¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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domingo, setembro 22, 2013
 

DE NADA ADIANTA CHORAR
POR EMBARGO DERRAMADO



Veja dá uma capa de luto na edição desta semana, com uma só chamada:

Brasília, 18 de setembro de 2013

Manchete da reportagem:

A JUSTIÇA SE CURVA.
OS MENSALEIROS RIEM


Faz a crônica de um luto anunciado. Os mensaleiros até podem ir para a cadeia. Quem não pode ir é Zé Dirceu. Braço direito do capo di tutti i capi, o ex-ministro conhece coisas que a nossa vã informação desconhece. Se for em cana, por certo abrirá a boca. Abrindo a boca, demole a reputação do homem que realmente deveria estar na cadeia.

A quem interessa o crime? A quem interessava a compra de deputados? A Zé Dirceu é que não, afinal para o ministro tanto fazia como fizesse se os deputados votassem assim ou assado. O que estava na berlinda era o governo de Lula. Zé Dirceu não se beneficiaria pessoalmente comprando votos para tungar os aposentados. Mas o governo sim.

Ser corrupto não é para qualquer um – afirmava eu no ano passado. É para quem pode. E mais: exige trabalho. Por mais dura que seja sua jornada, certamente Carlinhos Cachoeira, Zé Dirceu, Maluf, Delúbio, Marcos Valério suaram mais a camiseta que você. Não se constrói uma quadrilha eficiente sem esforço e dedicação. São centenas de milhares de horas-homem de trabalho.

O mensalão começou a ser montado no dia 10 de fevereiro de 1980, no colégio Sion, em São Paulo, quando o PT foi criado. Foram mais de vinte laboriosos anos de trabalho de consolidação da quadrilha. Ser honesto pode não compensar muito. Mas sem dúvida é menos trabalhoso.

Corrupção não dá recibo. Daí a impunidade de seus agentes. Até os cisnes do lago do Itamaraty sabem que Zé Dirceu está à cabeça da quadrilha que comandou a operação. Daí a prová-lo, são outros quinhentos. Para condenar o mandalete de Lula, Joaquim Barbosa foi cavoucar no direito alemão a exótica teoria do domínio do fato. A teoria foi criada por Hans Welzel em 1939 para julgar os crimes ocorridos na Alemanha pelo Partido Nazista. Consiste na aplicação da pena ao mandante de um crime, mas como autor e não como partícipe do crime. Na época do julgamento dos crimes do Partido Nazista, devido à jurisprudência alemã, a teoria não foi aceita.

A teoria só ganhou projeção internacional em 1963, quando Claus Roxin publicou a obra Täterschaft und Tatherrschaft . Negro que fala alemão é um perigo, costumo afirmar. Para ser aplicada a teoria, é necessário que a pessoa que ocupa o topo de uma organização emitir a ordem do crime e comandar o fato.

Joaquim Barbosa não ousou ir até o fim do caminho. Quem comandava os fatos? Certamente não era Zé Dirceu. Na Folha de São Paulo de hoje, Ives Gandra põe pra fora da boca o que estava na ponta da língua de todos.

- O domínio do fato é novidade absoluta no Supremo. Nunca houve essa teoria. Foi inventada, tiraram de um autor alemão, mas também na Alemanha ela não é aplicada. E foi com base nela que condenaram José Dirceu como chefe de quadrilha. Aliás, pela teoria do domínio do fato, o maior beneficiário era o presidente Lula, o que vale dizer que se trouxe a teoria pela metade.

Os juízes do STF têm agido como formigas enlouquecidas ante a proximidade de um temporal. Tomam decisões insólitas sem prever as graves conseqüências, a longo prazo, de suas irresponsabilidades. Em reportagem de capa, na edição de hoje, o Estadão aponta uma delas.

“A decisão do Supremo Tribunal Federal de permitir um novo julgamento para parte dos condenados no processo do mensalão - a partir do acolhimento dos embargos infringentes -, pode beneficiar réus de 306 ações penais que se arrastam na Corte, sem previsão de conclusão. Enquanto advogados de defesa se empolgam com a possibilidade de lançar mão de mais um recurso, ministros e ex-integrantes do STF revelam apreensão com o efeito dominó da decisão”.

Beneficiários? Entre outros, esses impolutos vultos da pátria, como os deputados Paulo Maluf e Eduardo Azeredo, e os senadores Fernando Collor de Mello e Jader Barbalho , que respondem ações por crimes.

Segundo o jornal, um outro ministro que rejeitou empurrar para 2014 o desfecho do mensalão é categórico. "Se entrar (embargos infringentes) para todas as ações nessa situação (com 4 votos), será a inviabilidade do tribunal. Já imaginou? Toda vez que tiver quatro votos vai ficar rejulgando? O tribunal não consegue nem julgar as ações originárias!", disse o ministro, que pediu anonimato.

O mesmo reitera o ex-ministro Eros Grau, ainda no Estadão:

- Há inúmeras ações penais a serem ainda apreciadas e, sem dúvida, em todos os casos em que houver quatro votos favoráveis ao réu, o moto perpétuo processual será instalado. O Supremo será transformado em um tribunal penal de terceira instância.

Agora não adianta chorar sobre embargos derramados. Se a Veja acha que os mensaleiros riem, está sendo tímida em sua manchete. A elite dos corruptos está rindo. Impunidade ampla, geral e irrestrita para todos.