que promotores da Infância e Juventude de São Paulo querem que o bullying seja considerado crime. Um anteprojeto de lei elaborado pelo grupo prevê pena mínima de um a quatro anos de reclusão, além de multa. Se a prática for violenta, grave, reiterada e cometida por adolescente, o autor poderá ser internado na Fundação Casa, a antiga Febem.

Segundo o promotor Mario Augusto Bruno Neto, “hoje, como não há tipificação legal específica, os casos que chegam são enquadrados geralmente como injúria ou lesão corporal”. Ora, se já estão tipificados, para que criar um crime novo? Só para imitar a legislação americana?

Para efeitos de raciocínio – e apenas para isso – vou assumir o conceito ianque. Se bullying fosse fator criminógeno, algum massacre eu já teria cometido. Tive vários apelidos em minha adolescência, e apelido é o mais evidente sinal de humilhação. Na escolinha rural onde estudei, era chamado de Porongo. Por que, não sei. Certa vez, uma coleguinha me lançou o epíteto. Irritado, joguei nela uma pedra negra, dessas pesadas. Minha intenção era manifestar desagrado. Não é que a puta da pedra descreveu uma parábola e foi cair justo na cabeça dela? Abriu uma boa brecha e uma baita briga entre famílias.

Dona Clotilde teve de exercer seus dotes de diplomata para evitar uma chacina. Para dar uma idéia da moça que eu havia machucado, ela foi mais tarde exímia domadora de potros. Mas nunca mais alguém me chamou de Porongo. Uma vez na cidade, já no ginásio, os apelidados se multiplicaram. Como cheguei de bombachas, passei a ser o “grosso da campanha”. Me adaptei à coisa e não mais reagi violentamente.

Quer dizer, nem tanto. Havia em minha classe uma charrua linda, a Luludi, com olhos negros imensos, nos quais eu gostava de me afogar. Certo dia, quando eu mergulhava naqueles mares profundos, padre Lourenço van der Raadt, um oblato holandês que ensinava inglês, me flagrou em flagrante mergulho:

- Janer, vá para o fundo da classe.

Só por olhar para os olhos de uma menina! Seria isso crime? Um primo dela, enciumado, certa vez me puxou pelos ombros, com intenção agressiva. Não hesitei um segundo. Dei-lhe um chute na boca do estômago. Quanto ele dobrou, cruzei as mãos e as desci no pescoço. (Havia visto isto no cinema). Ele caiu estatelado no chão. Nossa! Virei herói da noite para o dia. Passaram até a me chamar por meu nome. Pretende alguém qualificar como crime estas brigas de adolescentes?

É só aluno quem pratica bullying? Eu diria que professor também. Ainda em meus dias de Dom Pedrito, chegou de Porto Alegre uma professora de biologia, um par de coxas fenomenais, nem um pouco mesquinha em exibir seus dotes. À minha frente, aquele vale profundo, sombrio, entrevisto sob a saia, antevisão de uma Canaã de leite e mel abundantes. A ala masculina perplexa, com olhar de peixe morto. Ela, ou pelo menos sua metade que ficava acima da mesa, distante e impassível, como se nada tivesse a ver com o que exibia lá embaixo. Um belo dia, resolveu tripudiar:

– Senhor Cristaldo, suba ao estrado.

Vermelho, de mão no bolso, obedeci à intimação, de costas para as meninas, olhar fixo no quadro negro. A pedagoga, coxuda e implacável, fria como navalha:

– Senhor Cristaldo, vire-se para seus colegas.

Mais o golpe de misericórdia:

– E por favor, senhor Cristaldo, tire as mãos do bolso.

Saudades daquela professora! Sempre fui bom em biologia, que aula dela eu não perdia. Mas isto não é bullying? Nós também éramos cruéis. Tínhamos um professor alemão de matemática, o padre Chico. Sofrera bombardeios na Alemanha e tinha neurose de guerra. Quando descobrimos isso, passamos a jogar no estrado aquelas bombinhas que estalam ao serem pisadas. O coitado do padre, ao ouvir os estalos, punha as mãos nos ouvidos e saía correndo porta afora. Nós ríamos às gargalhadas. Se isto não é bullying, não sei o que seja bullying.

Lourenço van der Raadt tampouco foi poupado. Mal havia chegado da Holanda, a turma inventou de chamá-lo de Padre Bicha. Se com pertinência, não sei. Sem conhecer nada de português, cada vez que entrava na aula era saudado com um sonoro "Padre Biiiicha!" Julgando que se tratava de um apelido carinhoso, ria feliz e sacudia as mãos juntas sobre a cabeça, como um atleta ao celebrar um gol. Pelo menos até o dia em que conheceu melhor as nuanças do português. O homem entrou na aula vermelho, o rosto entumecido pelo sangue. Nossa tradicional saudação ficou na garganta. Foram duros os meses pela frente.

Quando fui estudar em Santa Maria, fui colega do folclórico Trindade, um anão que fez história no colégio Santa Maria. Não era desses anões disformes, mas muito bem proporcionado. O irmão Daniel, professor de Física, o chamava de massa zero: ele não influenciava a lei da gravidade. Irmão Leão, professor de Química, o chamava de anão das idéias fedorentas: tinha o ânus muito perto da cabeça. Trindade nem ligava, se divertia com as piadas e seguia em frente. Estas foram as menores que o anão enfrentou. As outras, por uma questão de elegância, prefiro não contar. As piadas o divertiam.

Faz parte da adolescência apelidar, xingar, insultar, brigar, bater. E também reagir a apelidos, insultos ou agressões. Quando promotores querem criminalizar estes gestos, estão no fundo querendo proibir a adolescência.

segunda-feira, abril 25, 2011
 
SCHENGEN EM XEQUE


Sua Santidade o papa Bento XVI, em sua suma generosidade, pediu ontem "solidariedade" aos refugiados de conflitos, particularmente africanos, na sua mensagem de Páscoa ao mundo. "Possa vir ajuda de todos os lados para aqueles fugindo de conflitos e para refugiados de vários países africanos, que têm sido obrigados a deixar o que é querido a eles", disse. "Possam as pessoas de boa vontade abrirem seus corações para recebê-los, para que as necessidades de tantos irmãos e irmãs sejam atendidas com uma resposta concertada em um espírito de solidariedade", acrescentou.

Por pessoas de boa vontade Sua Santidade entende Itália, França, Espanha, Alemanha e demais países da comunidade. O Vaticano está fora. Verdade que lá não caberia muita gente. Mas o Vaticano está cheio de salas que poderiam muito bem abrigar centenas de pobres diabos. Isso sem falar na Piazza San Pietro, com espaço confortável para centenas de barracas.

Na semana em que Sua Santidade expressava seu imenso amor pela humanidade desvalida, um grupo de 150 ciganos romenos foi desalojado de suas favelas de Casal Bruciato pela Prefeitura de Roma. Na Sexta-Feira Santa, dia que se celebra a morte do deus-homem que se deixou crucificar por amor aos homens, os ciganos se refugiaram na basílica de São Paulo extramuros, em território da Santa Sé.

Na manhã mesma do domingo em que o papa exortava desde sua cátedra os europeus a acolherem os refugiados da Líbia, África e Oriente Médio, as famílias ciganas foram divididas e expulsas do local. Uma trintena de mulheres e crianças romenas de etnia rom passaram uma noite ao relento, debaixo de chuva, no parque adjacente à basílica de São Paulo. É o que leio no El País. Deus não joga mas fiscaliza. Ou pelo menos gosta de pregar peças em seu vice.

Em seus ímpetos de generosidade, cinco países europeus – Bélgica, França, Alemanha, Luxemburgo e Países Baixos - assinaram em 1985 o tratado Schengen, que permite a livre circulação de pessoas dentro dos países signatários, sem a necessidade de apresentação de passaporte nas fronteiras internas. De lá para cá, uma trintena de países aderiu ao acordo, sendo que uns sete ou oito ainda aguardam implementação. Em um de meus passaportes, tenho um visto para o espaço Schengen, que me dispensava de vistos outros em território europeu. Meu passaporte era carimbado no país de entrada e no de saída. Este visto não é mais exigido, mas as regras Schengen ainda vigem na Europa.

O acordo logo revelou um elo fraco. Se imigrantes entravam no continente por fronteiras complacentes, estavam livres para buscar os países que lhes ofereciam mais vantagens, como França, Alemanha, Suécia, Dinamarca. Migrantes econômicos, geralmente alegavam perseguições políticas para obter asilo. Alguns países nórdicos estabeleceram uma limitação: o imigrante não poderia pedir asilo em um segundo país que chegasse na Europa. Teria de pedir no primeiro. Mas isto não conteve a onda de famintos da África e do Magreb.

Há duas semanas, a França impediu a entrada no país de um trem com dezenas de imigrantes tunisianos que haviam partido da cidade italiana de Ventimiglia. De acordo com a comissária européia do Interior, Cecilia Malmström, as autoridades francesas citaram "razões de ordem pública" para justificar a medida. Um porta-voz da Comissão Européia afirmou também que a França não tem a obrigação de permitir a entrada de imigrantes com vistos de residência temporária concedidos pela Itália.

Os humanistas de plantão – entre eles Sua Santidade – protestaram violentamente contra a França. A Itália protestou contra a decisão francesa e afirmou que a medida viola as regras da União Européia sobre a livre circulação no bloco. As pessoas que vivem legalmente nos 25 países da União Européia que assinaram o tratado de Schengen não precisariam apresentar documentos de viagem às autoridades da região.

Desde quando a Itália não pode exportar os famintos que a buscam para o país vizinho? O episódio pôs em xeque o acordo Schengen. Sexta-feira passada, um funcionário da Presidência francesa disse que o país considera abandonar temporariamente o tratado.

Toda corrente é tão forte quanto seu elo mais fraco. Segundo o funcionário do governo francês, deveria haver um mecanismo para suspender o acordo em resposta ao que descreveu como uma "falha sistêmica" na fronteira externa da UE. "Nos parece que precisamos pensar sobre um mecanismo que nos permitiria, quando há uma falha sistêmica numa das fronteiras externas da UE, intervir com uma suspensão temporária pelo tempo que a ruptura durar".

Schengen fracassou. Os europeus recém estão acordando para enfrentar as ameaças perfeitamente legais que ameaçam o continente. Enquanto isso, Bento XVI pede hipocritamente aos países europeus que acolham os miseráveis que o Vaticano expulsa de seu território.

domingo, abril 24, 2011
 
MOVIMENTO CARIOCA DEFENDE
A LEGALIZAÇÃO DO AMANHECER



Leio que quatro integrantes do movimento Marcha da Maconha foram detidos na madrugada deste sábado por policiais militares do Batalhão de Choque, na esquina das avenidas Mem de Sá e Gomes Freire, na Lapa, no Rio. Os PMs apreenderam 1.200 panfletos, 13 camisas, que eram vendidas pelos jovens, e um banner com o logotipo do evento. Foram autuados por apologia ao uso de drogas.

Como se droga precisasse de apologia no Brasil. O que é bom nunca precisou de apologia. Não se espante o leitor quando afirmo que droga é bom. Claro que é bom. Quando alguém se dispõe a arriscar a própria vida para consumir algo, é claro que esse algo algum prazer há de dar. Não é o caso da maconha, o tabagismo mata muito mais. Aliás, nunca vi alguém morrer por usar maconha.

O problema é o preço que se paga por tais prazeres. O crack está matando com gosto e seu consumo só se expande no país. Surgiu agora algo novo, o tal de oxi, que deriva de oxidado. É uma mistura de cocaína e combustível como querosene ou gasolina e se assemelha ao crack por ser uma pedra branca fumada em cachimbo, que custa mais barato e mata mais rápido. Veio da Bolívia e do Peru e entrou no Brasil pelo Acre.

Segundo especialistas, tem o poder de dependência no primeiro uso, causando efeitos devastadores no organismo humano: doenças no sistema renal, emagrecimento, diarréia, vômitos e até perda de dentes, por conta do processo corrosivo provocado pela presença dos combustíveis na composição do oxi. O uso continuado da droga mata em um ano. Ora, se uma droga tem todos esses efeitos e seu uso só aumenta, só pode ser algo muito bom. Mas não tem gente por aí ingerindo o tal de Santo Daime? Pelo que sei, provoca vômitos e diarréia e prazer nenhum. Há gosto para tudo neste mundo.

Ninguém imagine que faço a apologia das drogas. Quem a fez foram os Beatles e demais roqueiros, sempre recebidos por multidões histéricas no Brasil, sem que a polícia tomasse qualquer providência. Os participantes da tal de Marcha da Maconha, pelo que leio nos jornais, não faziam apologia da canabis. Apenas defendiam sua legalização. Defender a legalização de uma prática é direito de qualquer cidadão. Quem decidirá isto são os legisladores. Mas, como tenho dito, é chover no molhado. A maconha há muito está legalizada no Brasil. Ou alguém viu, nas últimas décadas, alguém ser preso pelo consumo de maconha? Eu não vi.

Sem falar que se for o caso de prender quem advoga a legalização da droga, é bom começar por Fernando Henrique Cardoso, que após deixar a Presidência da República vem defendendo esta causa, nacional e internacionalmente. Ou Carlos Minc, que já foi secretário do Meio Ambiente no Rio e ministro do Meio Ambiente, em substituição a Marina Silva. Como também os governadores Sérgio Cabral e Tarso Genro.

Para o delegado-adjunto da 5ª DP do Rio de Janeiro, Antonio Ferreira Bonfim Filho, o direito brasileiro não permite apologia ao crime. "Eles vão responder em juízo, já que não quiseram prestar depoimento", explicou. Não houve, pelo que leio na imprensa, apologia alguma. Mas sim defesa da legalização, isto é, o caminho correto de reivindicar algo em uma democracia. Pelo jeito, só políticos ilustres podem defendê-la.

Sem jamais ter consumido drogas, faço a defesa de sua legalização. Verdade que certas drogas, como o crack e agora o tal de oxi, talvez devam permanecer na ilegalidade, em função de sua letalidade. Mas há muito veneno em farmácia cuja compra não é proibida. Nossas leis tampouco proíbem que alguém se suicide.

Há quem alegue que maconha permitida igual a maior criminalidade. Na Holanda, o consumo de maconha e de drogas leves, como cogumelos alucinógenos, é feito nas cofee shops, cafés abertos dia e noite... onde é proibido fumar cigarros. Em 2009, o governo anunciou que iria fechar oito prisões. Motivo: os índices de criminalidade não paravam de cair, e os juízes haviam trocado as penas de privação de liberdade pelas de serviços comunitários.

Jamais usei qualquer droga. Nem mesmo tabaco. A bem da verdade, nos distantes anos 70, dei uma ou duas tragadas num baseado. Estava em Estocolmo, em um apartamento de universitários, com 19 brasileiros e três suequinhas. Me passaram o bagulho. Para não bancar o estraga-prazeres, dei uma pitada. Uma das suecas me perguntou:

- Vocês brasileiros só sabem fazer isso?
- Isso o quê?
- Puxar fumo e ficar olhando o próprio umbigo?

Brasileiros, até pode ser, respondi. Mas expliquei que não era muito brasileiro. E convidei as três para meu apartamento, onde tomamos vinho a noite toda até o amanhecer. Noite e amanhecer é modo de dizer. Era verão e as noites eram de uma luz irreal, emanada por um sol paranóico que teimava em não deitar-se.

A maconha era liberada na Suécia e a prefeitura de Estocolmo inclusive financiava bares para a meninada fumar. Tentei entrar em um deles, para ver como é que era. Fui barrado, era maior de idade. O bar era para uso exclusivo de menores. Pelo que sei, a maconha continua liberada. O nível de criminalidade, de lá para cá, aumentou. Mas não pelo consumo de drogas. E sim pela invasão de muçulmanos no país dos Sveas.

Isso de defender a legalização da maconha no Brasil, a meu ver, é bandeira sem causa. Algo como defender a legalização do amanhecer.

sábado, abril 23, 2011
 

MUÇULMANOS QUEREM CRIAR
ESTADO DENTRO DO ESTADO



Leio hoje, na Folha de São Paulo, artigo de Roberto Livianu: “Há duas semanas, os franceses vivem sob a batuta de uma lei que trouxe a toda humanidade mais intolerância, segregação e subcidadania. A lei antivéu, que proíbe muçulmanas de cobrir o rosto nas ruas, nasceu impregnada de xenofobia e caráter discriminatório, em movimento estatal não isolado.

“Por isso, a França tem sido palco nos últimos anos de uma série de atos e manifestações intensas de repúdio a posturas estatais antiestrangeiros. E o que causa maior perplexidade é a justificativa que adota o governo francês, no sentido de que a medida vem em defesa do caráter laico do Estado. Cogita-se agora ir além: proibir muçulmanos de orar em espaços públicos”.

Livianu é um jovem doutor em direito pela USP, promotor de Justiça e presidente do Movimento do Ministério Público Democrático. Considera que, no fundo, não há defesa alguma do caráter laico do Estado, que não passa de mero pretexto jurídico-político para agredir e desrespeitar pessoas adeptas de uma determinada religião, ferindo de morte a liberdade de credo. Isto é, Livianu desconhece o que está acontecendo na França e pelo jeito não tem noção alguma do que ocorre no mundo islâmico.

Vamos começar pelas orações nas ruas, que hoje ocorrem em diversos locais na França, particularmente em Paris e Marseille. Em Paris, no bairro árabe da Goutte d'Or, logo abaixo de Montmartre, as mesquitas ficam tão cheias nas sextas que muitos fiéis acabam rezando do lado de fora. Rezar não é o principal problema, mas sim o fato de que as ruas ficam interditadas a carros e transeuntes. Mais ainda, a oração nas ruas é uma provocação aos franceses. Não é que tais rezas reúnam apenas os habitantes do bairro. Ônibus cheios de árabes vêm de outros bairros e cidades vizinhas para ocupar as ruas de Paris. No fundo, uma demonstração de força dos mulás.

E ai de quem ouse enfrentar a turba árabe, invocando seu direito de ir e vir. Os cabeças-de-toalha instituíram uma polícia privada para proteger os crentes. Ou seja, uma religião pretende impor a um Estado laico sua própria polícia. Querem criar um Estado muçulmano dentro do Estado francês. Suponho que isto não seria admitido nem mesmo neste bagunçado país nosso, onde só bandidos têm direito a portar armas.

Vamos ao véus. Os defensores incondicionais do porte de véu pelas muçulmanas em Paris jamais disseram uma palavrinha contra os países em que as mulheres são obrigadas a usar véu, queiram ou não queiram usá-lo. Na Arábia Saudita, por exemplo, nenhuma mulher pode sair às ruas se não usar a abaya, uma capa preta que lhe cobre o corpo todo. Devem também usar um véu que lhes cobre o rosto, deixando apenas os olhos a descoberto. A Arábia Saudita não é exatamente um país, mas um gigantesco poço de petróleo controlado pela família Saud, daí o nome do país. Algo assim como se o Brasil tivesse como nome Sarneylândia, que Alá nos proteja!

As mulheres estrangeiras devem usar pelo menos a abaya, podendo não usar véu. Mas sempre podem ser abordadas por um muttawa – a polícia moral - que as obrigue a cobrir o cabelo. Corre à boca pequena nas redações de jornais a história da mulher de um diplomata brasileiro que foi esbofeteada pela muttawa em um shopping em Riad por ter os cabelos descobertos. O Itamaraty não disse água. Com uma ou outra variante, o mesmo ocorre nos demais países muçulmanos. No Irã, por exemplo, o chador deixa as mulheres com o rosto descoberto, mas cobre o corpo todo.

Há alguns anos, um incêndio irrompeu em uma escola em Meca. Meca é aquela cidade onde milhões de muçulmanos dão sete voltas, a cada ano, em torno a um fragmento de meteorito com 25 cm de comprimento. Na hora da fuga ao incêndio, quinze meninas foram forçadas a voltar para a escola pelos virtuosos policiais promotores da Virtude e Prevenção do Vício, os muttawa. É o que nos conta o jornal Al Iqtisadiya. Motivo: era pecado vê-las sem o véu e a abaya. Morreram calcinadas.

A exigência do véu no mundo muçulmano decorre de um diálogo, no Corão, entre Maomé e seu cunhado Omar. Diz Omar: “Ó, profeta. Diz a tuas mulheres, diz a tuas filhas e às esposas dos crentes que coloquem um véu sobre seu vestido e assim cubram o rosto da forma mais conveniente, de modo que não possam ser reconhecidas e confundidas com as escravas ou mulheres de maus costumes”. A fala do cunhado virou dogma.

Mais ainda: mulher alguma pode sair à rua sem estar acompanhada de um macho. Mas tem de ser um macho da família: pai, marido, irmão ou filho. Se uma mulher chega sozinha a um aeroporto na Arábia Saudita será levada a uma sala especial, de onde só poderá sair quando o macho responsável for buscá-la. E só sairá se estiver coberta por uma abaya.

Mulher solteira não pode estar junta de homem solteiro. Certa vez, em Riad, homens e mulheres ocidentais reuniam-se em um restaurante. Como não eram casados, a reunião foi invadida pela muttawa. Conseguiram continuar a reunião, com uma condição: os homens deveriam ficar de um lado da mesa e as mulheres do outro.

Estes senhores que cobram tolerância da França, jamais pedem reciprocidade do mundo árabe. Em sua argumentação, o promotor de Justiça sofisma: “Ou alguém já ouviu falar de lei proibindo os sacerdotes da igreja católica e de outros credos de usarem suas largas batinas em espaços públicos em prol da segurança pública, em função do risco de ocultarem armamentos?”

Ora, ninguém está sugerindo que as muçulmanas portem armas sob a burka ou nikab. Por outro lado, armas podem ser portadas não apenas nas batinas, mas também em ternos, blusas e mesmo camisas. O que a França discute é a identificação de uma pessoa pelo rosto. Tanto que véus como o chador, que não cobrem o rosto, não são proibidos nas ruas. Fica feio para um promotor sofismar. Aposto que Livianu, doutor pela USP, é petista. As esquerdas são defensoras incondicionais do Islã.

Pode um país proibir uma mulher de portar véu? Penso que pode. Ainda mais quando o uso do véu é imposição masculina. Na Itália, os muçulmanos reivindicam o direito de suas mulheres tirarem fotos veladas para os documentos de identificação. Ora, como identificar alguém que tem o rosto coberto? Como no mundo islâmico mulher não tem identidade alguma, tanto faz como tanto fez. Acontece que no Ocidente uma mulher tem existência própria, vontade própria, direitos, e isto os cabeças-de-toalha não admitem.

Só acho que não será fácil aos franceses interditar o uso do véu. Uma semana após a interdição, um amigo me enviava uma foto de duas muçulmanas cobertas por abayas e nikabs no sofisticado restaurante Fouquet, no Champs Elysées. Dois fantasmas de preto em meio ao colorido de Paris. Se não conseguem interditar o véu no Fouquet, duvido que o consigam na Goutte d’Or, por exemplo. Ou naqueles outros bairros periféricos, infestados de muçulmanos.

Os muçulmanos, dizia, querem criar na Europa um Estado dentro do Estado. O mesmo que pretendiam os cristãos na antiga Roma. Estão conseguindo. Tarde piou a França.

sexta-feira, abril 22, 2011
 
LA CAUTIVA


Comentei outro dia a abissal ignorância no Rio Grande do Sul da gauchesca de língua espanhola: Lussich, Ascasubi, Estanilao el Pollo, Echeverría, José Hernández, Serafín J. Garcia, Elías Regules foram jogados ao lixo. Até parece que estes poetas pertencem a outro planeta. No RS, prefere-se as pacholices de Paixão Cortes e Caetano Braun. Poesia gauchesca no Rio Grande do Sul são trovas medíocres recheadas de tches, a la puchas, xômico, taura, melenudo, pingo, flete. São pastiches que os cetegistas usam, imaginando que, um dia, isso que chamam de gaúcho falou assim. Como se, para ser gaúcho, fosse necessário usar essa linguagem estereotipada dos CTGs.

Reproduzo aqui algumas estrofes desse poema de uma musicalidade extraordinária, do argentino Esteban Echeverría, La Cautiva, publicado em 1837, mais de século antes de surgirem em Porto Alegre os gigolôs do gauchismo. O poema tem nove cantos e transcrevo apenas o início do primeiro. Mereceu verbete no Diccionario Literario Bompiani:

"La Cautiva é o poema da pampa e do índio. Narra com cores românticas um episódio da vida fronteiriça. A trágica história de Brián e Maria, algo nebulosa como todas as que teceu a fantasia do poeta, é apenas pretexto para descrever a pampa, sua selvagem grandeza, seus aterradores espetáculos, o festim dos índios, o incêndio do pajonal”.

O poema, na íntegra, é facilmente encontrado na rede.

El Desierto

Era la tarde, y la hora
en que el sol la cresta dora
de los Andes. El desierto
inconmensurable, abierto,
y misterioso a sus pies
se extiende; triste el semblante,
solitario y taciturno
como el mar, cuando un instante
al crepúsculo nocturno,
pone rienda a su altivez.

Gira en vano, reconcentra
su inmensidad, y no encuentra
la vista, en su vivo anhelo,
do fijar su fugaz vuelo,
como el pájaro en el mar.
Doquier campos y heredades
del ave y bruto guaridas,
doquier cielo y soledades
de Dios sólo conocidas,
que Él sólo puede sondar.
A veces, la tribu errante,
sobre el potro rozagante,
cuyas crines altaneras
flotan al viento ligeras,
lo cruza cual torbellino,
y pasa; o su toldería
sobre la grama frondosa
asienta, esperando el día
duerme, tranquila reposa,
sigue veloz su camino.

¡Cuántas, cuántas maravillas,
sublimes y a par sencillas,
sembró la fecunda mano
de Dios allí! ¡Cuánto arcano
que no es dado al vulgo ver!
La humilde yerba, el insecto,
la aura aromática y pura,
el silencio, el triste aspecto
de la grandiosa llanura,
el pálido anochecer.

Las armonías del viento
dicen más al pensamiento
que todo cuanto a porfía
la vana filosofía
pretende altiva enseñar.
¿Qué pincel podrá pintarlas
sin deslucir su belleza?
¿Qué lengua humana alabarlas?
Sólo el genio su grandeza
puede sentir y admirar.

Ya el sol su nítida frente
reclinaba en occidente,
derramando por la esfera
de su rubia cabellera
el desmayado fulgor.
Sereno y diáfano el cielo,
sobre la gala verdosa
de la llanura, azul velo
esparcía, misteriosa
sombra dando a su color.

El aura, moviendo apenas
sus alas de aroma llenas,
entre la yerba bullía
del campo que parecía
como un piélago ondear.
Y la tierra, contemplando
del astro rey la partida,
callaba, manifestando,
como en una despedida,
en su semblante pesar.

Sólo a ratos, altanero
relinchaba un bruto fiero
aquí o allá, en la campaña;
bramaba un toro de saña,
rugía un tigre feroz;
o las nubes contemplando,
como extático y gozoso,
el yajá, de cuando en cuando,
turbaba el mudo reposo
con su fatídica voz.

Se puso el sol; parecía
que el vasto horizonte ardía:
la silenciosa llanura
fue quedando más obscura,
más pardo el cielo, y en él,
con luz trémula brillaba
una que otra estrella, y luego
a los ojos se ocultaba,
como vacilante fuego
en soberbio chapitel.

El crepúsculo, entretanto,
con su claroscuro manto,
veló la tierra; una faja,
negra como una mortaja,
el occidente cubrió;
mientras la noche bajando
lenta venía, la calma,
que contempla suspirando
inquieta a veces el alma,
con el silencio reinó.

Entonces, como el ruido
que suele hacer el tronido
cuando retumba lejano,
se oyó en el tranquilo llano
sordo y confuso clamor;
se perdió... y luego violento,
como baladro espantoso
de turba inmensa, en el viento
se dilató sonoroso,
dando a los brutos pavor.

Bajo la planta sonante
del ágil potro arrogante
el duro suelo temblaba,
y envuelto en polvo cruzaba
como animado tropel,
velozmente cabalgando;
veíanse lanzas agudas,
cabezas, crines ondeando,
y como formas desnudas
de aspecto extraño y crüel.

¿Quién es? ¿Qué insensata turba
con su alarido perturba
las calladas soledades
de Dios, do las tempestades
sólo se oyen resonar?
¿Qué humana planta orgullosa
se atreve a hollar el desierto
cuando todo en él reposa?
¿Quién viene seguro puerto
en sus yermos a buscar?

¡Oíd! Ya se acerca el bando
de salvajes, atronando
todo el campo convecino;
¡mirad! como torbellino
hiende el espacio veloz.
El fiero ímpetu no enfrena
del bruto que arroja espuma;
vaga al viento su melena,
y con ligereza suma
pasa en ademán atroz.

¿Dónde va? ¿De dónde viene?
¿De qué su gozo proviene?
¿Por qué grita, corre, vuela,
clavando al bruto la espuela,
sin mirar alrededor?
¡Ved que las puntas ufanas
de sus lanzas, por despojos,
llevan cabezas humanas,
cuyos inflamados ojos
respiran aún furor!

quinta-feira, abril 21, 2011
 
O QUEBEC E O FRANCÊS


De Antonio Bemfica, do Canadá, recebo comentário sobre crônica passada, na qual discuto o projeto de lei de um deputado comunista do Rio Grande do Sul, que pretende policiar a língua:

Assunto interessante esse, Janer. Infelizmente a tua obsessão em analisar as coisas sob uma ótica anticomunista diminui o impacto da crônica (presumo que desejes obter o efeito oposto, ou talvez nem notes isso...). Já ouviste aquela máxima que diz "Nunca atribua à malícia o que pode ser adequadamente explicado pela estupidez"? Também vale nesse caso!

Mas voltando ao assunto original, acho que desconheces as leis sobre língua francesa na província de Québec, no Canadá. Em conjunto são conhecidas como "loi 101" (apesar de em verdade serem mais de uma lei) e formalmente como "Charte de la langue française". É a lei que estabelece a primazia do francês como língua de Québec e define em detalhe regras tais como a que exige que em placas e sinais comerciais o texto em francês seja sempre maior de que o texto em qualquer outra língua ou que requer que atendentes no comércio interpelem ou cumprimentem clientes sempre em francês primeiro, mesmo em regiões em Québec nas quais o inglês predomina.

Existe também, é claro, o Office québécois de la langue française, que é o órgão que faz cumprir a lei, recebe reclamações públicas, recomenda vocabulário francês equivalente aos termos ingleses comuns no francês (bem como o deputado aí no Sul quer), etc. Outra das funções do órgão é promover "la francisation". Veja lá: "... la Charte oblige les entreprises employant 100 personnes ou plus au Québec à s’engager dans une démarche de francisation et à instituer un comité de francisation".

A lei 101 é de 1977 e foi já contestada na Suprema Corte daqui, que decidiu que a lei é inconstitucional. O sistema federalista canadense é meio complicado, e um dos privilégios das províncias é o de poder invocar a cláusula "não-obstante" em casos como esse. "Não obstante" ser a lei 101 inconstitucional, é facultado ao governo de Québec não rescindi-la. Por isso a cada quatro anos a lei deve ser re-aprovada pela assembléia de Québec. Atenção, nos sites do governo de Québec vais encontrar termos como "Assemblée nationale", que não se refere ao parlamento canadense, mas sim à legislatura provincial de Québec, que se considera como nação e usa o termo "national" com certa liberalidade.

Bom proveito, Antonio


Meu caro Antônio:

Para começar, não vejo nenhum demérito em ser anticomunista. Vinte anos depois da queda do Muro de Berlim, o mundo está repleto de neo-anticomunistas. Eu era anticomunista uns bons trinta anos antes da queda do Muro. Ou seja, há meio século. Nos anos 60, qualquer pessoa honesta que tivesse um mínimo de informação histórica não podia ser comunista. Se era, no fundo se tratava de um oportunista que queria extrair dividendos do prestígio pós-guerra da tirania.

Continuando, os três políticos que tentaram policiar a língua no Brasil – Aldo Rebelo, Luiza Erundina e Raul Carrion – são comunistas. Não há de ser por mera coincidência. Comunistas gostam de reger a vida toda do cidadão, inclusive seu modo de falar. Isto foi genialmente abordado por George Orwell, em 1984, ao criar o conceito de novilíngua.

Adelante! Desde há muito há um conflito entre o Quebec e o Canadá. O Quebec é a maior província do país. Cerca de 80% da população do Quebec tem origens francesas, em contraste com as outras províncias do país, cujos habitantes são em sua maioria descendentes de ingleses ou escoceses. Há uma outra distinção de origem religiosa. Enquanto o Quebec é majoritariamente católico, o Canadá é protestante. Ou seja, há um choque de culturas. Não é o caso do Brasil.

Seja como for, a Charte de la Langue Française recomenda o emprego da língua francesa. Não o torna compulsório. Se o artigo 7º da Carta diz que o francês é a língua da legislação e da justiça, diz também que os projetos de lei são impressos, publicados e adotados em francês e inglês e as leis são impressas e publicadas nas duas línguas. O francês e o inglês podem ser utilizados em pé de igualdade nos tribunais do Quebec e os julgamentos devem ser traduzidos em uma e outra língua, conforme o pedido das partes. O que me parece muito normal em uma província bilíngüe. Não é o caso do Brasil. O nhengatu morreu com o marquês de Pombal.

Por outro lado, o francês é obrigatório nos cartazes e na sinalização do tráfego. O projeto gaúcho pretende regulamentar a propaganda, publicidade ou meio de comunicação por meio da palavra escrita sempre que houver em nosso idioma palavra ou expressão equivalente. O que gera uma pergunta interessante: os jornais do centro do país serão proibidos de atravessar o Mampituba? Pago para ver.

Pergunto a meu interlocutor se há legislação semelhante no Canadá: "Existem, claro, leis que definem as línguas oficiais do país e de cada província ou que garantem acesso a educação e serviços para minorias linguísticas, etc., mas legislação como essa de Québec, para proteger e regulamentar o uso da língua, só existe lá, e só quanto à língua francesa".

Nacionalismos tacanhos, eu diria. Em função de nacionalismos tacanhos, a Espanha vive problema semelhante. Que no Parlamento europeu se falem 23 línguas se entende. Se em 1958 lá se falavam as quatro línguas dos seis países fundadores, (alemão, francês, italiano e holandês), a Comunidade Européia inchou. Em 1973, foram acrescentados o inglês, o dinamarquês e o irlandês. Em 1981, foi a vez do grego, espanhol e o português. Em 1986, o finlandês, em 1995, o sueco. Em 2004, o estoniano, o húngaro, o letão, o lituano, o maltês, o polaco, o checo, o eslovaco e o esloveno. Desde janeiro de 2007, com a adesão da Romênia e da Bulgária, a União Européia conta oficialmente com 23 línguas. Até aí, muito compreensível.

Difícil de entender é a decisão do Senado espanhol, que autorizou debates nas cinco línguas distintas do país, com intérpretes convertendo suas palavras em um idioma que todos falam perfeitamente: o espanhol castelhano. A iniciativa de permitir que os senadores falem em catalão, galego, valenciano e basco converteu a Casa em uma torre de Babel. Em nome de nacionalismos tacanhos, os políticos fingem agora que não entendem a língua-mãe e fazem teatro falando línguas regionais.

De acordo com a mídia espanhola, os 25 intérpretes necessários para converter as diferentes línguas em castelhano custam ao Senado € 12 mil por dia (R$ 27 mil), ou € 350 mil por ano (R$ 795 mil). O que talvez explique a motivação do comunossauro gaúcho. Depois da criação de cursos de tradutor e intérprete nas universidades, uma larga faixa de acadêmicos caiu na vala do desemprego.

Como comunista adora uma boquinha estatal, crie-se uma lei para dar emprego aos desocupados.

quarta-feira, abril 20, 2011
 
SOBRE MINHA DECEPÇÃO COM O 7º
MELHOR RESTAURANTE DO MUNDO



Pois não é que eu já almocei no sétimo melhor restaurante do mundo e não sabia? Só fiquei sabendo agora, ao ler no Estadão que o D.O.M., aqui de São Paulo, obteve o 7º lugar na lista dos 50 melhores restaurantes do mundo – eleição feita anualmente pela revista britânica Restaurant. Hoje eu nada poderia dizer sobre o D.O.M., minhas papilas gustativas estão avariadas. Mas quando estive lá, meu paladar estava intacto.

Em primeiro lugar, fui lá porque fui convidado. Jamais iria de moto próprio. É um desses restaurantes carésimos onde novos ricos vão para serem vistos. Já que estava convidado, era ocasião de conhecer um universo para mim desconhecido. Éramos três. Do que foi servido, só reconheci um cordeiro assado e um aligoté. O resto, o Alex Atala nos explicava do que se tratava, pois não dava para perceber do que se tratava.

Suponho que o cordeiro fosse de carne, mas nunca se sabe. Atala é adepto da tal de cozinha molecular, essa estranha culinária que faz caviar de cenoura, beterraba e maracujá, e ostras sei lá de quê. Não sou muito chegado a caviar, em todo caso prefiro os de beluga ou esturjão. Não vou dizer que não gostei do que comi no D.O.M. Mas saí dali com saudades de uma boa picanha ou de uma massa à putanesca. Já nem falo de cochinillos ou lechales.

Pratos que parecem ikebana, servidos em porções diminutas. Hesitei em comer. Melhor levar para casa e pendurar na parede. Um deles vinha em um retângulo de madeira escura com listas brancas transversais. Quando terminei, o garçom me perguntou: não gostou do pupunha? Que pupunha? – quis saber. Pupunha eram as listas brancas. Ah, bom...

Pagamos, em três, com um só vinho, o preço de uma passagem de ida e volta a Paris. Quer dizer, eu não paguei, era convidado. Nem pagaria. Só em São Paulo encontro uns dez restaurantes melhores do que o D.O.M. e a preços mais humanos. Por que digo só dez? Porque só freqüento uns dez restaurantes em São Paulo. Se saísse a pesquisar, encontraria vinte, trinta ou mais. Se expandir minha pesquisa pela Europa, encontro cem, duzentos, mil ou mais restaurantes bem mais palatáveis.

Atala é discípulo do chef catalão Ferran Adriá, proprietário do El Bulli, restaurante em Cala Montjoi, uma enseada da Costa Brava espanhola, no qual eu jamais poria meus pés. O restaurante, que teve três estrelas no Guide Michelin, funcionava seis meses por ano. Nos outros seis meses, Adriá pesquisava novos pratos. Reservas com um ano de antecedência. Disse funcionava porque acabou fechando, apesar de suas três estrelas.

Adriá se celebrizou pelo que se chama de descontrução da cozinha. Leio no site Correio Gourm@nd: “Acreditando que ser criativo é não copiar nada, ele se fez célebre pensando no que ninguém havia pensado antes. Para conseguir uma mousse que conservasse todo o sabor natural de seu ingrediente principal e, ao mesmo tempo, tivesse uma perfeita e etérea ligeireza, usou o sifão, aquele de fazer chantilly, e, substituindo os ovos e o creme de leite por gelatina, deu vida a delicadas espumas. Transformou o foie gras numa textura suave e borbulhante, assim como a água do mar, o queijo parmesão ou qualquer fruta de época que cruzasse por seu laboratório. Mas esta é apenas uma das inovações do chef cuja imaginação e ousadia parecem não ter fim. A cada temporada, Adrià surpreende o universo gastronômico oferecendo um novo espetáculo sem paralelo na história da cozinha”.

Nada contra inovações em qualquer área que seja, inclusive na gastronomia. Mas, em matéria de cozinha, sou conservador. Gosto daqueles bons e antigos pratos, cuja excelência resistiu aos séculos. Do antigo e bom assado, das antigas e boas massas, risotos e paellas. Do foie gras que é foie gras e não espuma do mar. Leio que no El Bulli pratos complexos como a paella são sintetizados num único grão que você come e sente o exato gosto de uma paella; as gelatinas são quentes, o sorvete é salgado... Passo. Quero a antiga e boa paella, as gelatinas frias e os sorvetes doces.

Quando leio que o D.O.M. ficou em sétimo lugar numa lista dos 50 melhores restaurantes do mundo, agradeço a informação. Já excluo de minhas viagens pelo menos 50 restaurantes. Continuo fiel aos meus restaurantes seculares. Que não cultivam a tal de cozinha molecular. Neles o porco é porco, a ostra é ostra, o caviar é caviar. Aliás, em Madri eu gostava muito de um, que hoje não mais existe, o Comidas Naturales. Lá tudo era natural. O porco era porco, o boi era boi, o cordeiro era cordeiro.

Isso de comer sucedâneos de produtos naturais a preço de ouro, me desculpem os novos gourmets, é frescura de quem gosta de ostentação. Não é por acaso que o D.O.M. foi classificado por uma revista britânica. É sabido que a Inglaterra conquistou tão grande império em busca de uma boa cozinha. Pelo jeito, ainda não a encontrou.

terça-feira, abril 19, 2011
 
VELHOS COMUNISTAS NÃO GOSTAM
DE QUE POVO CONSTRUA A LÍNGUA



Em dezembro de 2007, foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados um projeto de lei proposto pelo deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que buscava promover, defender e proteger a língua portuguesa.

Segundo o deputado bolchevique, as muitas expressões estrangeiras utilizadas no Brasil dificultam, muitas vezes, a comunicação dos brasileiros. Segundo o projeto proposto, toda a vez em que for usada uma palavra estrangeira para uma comunicação ao público, o emissor da mensagem deve disponibilizar a tradução em português. Tal regra seria válida para os meios de comunicação de massa, informações em estabelecimentos comerciais e também para a publicidade.

Na verdade, o projeto tinha um alvo definido, o uso das palavras e expressões em inglês. Depois da queda do muro, o comunismo se reduziu a um anti-americanismo histérico. O deputado evidentemente nada tinha contra palavras como ombudsman, chef, premiê, Tour de France e similares de outras línguas que não o inglês. Sua preocupação era com hard, light, diet, drink, sale, print, overnight, mouse, software. Consta que certa vez foi flagrado falando em outdoor. Enrubesceu e corrigiu: grande cartaz. Acontece que outdoor não é exatamente grande cartaz.

Que foi feito do projeto do antigo comunossauro, não sei. O fato é que continuamos tomando drinks, consumindo softwares e produtos lights ou diets, printando e usando o mouse. Quem faz a língua é o povo e não o Congresso lá em Brasília. Pelo projeto de Rebelo, aquele bate-estaca ianque que hoje chamamos rock passaria a chamar-se pedra – ou rocha. Os Rolling Stones seriam os Pedras Rolando. E o mouse passaria a ser rato. Verdade que no espanhol é ratón, mas espanhóis não incidem nesse ridículo de proibir palavras estrangeiras na Espanha. Quem prefere mouse, que o prefira.

Coisa de rato que ruge. Imagine um deputado nos Estados Unidos querendo proibir o espanhol nos meios de comunicação de massa, informações em estabelecimentos comerciais e publicidade. Seria ridicularizado. Aqui, merece a atenção da Câmara dos Deputados. Comunistas são em geral monoglotas e não gostam de estrangeirismos. Foi Luíza Erundina, se bem me lembro, que propôs a tradução dos cardápios em São Paulo. Para começar, de modo geral estão traduzidos. Têm cá e lá uma expressão francesa ou italiana, que designa as características do prato. Mas essas expressões nem sempre admitem tradução.

Uma língua é feita de outras línguas. Não existe língua pura. O vernáculo vai integrando no correr dos anos as palavras que absorve. Por exemplo mina (no sentido de mulher), tira (no sentido de policial) ou pivete. Hoje soam como português, não é verdade? Mas provêm do lunfardo portenho. Garagem, bagagem, montagem provêm do francês. O português está totalmente impregnado pelo grego. Se alguém pensa que táxi, telefone ou nosocômio são palavras nossas, está totalmente enganado. É grego puro. Para se proibir estrangeirismos no vernáculo, seria necessário extirpar palavras que há séculos fazem parte da língua.

Estupidez contagia. Dois anos depois, o vírus da ignorância pegou carona nalgum vento norte e veio aterrissar em Porto Alegre. Um projeto que exige tradução de palavras estrangeiras deve ser votado nesta semana na Assembléia gaúcha. Proposto em 2009 pelo deputado Raul Carrion – não por acaso outro velho bolchevique – e aprovado pela CCJ na última terça-feira, a proposta obriga a tradução de expressões ou palavras estrangeiras para a língua portuguesa, sempre que houver no idioma uma palavra ou expressão equivalente.

O parlamentar argumenta que o projeto não pretente proibir o uso de expressões estrangeiras, mas apenas exigir a sua tradução, para que um maior número de pessoas compreenda o que está sendo veiculado. Ele citou o caso de palavras que provocam confusão nos consumidores como "light" e "diet", que muitas vezes são entendidas como sinônimas, mas que, no entanto, possuem significados distintos. A antiga bronca com o inglês.

Se o projeto de Aldo Rebelo é de uma estupidez profunda, o de Raul Carrion é de uma estupidez hiante. Pois propõe regulamentar o uso da língua de um país em um só Estado. Tal lei, ainda que estúpida, só poderia ser proposta em âmbito nacional. Como a estupidez de Rebelo não vingou, caso vingue a de Carrion teríamos no Rio
Grande do Sul uma língua diferente do resto do país.

Ora, diferenças regionais já existem. Ninguém hoje no Brasil deixa de usar palavras estrangeiras. Se são majoritariamente inglesas, é porque a cultura ianque é dominante. Mas isto transcende a língua. Continuará sendo dominante enquanto os Estados Unidos forem potência. A cultura segue a espada. Ou alguém pretende traduzir os milhares de palavras que a informática joga por ano no mercado?

Pela lógica do projeto de Carrion, jornais do centro do país, para entrar no Rio Grande do Sul, teriam de ter seus estrangeirismos traduzidos. Livros, idem. E vamos terminar com essa história de bullying. Televisão que falar em bullying de alguma forma terá de ser interditada ou punida. Os cetegistas já fecharam as fronteiras culturais com o Plata. Carrion quer fechar a fronteira lingüística com o Brasil.

No país todo, a língua será falada como o povo a constrói. No Rio Grande do Sul, como o velho bolchevique quer.

segunda-feira, abril 18, 2011
 
MANDELA INCITA À MATANÇA DE
BRANCOS NA ÁFRICA DO SUL



De irada leitora, recebo, a propósito da coluna em que comentei a aprovação de Kill de boer, kill the farmer, por Bono Vox:

“Embora tivesse convencido a mim mesma a não mais comentar tua coluna, não posso deixar de fazê-lo. Prestas um serviço ao nos informar sobre esse lado negro de uma canção e nada justifica divulgá-la hoje nesse contexto. Quem sabe já vais te munindo de mais subsídios, pelo jeito agora alimentados por "correspondentes estrangeiros", para num futuro não muito distante, dissecares a derrocada de todo o continente africano, minado pela herança da invasão e do domínio BRANCO de décadas!! Não bastasse a implosão do norte, agora explode a Costa do Marfim e novamente o Sudão. E isso que nem se ouve mais nada sobre outros focos do passado como Etiópia, as ex-colônias portuguesas etc. etc.”

Caríssima, quem trouxe à tona essa história não fui eu, mas o Bono. E se ele apóia a difusão de uma canção perigosa em um ambiente de lutas raciais, é problema dele. Me reservo o direito de criticá-lo. Quanto à África, posso te assegurar que se os dominadores brancos continuassem lá, o continente não estaria se esfacelando em lutas tribais. Tudo o que a África tem de civilizado – universidades, hospitais, tecnologia, alguma ciência, alguma organização política – é legado dos europeus. Os responsáveis pelo desenvolvimento da África do Sul foram os bôers e não os xhosas ou tribos outras.

Isso me lembra a Vida de Brian, dos Monty Python (cito de memória). Reunidos os conspiradores judeus, o líder pergunta: que nos trouxeram os romanos? Estradas, responde alguém. Certo. Mas além das estradas, que nos deram? Hospitais, responde outro. É! Mas que mais além das estradas e hospitais? Aquedutos, sugere um terceiro. E assim continua a discussão, até que sai um manifesto: apesar de nos terem trazido estradas, hospitais, aquedutos, escolas, esgotos, romanos go Rome!

Quanto a denunciar vigarices, é dever de todo jornalista. Considero uma demonstração de subdesenvolvimento cultural um país receber, como recebeu o Brasil, este salafrário e sonegador de impostos. É preciso ser muito colonizado para se chegar a tal ponto.

Outro leitor me observa: “Não acho que ser mal informado a ponto de fazer uma observação infeliz sobre a questão da música Kill de Boer na África do Sul, assim como o artigo mesmo indica, faz dele um vigarista. Seria mais um "poor judgement" da parte dele. Nem cantar músicas do IRA quando criança. Canção folclórica muitas vezes é meio lúgubre. Já pensaram na letra do "atirei o pau no gato", "boi da cara preta pega essa criança que tem medo de careta", e assim por diante? A gente quando criança cantava sem pensar no significado. Em inglês também tem disso”.

Pois é! Se o Tiririca faz uma menção jocosa aos cabelos de sua mulher, sua gravadora é multada em 300 mil reais. Já o Bono, quando endossa uma canção que incita à violência contra os brancos, é recebido com tapete vermelho no Brasil, pela presidente, pelo ex-presidente e outras autoridades. Por outro lado, não vejo como um irlandês possa estar mal informado a respeito de uma canção cujo título é Kill the farmers. Vejo uma vigarice nisto, sim. Bono, em busca de prestígio e do Nobel da Paz, empunha as piores bandeiras das esquerdas. Matar fazendeiros, desde Lênin a Stédile, é quase um dever moral para todo comunista. Se o muro de Berlim já caiu, o sonho ainda não morreu e sempre rende aplausos. Particularmente entre os botocudos.

Mas a vigarice mesmo não reside nisto, e sim em sonegar impostos e depositar sua fortuna em paraísos fiscais. A fundação One, da qual Bono Vox e' presidente, segundo a imprensa inglesa, só destina às pessoas necessitadas cerca de 1% do que arrecada. O resto é embolsado pelo Bono e demais funcionários da fundação. Se isso não é vigarice, já não entendo o vernáculo.

Quanto a “atirei o pau no gato” e “boi da cara preta”, são inofensivas canções infantis que vêm sendo condenadas pelos ridículos militantes do politicamente correto. Há uma certa distância entre atirar um pau num gato e matar um bôer. A propósito, te envio esta significativa interpretação de Julius Malema. Líder do governista CNA (Congresso Nacional Africano), Malema foi proibido pela Justiça de cantar a canção: http://youtu.be/5exDw9Git58

Uma coisa é crianças cantando canções folclóricas sem pensar em seu significado. Outra coisa é um estadista, com ar solene, cantar canções que incitam à matança, em um país conflagrado pelo ódio racial. Com os leitores, Nelson Rolihlahla Mandela, popstar xhosa do racismo negro na África do Sul: http://www.youtube.com/watch?v=fcOXqFQw2hc

Não por acaso, Mandela recebeu em 1989 o Prêmio Internacional Al-Kadafi de Direitos Humanos. Em 1993, com de Klerk, recebeu o Nobel da Paz. Bono Vox conhece o caminho.

 
BRASIL SE CURVA
ANTE O ROQUEIRO
VIGARISTA IRLANDÊS



Nem tudo está perdido. Ainda há mentes lúcidas no país. De uma leitora, recebo este artigo, publicado no blog Tribuna da Imprensa.


As autoridades brasileiras continuam provincianas e se curvam diante de qualquer celebridade estrangeira que ponha os pés por aqui. Como Bono Vox, por exemplo.

Carlos Newton

Quinto maior país em território e em número de habitantes, o Brasil está na oitava posição no ranking das potências econômicas. Por si só, essas circunstâncias deveriam fazer com que as autoridades fossem mais altivas e menos provincianas. Mas não é isso que acontece. Nossas autoridades insistem em se comportar de forma subalterna, curvam-se diante de qualquer estrangeiro famoso.

Vejam o que acaba de acontecer com Bono Vox, vocalista do grupo irlandês U-2, que surgiu no cenário internacional nos anos 80, aproveitando a onda do terrorismo do grupo IRA, com músicas tipo “Sunday Bloody Sunday” (Domingo Sangrento Domingo). A Irlanda do Norte se pacificou, o U-2 prosseguiu na estrada e acabou se tornando a maior banda de rock do mundo.

Mas alguém poderia explicar por que a presidente da República não somente aceitou receber Bono Vox, como o convidou para almoçar no Palácio da Alvorada, abrindo ao roqueiro a intimidade de seu lar? E mais, prestando contas a ele sobre as iniciativas governamentais no Brasil para diminuir a pobreza, segundo o release distribuido pela Secretaria de Comunicação do Planalto.

O que explica essa situação? Por que essa atitude provinciana de Dilma Rousseff, a chefe do governo do Brasil? Seria nossa presidente uma tiete do U-2? Será que aproveitou para pedir autógrafo a ele, a pretexto de presentear o netinho? Ninguém sabe, não foi revelado.

O pior é que depois o cantor irlandês foi recebido oficialmente pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, que deveria ter coisas mais importantes para fazer. O relato da assessoria de imprensa da Fazenda também informa que eles conversaram sobre as medidas contra a pobreza. Será que Mantega também pediu autógrafo, a pretexto de presentear a filha, que é dublê de atriz e negociadora empresarial com países árabes?

Depois, o gran finale: Bono Vox foi recebido pelo poderoso chefão, o próprio Lula, ou seja, foi conferir os relatórios de Dilma e Mantega diretamente com quem manda no governo e realmente distribui as cartas, nomeia, demite, dá ordens de cima a baixo. E será que Lula também pediu autógrafo para algum filho ou neto?

Por fim, ao deixar o país, para voltar à Europa, o roqueiro foi homenageado pelas autoridades da Base Aérea de São Paulo, onde chegou de helicóptero, recebido pelo próprio tenente-coronel Antonino José Frigini Júnior, que comanda a unidade militar da Aeronáutica, e outras autoridades da Base. Para facilitar a vida do roqueiro irlandês, foi montado um esquema especial de imigração e alfândega, abrindo caminho para que ele depois embarcasse direto num voo da Air France, com toda a primeira classe da aeronave ocupada pela banda U-2.

Esse provincianismo das autoridades brasileiras precisa acabar. Já é tempo de termos orgulho de nosso país, ao invés de ficarmos batendo palmas para qualquer celebridade que ponha os pés por aqui. Bono Vox já vai tarde, cantar em outra freguesia. Por que ele não se preocupa com a Irlanda, que atravessa uma crise econômica devastadora? Podia até contribuir com um pouco da grana que ganhou em excursão no Brasil. Será que o faz?

domingo, abril 17, 2011
 
SE GRAMA FOSSE LÓGICA,
O RECÓRTER HIDRÓFOBO
TUCANOPAPISTA SERIA
NO MÍNIMO ARISTÓTELES



O recórter tucanopapista hidrófobo da Veja é divertido. Em sua coluna de hoje, começa fazendo uma defesa apaixonado de seu “ídalo” tucano, Fernando Henrique Cardoso. E acusa de autoritários os jornalistas que comentam um escorregão do ex-presidente, ao afirmar que é inútil o PSDB disputar o “povão” com o PT porque essa legenda aparelhou os sindicatos e os movimentos sociais.

“E se arma um grande carnaval. A marcha da estupidez se encarregou de deturpar o texto, de atribuir-lhe características demofóbicas, ignorando a crítica essencial”. Até aí nada demais. É seu direito defender ou atacar quem quer que seja. Mas... Sempre tem um mas.

Quando Tarso Genro, no início deste mês, fez a defesa de um tratamento mais tolerante para a maconha, em palestra a universitários em Porto Alegre, o recórter tucanopapista pediu a cabeça do governador petista:

“Quem pedirá a cassação do mandato do governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT)? Acho que ninguém. Quem na imprensa irá protestar contra a sua ligeireza, a sua irresponsabilidade, o seu pouco caso — ele já foi ministro da Justiça — com um dos mais graves problemas brasileiros? Acho que ninguém também! Nesse caso, então, nem se diga: com raras exceções, há identidade de agenda, quem sabe de prática”.

Logo após sua defesa babosa de Fernando Henrique na coluna de hoje, na nota seguinte cai de pau no líder do PT na Câmara, Paulo Teixeira (SP), que defendeu a liberação do plantio de maconha e a criação de cooperativas formadas por usuários.

“Se grama fosse lógica, Teixeira seria Descartes. Porque é mais fácil comprar droga do que antibiótico, então ele acha que a legalização não acarretaria aumento do consumo, como se a interdição legal não criasse nenhuma barreira, especialmente para crianças e adolescentes. É de uma estupenda irresponsabilidade. Grave, para ele, é comer um lanche do McDonald’s, que, até onde sei, não altera o estado de consciência de ninguém. Em excesso, faz mal, mas muita água também pode matar um indivíduo…”

Ora, seu “ídalo”, depois que deixou a Presidência da República, saiu mundo afora fazendo a defesa da liberação das drogas. Em janeiro passado, na condição de presidente da Comissão Global de Políticas sobre Drogas, Fernando Henrique presidiu os debates realizados durante dois dias em Genebra.

"É preciso descriminalizar o uso de todas as drogas, pois nenhuma política de combate às drogas vai funcionar se não houver também informação e educação. Somente assim as pessoas irão dispor de elementos para usar sua liberdade e para saber que as drogas causam danos", disse na ocasião.

O recórter tucanopapista hidrófobo por acaso pediu a cassação dos direitos políticos de Fernando Henrique? Não pediu. O recórter é dócil e subserviente quando se trata de criticar seus santos tutelares. Jamais saberá usar as rédeas quem nasceu para ser encilhado. Caluda!

Se grama fosse lógica, Teixeira seria Descartes. Que seria então o recórter? No mínimo um Aristóteles.