¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, janeiro 24, 2012
 
SÓ MUDA A MOSCA


Em meus dias de Folha de São Paulo, tive uma colega judia que morava em meu bairro. Era judia, mas de ortodoxa nada tinha. Seu hobby predileto era espalhar o terrorismo entre rabinos. Mal via um na calçada, dava um jeito de esbarrar nele e desculpava:

- Mil perdões, estou nervosa. Estou menstruadíssima...

O bom rabino entrava em pânico e punha-se a estapear as vestes como se tivesse sido atacado por um enxame de abelhas.

Tenho escrito seguidamente sobre o que chamo de ginecofobia, fenômeno alimentado particularmente pelos muçulmanos. Pois só um profundo medo do sexo oposto pode explicar a condição inferior à qual a mulher é renegada no mundo islâmico. Mas, pelo jeito, seus primos judeus competem firme nesta maratona de obscurantismo.

Causou pasmo no Ocidente, e mesmo em Israel, a recente agressão a Naama Margolese, uma menina de oito anos, por ortodoxos nuredim, quando ela se dirigia à escola, na cidade de Beit Shemesh, próxima a Jerusalém. Os judeus, considerando que Naama estava inconvenientemente vestida, a xingaram de prostituta, cuspiram em seu rosto e a empurraram. A mãe de Naama diz que o trauma causado foi tão profundo que a garota treme quando tem de ir para a escola.

Quando árabes ou iranianos cospem no rosto de uma mulher sem véu, imediatamente os colocamos na condição de bárbaros. Onde colocar estes brutos ocidentais que se pretendem civilizados? A resposta é só uma: no mesmo saco.

Em junho do ano passado, o obscurantismo dos ortodoxos já havia escandalizado a imprensa. Segundo o site Ynet, um Tribunal Rabínico de Jerusalém condenou à morte por apedrejamento um cachorro vira-lata acusado de ser a reencarnação de um advogado já falecido amaldiçoado por insultar juízes religiosos há 20 anos.

Segundo o site, o advogado foi condenado pelo mesmo tribunal a reencarnar como cachorro e teria retornado ao local (já como cão) para se vingar. A execução da sentença foi delegada a um grupo de crianças, mas o cachorro conseguiu dar no pé. Em uma sociedade onde um tribunal rabínico se reúne para condenar um animal ao apedrejamento, nada de espantar que cuspam na cara de uma menina por julgá-la inconvenientemente vestida.

Se bem que, para povo que cultivou um dia o hábito de lapidar mulheres, apedrejar cães é café pequeno. Está no Deuteronômio, que prega a lapidação da mulher quando nela o marido não achava virgindade.

“Porém, se isto for verdade que se não achou na moça virgindade, então levarão à porta da casa do seu pai e os homens de sua cidade a apedrejarão até que morra, pois fez loucura em Israel, prostituindo-se na casa de seu pai: assim eliminarás o mal diante de ti”.

Segundo noticiário da BBC, tanto em Beit Shemesh, como em Jerusalém, Bnei Brak, Tzfat e Elad, há calçadas separadas para mulheres, linhas de ônibus nas quais as mulheres devem sentar-se atrás dos homens e filas separadas em bancos e clinicas médicas.

A segregação é praticada há anos e conta com a aquiescência do governo. O Ministério dos Transportes permite a existência das linhas de ônibus nas quais é praticada a segregação e as prefeituras, subordinadas ao Ministério do Interior, autorizam placas nas ruas que guiam as mulheres para uma calçada e os homens para outra.

Quem diria? No rico e aguerrido Israel, armado com bombas nucleares e uma força aérea letal, onde toda mulher é soldado e luta ombro a ombro com os israelenses, as mulheres são segregadas em bancos, clínicas médicas, ônibus e ruas. Se isto é o que transpira na imprensa, imagine o leitor o que ocorre entre quatro paredes.

Cruzo com estes senhores na rua todos os dias. Boa parte das mulheres casadas de meu bairro cobrem os cabelos com uma peruca, que só pode ser retirada na intimidade, diante do marido. Os ortodoxos jamais dão a mão a mulheres que não as suas. E, pelo que vejo na rua, não dão a mão nem à própria mulher.

Ela pode estar impura. Isto é, menstruada. Há alguns anos, Marta Suplicy dirigiu-se de mão estendida, como todo político, a um grupo de rabinos. Exceto um, todos lhe negaram a mão. O único a estender-se a sua foi aquele rabino ladrão de gravatas, de hábitos pouco ortodoxos.

Em 2006, mantive polêmica com o rabinato de meu bairro em função de artigo no qual, além de outras bizarrices, eu comentava este curioso comportamento. Respondeu-me um representante da comunidade judaica:

- Um homem, mesmo tendo 100% de certeza de que uma mulher não está menstruada - escrevem meus contestadores - e ainda que seja sua esposa; mesmo assim, pelas leis mais estritas judaicas, não pode cumprimentá-la em público. E por quê? Por questão de recato. Para preservar carinhos e troca de afagos para os momentos íntimos e particulares com a sua amada.

Ora, não vejo nenhuma falta ao recato em dar a mão a uma mulher. Assim fosse, todos os cristãos deste país seriam despudorados irremediáveis. Meus interlocutores pareciam não ter lido a Torá. Lá está, em Levítico 15:19-24:

"E mulher, quando tiver fluxo, e o fluxo da sua carne for de cor sangüínea, sete dias ficará separada na sua impureza; e todo aquele que tocar nela será impuro até a tarde. E tudo sobre o que se deitar na sua impureza será impuro, e tudo sobre o que ela se sentar será impuro. E todo que tocar no seu leito, lavará suas vestes, se banhará em água e será impuro até a tarde. E quem tocar sobre o leito ou sobre o objeto em que ela está sentada, tocando neles, será impuro até a tarde. E se um homem deitar com ela, a sua impureza passará sobre ele, e ficará impuro sete dias; e toda cama em que ele se deitar, se fará impura".

Ora, para mim, cidadão ocidental e vivendo neste século, soa muito estranho considerar impura uma mulher em seus dias de menstruação. Uma das traduções da Bíblia, a de João Ferreira de Almeida, vai mais longe: tacha as mulheres como imundas.

“Fala aos filhos de Israel, dizendo: Se uma mulher conceber e tiver um menino, será imunda sete dias; assim como nos dias da impureza da sua enfermidade, será imunda. (...) Mas, se tiver uma menina, então será imunda duas semanas, como na sua impureza”.

O rabino Meir Matzliah Melamed, que comenta minha Torá, especifica com rabínicas minúcias as substâncias tóxicas que portam estes seres imundos:

“Os cientistas maravilham-se diante do fato de que os antigos hebreus praticavam o mais alto padrão de higiene sexual reconhecido nos tempos atuais. Tem sido demonstrada também a existência de uma substância tóxica no sangue, na salivas, na transpiração, na urina e em todas as outras exudações da mulher durante o período da menstruação”.

Que nojo! Que estas imundas sejam confinadas na traseira dos ônibus e enviadas para o outro da calçada por onde passam os virtuosos e higiênicos nuredim. Árabes e judeus vivem em guerra constante. No fundo, participam do mesmo obscurantismo.

Só muda a mosca.