¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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domingo, junho 16, 2013
 
PREFÁCIO E CRÍTICA DO PREFÁCIO
AOS POEMAS DO HOMEM DE ORION



PREFÁCIO
Um orionino inadaptado
Janer Cristaldo *

Desde minhas universidades venho acompanhando o trabalho tenaz e infatigável de Carlos Ducatti. Homem de preocupações cósmicas, nada do que é terráqueo a si alheio reputa, lutando tanto pela construção de um espaçoporto no Brasil para receber nossos vizinhos de outras galáxias como elaborando uma complexa parafernália destinada a exterminar pardais, ave monopolista e predatória (sem alusão alguma ao Bonfim, por favor!), cuja algaravia, além do mais, fere seus ouvidos.

Doublé de cientista e poeta, criador e animador do Clube Nova Era, viajante astral, Ducatti é filho dos mais sintomáticos deste século conturbado. Exaustas as religiões, falidas as ideologias, é através da Razão – esta nova deusa — que Ducatti buscará Deus. Recente exposição sua — praticamente ignorada por uma imprensa superficial, encharcada de crimes e futebol – nos trazia a dedução matemática da existência de Deus. Jorge Luis Borges disse alhures crer na teologia como literatura fantástica, “es la perfección del género". O pensamento ducattiano move-se paralelamente ao de Borges, quando, em Teociência, diz ser a matemática "abstrata, intemporal, onipresente (...) não tem emoções e numa esfera se revela melhor. Assim como Deus". Lemos, aliás, em sua súmula biográfica, referência ao ponto Aleph, outro tema típico da teodicéia - se assim podemos dizer — borgesiana.

Ducatti nasceu em Cruz Alta, RS, comuna que já deu ao Brasil um não menor talento, mas descobriu que provém espiritualmente do planeta Orion e, como tal, sente-se entre nós inadaptado. “Não me adapto à Terra, por demais grotesca para minha sensibilidade”.

Mas quem se adapta, meu caro? Neste sentido, somos iodos um pouco orioninos inadaptados, com a diferença que não ousamos soltar as rédeas ao sonho. Enquanto as autoridades porto-alegrenses, nestes dias de canícula, não resolvem a contento o problema das fugas em massa para o litoral, o poeta nos relata o caso do planeta Silonado, que “abrigava, em sua face, um povinho alaranjado". Dos vinte meses anuais do planeta, cinco eram de verão atroz. Os administradores de Silonado, aos quais a burocracia terrestre causaria horror, encontraram singela e racional saída ao impasse: “Resolveu-se desta forma, / cinco meses, na região / congelar o povo inteiro / no intervalo de verão. / Construíram, para isto, / milhares de hibernadores. / Todo mundo, congelado, / passa o tempo sem calores".

Enfim, não quero roubar ao leitor a degustação da poética ducattiana. Como comparatista, só lhe vislumbro, e distante no tempo, um par: Qorpo Santo, este singular gaúcho, hoje estudado nas universidades de França, Itália e Estados Unidos, graças a Aníbal Damasceno Ferreira, nosso esquálido pesquisador do insólito, E, durante um século, Qorpo Santo foi solenemente ignorado pelos soi-disants historiadores de nossa literatura. Necessitará Ducatti de mais um século para ser entendido? Há quem o julgue louco. Assim como, também foi catalogado Qorpo Santo.

Curiosamente, é culturalmente sacrílego fazer tal afirmação a propósito daquele outro, filho da judia Maria e do soldado romano Pantera, que percorria a Galiléia dizendo ser Deus um só, e ele, seu filho. Suas palavras invadiram o Ocidente, expulsaram os afáveis deuses pagãos, e hoje um católico, seja um leigo ou o próprio Papa, é considerado um ser mentalmente normal.

Enfim, como diz Ducatti, em um de seus poemas, onde denuncia a ditadura do consuetudinário:

“Chás de plantas mil... / Por que tomar só café / no imenso Brasil?”

Porto Alegre, 23 de novembro de 1981.

* Cristaldo é doutor em Literatura Comparada pela Université de la Sorbonne Nouvelle — Paris III.

CRÍTICA DO PREFÁCIO

Porto Alegre, 25 de novembro de 1981
Prezado Sr. Editor (Seção de Cartas):

Recebi há poucos dias, no Chalé da Praça Quinze, o prefácio de “Vibrações Poéticas”, elaborado pelo colega e amigo Janer Cristaldo. De estilo colorido e agradável, apesar de tipicamente intelectual, o trabalho tem vários defeitos a corrigir. O título já estava errado, ao incluir a palavra “orionano” (foi retificado, após). Conforme convenção informática de minha criação, válida para mundos e países, o sufixo ano (ou iano) designa habitantes de um certo lugar, e ino, seus descendentes (biológicos ou espirituais), moradores noutro lugar. Eu, por exemplo, sou italino, brasiliano (ou brasileiro) e orionino.

De 74 a 78, uma de minhas preocupações era construir um espaçoporto (elaborei até um projeto). Esqueci a idéia, pois apareceram outros grupos, no Brasil, interessados em tal objetivo. Sigo o princípio de “preencher lacunas", fazendo só aquilo que os outros não procuram fazer (e deve ser feito).

Não sei odiar. Tenho grande respeito pelas criaturas da Natureza. Adoro ver, cheirar e beijar flores. Há, entretanto, desequilíbrios ecológicos causados pela ignorância e ambição do homem. O pardal, originário da Ásia, invasor da Europa, trazido (há mais de meio século) para nosso país, é um pássaro anti-ecológico, vagabundo, arruaceiro, inimigo do tico-tico, do sabiá, etc.; constitui hoje a maior praga do Brasil. Combatê-lo é defender nossa bela e querida fauna.

Janer diz que somos todos inadaptados. . . Conforme o "Teste de Adaptação à Terra” (de minha autoria), aplicado em mais de trinta pessoas, eu sou terrivelmente inadaptado, em todos os sentidos; posso dizer que seria dificílimo encontrar um indivíduo com semelhante grau de inadaptação a este planeta. Meu principal problema é supersensibilidade crônica, e as soluções que descobri (a muito custo) até agora, não são eficientes. Para finalizar, declaro que não acredito que o Mestre Jesus tenha sido filho de um soldado romano. Suas características físicas e espirituais não se coadunam com tal idéia. Penso que seu pai era extraterrestre; ele teria sido gerado, em Maria da Galiléia, através de... “concepção cósmica" (um processo que não entendo).

Carlos A. Ducatti (cientista, filósofo e poeta)